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Procuradoria abre nova investigação sobre a morte de Herzog

Medida se baseia nas determinações da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que condenou o Estado brasileiro devido à falta de investigação

MPF instaurou um novo procedimento para investigar a responsabilidade criminal de agentes da ditadura militar pela morte de Vladimir Herzog (Instituto Vladimir Herzog/Divulgação)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 6 de agosto de 2018 às 12h22.

Última atualização em 6 de agosto de 2018 às 12h23.

São Paulo - O Ministério Público Federal instaurou um novo procedimento para investigar a responsabilidade criminal de agentes da ditadura militar pela morte de Vladimir Herzog, preso e torturado em 1975. A medida se baseia nas determinações da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que condenou o Estado brasileiro devido à falta de investigação, julgamento e punição dos envolvidos no assassinato do jornalista.

As informações foram divulgadas pela Procuradoria da República em São Paulo, que conduzirá o procedimento.

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A procuradora Ana Letícia Absy já solicitou documentos e informações relativos à morte de Herzog às Comissões Nacional e Estadual da Verdade e a diversos órgãos, entre eles os Arquivos Nacional e do Estado de São Paulo. Fontes bibliográficas também serão utilizadas ao longo da investigação, entre elas o livro "A casa da vovó", do jornalista Marcelo Godoy.

Na sentença proferida em março deste ano, a CIDH destaca que o episódio configura um crime contra a humanidade e que a Lei da Anistia não pode ser aplicada como razão para o Estado deixar de investigá-lo.

Para o MPF, "ainda que o Supremo Tribunal Federal tenha reconhecido em 2010 a constitucionalidade da lei, seu teor contraria parâmetros jurídicos internacionais de proteção aos direitos humanos, como os estabelecidos na Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, da qual o Brasil é signatário".

"A tortura e morte de Vladimir Herzog não foram um acidente, mas a consequência de uma máquina de repressão extremamente organizada e estruturada para agir dessa forma e eliminar fisicamente qualquer oposição democrática ou partidária ao regime ditatorial, utilizando-se de práticas e técnicas documentadas, aprovadas e monitoradas detalhadamente por altos comandos do Exército e do Poder Executivo", ressalta a CIDH na sentença.

Herzog morreu em 25 de outubro de 1975, mesmo dia em que se apresentou voluntariamente ao Destacamento de Operações de Informações (DOI) em São Paulo para prestar depoimento. Filiado ao Partido Comunista Brasileiro, o jornalista foi preso imediatamente e não resistiu à tortura a que foi submetido nas dependências da unidade. Os agentes forjaram a versão de suicídio, simulando um enforcamento ao envolver uma tira de pano em seu pescoço e amarrá-la a uma grade com pouco mais de 1,6 metro de altura.

O MPF afirma que "embora a fraude fosse evidente, o Exército endossou a versão com base em perícia que atestava o suicídio". "Três anos depois, no entanto, uma ação movida por familiares de Herzog levou a Justiça Federal a reconhecer a falsidade do laudo necroscópico e a atribuir o crime à União".

"Décadas mais tarde, o próprio Estado brasileiro admitiu sua responsabilidade, por meio de publicações da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (2007) e da Comissão Nacional da Verdade (2014). Em 2013, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que as lesões e os maus-tratos sofridos durante o interrogatório constassem da certidão de óbito de Herzog", afirma a Procuradoria, por meio de nota.

"Ainda assim, no campo criminal, tentativas recentes de identificação dos autores não tiveram prosseguimento. Casos como o de Herzog ainda enfrentam resistências no Judiciário, que tem evocado não só a Lei da Anistia como também a suposta prescrição para barrar processos relativos a crimes da ditadura", diz a Procuradoria.

Das 36 ações que o MPF ajuizou nos últimos anos em todo o País contra agentes da repressão envolvidos em assassinatos de dissidentes políticos, somente duas estão em andamento em varas e tribunais federais. Segundo o MPF, as dificuldades se estendem também à consulta a dados oficiais do regime militar.

A Procuradoria já buscou, por exemplo, informações sobre os servidores que atuavam no DOI, mas afirma não ter conseguido acesso aos arquivos do governo federal referentes ao período.

"São inadmissíveis as disposições de anistia, as disposições de prescrição e o estabelecimento de excludentes de responsabilidade que pretendam impedir a investigação e punição dos responsáveis por graves violações dos direitos humanos, como a tortura, as execuções sumárias, extrajudiciais ou arbitrárias e os desaparecimentos forçados", concluiu a CIDH.

Esta não é a primeira condenação do Brasil pela omissão em casos referentes a crimes durante a ditadura. Em 2010, a CIDH já havia proferido sentença contra o país devido à falta de investigação e julgamento dos responsáveis pela morte de militantes que atuaram na chamada Guerrilha do Araguaia.

Desde o ano seguinte, o MPF afirma que "vem adotando expressamente em sua atuação o entendimento da Corte quanto à imprescritibilidade e à impossibilidade de anistia para assassinatos e desaparecimentos de opositores ao regime militar". "Os delitos, destacou a Procuradoria Geral da República em manifestação de 2011, foram cometidos em contexto de ataque sistemático e generalizado do Estado brasileiro contra a população civil, o que permite classificá-los como crimes de lesa-humanidade".

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