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Proposta prevê cortes acima de 5,5% para universidades e bolsas do CNPq

Texto de relator da lei orçamentária retira ao menos R$ 470 milhões da ciência, em relação a projeto original do governo

CNPq (Herivelto Batista/MCTIC/Divulgação)

CNPq (Herivelto Batista/MCTIC/Divulgação)

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Agência O Globo

Publicado em 10 de dezembro de 2021 às 08h58.

Representantes da comunidade acadêmica no Brasil começaram a se mobilizar ontem para tentar barrar no Congresso Nacional o trecho do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2022 que reduz a verba para a ciência. Em relação à proposta original do governo, que já era vista como insuficiente, o texto do relator do projeto, Hugo Leal (PSD-RJ), prevê cortes de 5,8% para universidades federais e de 5,5% para bolsas do CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Científico).

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Revelada no último domingo, a proposta do deputado prevê repasses menores para diversos órgãos que produzem pesquisa no Brasil. Pelas contas dos cientistas, o corte teria, no mínimo, um impacto de R$ 473 milhões para a ciência brasileira.

Além das universidades e do MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação) como um todo, a versão do texto atual proposta por Leal afeta a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). Em relação ao projeto de lei originário do Planalto, estas perderiam respectivamente R$ 33,2 milhões, R$ 8 milhões e R$ 7,5 milhões.

Cientistas se organizam agora para tentar convencer deputados a barrarem essa mudança. Segundo a coalizão ICTP (Iniciativa para Ciência e Tecnologia no Parlamento), mesmo em casos onde institutos federais receberiam algum aumento em relação a 2021, esse crescimento não compensa a inflação. O texto também não prevê recompor a situação em que já há dificuldade para bancar a manutenção básica de infraestrutura de pesquisa.

— O objetivo do relator com isso é abrir espaço fiscal, e tem a ver em boa medida com a demora na aprovação da PEC dos Precatórios, que deixou o governo numa situação ruim — diz Celso Pansera, ex-ministro da Ciência e Tecnologia, hoje secretário-geral da ICTP. — O governo está pressionado por essa realidade, e sai cortando onde não deveria.

A perda mais volumosa para o investimento que Leal tenta impor à lei de orçamento de 2022 é para as universidades, onde se concentra a maior parte da produção de pesquisa federal. Estas perderiam R$ 298 milhões em relação à proposta original. Quando o texto é comparado à PLOA 2021, ele representaria um pequeno aumento (de 7,2%), mas que não é suficiente para compensar a inflação do período, que já beira os 10%.

O corte na Fiocruz seria percentualmente menor, mas afetaria um núcleo de pesquisa importante num momento sensível.

— Isso é muito preocupante num momento em que a gente precisa da ciência mais do que nunca, devido à Covid-19, em especial, mas também para a recuperação econômica — afirma Renato Janine Ribeiro, presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência).

— A economia está retomando no resto do mundo porque temos mais aporte cientifico. Esse corte de verbas é uma sinalização na direção oposta que os países desenvolvidos ou a China, em rápido crescimento, estão fazendo — completa.

Recuperação econômica

O físico Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), também está participando da articulação para tentar reverter os cortes. Para ele, o investimento limitado em ciência vai dificultar a saída da crise.

— Isso vai sacrificar a recuperação econômica e sacrificar o futuro do país, em nome das emendas de relator e do orçamento secreto — diz o cientista. — Diz o relator que esse é preliminar, e que estão dependendo da votação da PEC dos Precatórios, porque eles querem ter aqueles R$ 16 milhões das emendas de relator, e estão cortando todos os lados para conseguir chegar ali. Mas é um raciocínio simplista fazer isso cortando uniformemente de todo lado.

Segundo Pansera, os cientistas não conseguem falar com o Hugo Legal para negociar mudanças.

— Em todos os anos nós sempre conseguimos estabelecer uma relação com o relator, mas neste ano nós não conseguimos conversar. Ele simplesmente não retornou — afirma.

Davidovich afirma que, se o deputado não se comover com os problemas, espera convencê-lo do dano que isso causaria em sua base eleitoral.

— Ele é um deputado federal aqui do Rio de Janeiro, e esses cortes afetam um conjunto grande de instituições do estao. É preciso levar isso em conta, porque o Rio tem a Fiocruz, tem uma concentração de Universidades Federais, e mesmo as estaduais que depende da Capes e do CNPq. O estado do Rio de Janeiro vai ser muito prejudicado por esses cortes — afirma o cientista.

Despesas discricionárias

Janine manifestou preocupação também porque os cortes, feitos nas despesas classificadas como discricionárias (fora da folha de pagamento), começam a afetar gastos básicos.

— Tem despesas discricionárias que, a rigor, são obrigatórias. Como você vai parar de pagar conta de luz, água, internet? Vai fechar prédios? Vai perder materiais, animais e plantas que precisam de refrigeração? — questiona.

Um outro problema é que os estuantes de pós-graduação são uma parte expressiva da mão-de-obra da ciência brasileira e não têm salário fixo, vivem de bolsas de pesquisa. Pelo novo texto, o corte na verba para bolsas seria de R$ 52,7 milhões (5,5%).

— As bolsas são consideradas discricionárias, e tem mais de 100 mil estuantes de pós que precisam de bolsa. Eles vivem disso, é como um salário. Isso não deveria ser considerado discricionário — diz Janine.

O GLOBO entrou em contato com o gabinete do deputado Hugo Leal para perguntar sobre os cortes previstos na área de ciência, mas não obteve retorno até a hora de publicação desta notícia.

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