PGR denuncia governador do Acre por corrupção e pede seu afastamento
Alvo principal da Operação Ptolomeu, da Polícia Federal, Gladson Cameli negou ligação com esquema criminoso
Agência de notícias
Publicado em 30 de novembro de 2023 às 15h29.
Última atualização em 30 de novembro de 2023 às 15h32.
A Procuradoria-Geral da República denunciou o governador do Acre Gladson de Lima Cameli (PP), e outros doze investigados por organização criminosa, corrupção ativa e passiva, peculato, lavagem de dinheiro e fraude a licitação. Segundo a PGR, os crimes tiveram início em 2019 e teriam causado prejuízos de quase R$ 11,7 milhões aos cofres públicos.
Alvo principal da Operação Ptolomeu, da Polícia Federal, Gladson Cameli nega enfaticamente ligação com esquema de corrupção e fraudes.
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Além da condenação de forma proporcional à 'participação individual no esquema criminoso', o subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos pediu ao Superior Tribunal de Justiça o afastamento do governador até o fim da instrução criminal. Somadas, as penas pelos crimes podem ultrapassar 40 anos de reclusão.
A Procuradoria pede ao STJ que o governador seja processado por dispensa indevida de licitação, peculato praticado 31 vezes, corrupção passiva, lavagem de dinheiro em 46 vezes e organização criminosa.
A Procuradoria requereu ainda a perda da função pública de todos os que se enquadram na situação, incluindo o governador, além do pagamento de indenização mínima e R$ 11.785.020,31, conforme previsão do Código de Processo Penal.
A PGR pediu afastamento cautelar de Cameli e de outros agentes públicos, diante da gravidade dos fatos e da necessidade de resguardar a instrução processual e as demais frentes investigativas',
A Procuradoria pede também que Cameli fique proibido de 'se aproximar da sede do governo estadual' e que seja decretado bloqueio cautelar de bens de todos denunciados de forma solidária até o valor de R$ 12 milhões, 'para assegurar a reparação ao erário em caso de futuras condenações'. Os pedidos serão analisados pela relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi.
A denúncia foi apresentada ao Superior Tribunal de Justiça, que é o foro para processamento de autoridades como governadores, e está restrita a um dos fatos apurados na Operação Ptolomeu - irregularidades envolvendo a contratação fraudulenta da empresa Murano Construções LTDA, que teria recebido R$ 18 milhões dos cofres públicos para obras de engenharia viária e de edificação.
Além do governador, a Procuradoria acusa a mulher de Cameli, dois irmãos dele, servidores públicos, empresários e pessoas que teriam atuado como 'laranjas' no suposto esquema.
De acordo com as investigações, a empresa Murano Construções e empresas subcontratadas - uma das quais tem como sócio Gledson Cameli, irmão do governador - teriam pagado propina ao governador em valores que superam os R$ 6,1 milhões, por meio do repasse de parcelas de um apartamento em bairro nobre de São Paulo e de um carro de luxo.
Segundo a PGR, embora a denúncia mire apenas crimes que teriam sido praticados no âmbito do contrato firmado pelo governo estadual do Acre com a Murano, 'há provas de que o esquema se manteve mesmo após o encerramento da contratação'.
"Foram identificados oito contratos com ilegalidades, e a estimativa é que os prejuízos aos cofres públicos alcancem quase R$ 150 milhões", afirma a PGR.
A denúncia que imputa crimes ao governador do Acre preenche quase duzentas páginas. A Procuradoria revela 'amplo material probatório dos crimes praticados e que tiveram como ponto de partida a fraude licitatória'.
A fraude, segundo a PGR, consistiu na adesão da Secretaria de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano do Estado do Acre a uma ata de registro de preços vencida pela Murano. Sediada em Brasília, a empresa nunca havia prestado serviços no Acre.
O objeto da licitação feita pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (campus Ceres /GO) era a prestação de 'serviços comuns de engenharia referentes à manutenção predial'. Já no Acre, a empresa foi responsável pela execução de grandes obras rodoviárias, tarefas executadas, conforme a denúncia, por companhias subcontratadas, uma delas a Rio Negro Construções, que tem como sócio Gledson Cameli.
A denúncia destaca que a adesão à ata de registro de preços foi feita em maio de 2019 pelo secretário de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano, Thiago Rodrigues Gonçalves Caetano, um dos acusados.
Uma semana depois, o governo estadual, por meio da secretaria, assinou contrato com a vencedora do certame licitatório efetivado por meio de pregão eletrônico. Os investigadores descobriram que, no dia seguinte à contratação, a Murano firmou com a Rio Negro uma Sociedade em Conta de Participação.
Para o subprocurador Carlos Federico Santos, 'o modelo de sociedade foi escolhido por permitir que o sócio, no caso, o irmão do governador, que por lei não pode contratar com o poder público, permanecesse oculto'.
As informações reunidas ao longo da investigação comprovaram que 64,4% do total pago pelo estado à Murano decorreu da suposta execução de obras viárias, sobretudo manutenção e construção de rodovias e estradas vicinais, serviços diversos do previsto no contrato.
"Aproximadamente dois terços do valor pago correspondem a objeto totalmente estranho ao contratado, em claro desvirtuamento do princípio da isonomia", relata a denúncia.
Para os investigadores, 'a burla à licitação está amplamente configurada, uma vez que o objeto real das obras, a construção de rodovias, deveria ter sido tratado em processo licitatório específico'.
Ainda de acordo com a PGR, também chamou a atenção o fato de a empresa Murano não ter nenhuma estrutura empresarial no Acre .
A Controladoria-Geral da União indicou ter havido 'subcontratação integral do objeto do contrato, o que configura fuga ao procedimento licitatório e fere o princípio da igualdade bem como afronta o artigo 37, XXI, da Constituição Federal'.
A descoberta de que essa subcontratação se deu em favor de uma empresa do irmão do governador revela, na avaliação dos investigadores, 'a utilização de expediente ilegal para encobrir o real destinatário dos recursos, o chefe do Executivo, apontado como o líder da organização criminosa'.
Sobrepreço
A denúncia reproduz análises técnicas segundo as quais teria havido um sobrepreço de R$ 8,8 milhões, além de um superfaturamento de R$ 2,9 milhões nos serviços contratados pelo Estado do Acre com a Murano.
Nos dois casos, a CGU confirmou irregularidades como o pagamento por insumos e serviços que não foram efetivamente fornecidos. Isso foi possível, segundo a denúncia, a partir de fraudes nas medições e termos de ateste assinados por servidores que integravam o esquema.
A denúncia detalha como essas irregularidades foram efetivadas e aponta os responsáveis pelos atos. Um exemplo é o registro do aluguel de 900 andaimes e de 6.840 montagens e desmontagens das estruturas a custo de R$ 116 mil para pintura do estádio Arena Acre.
"Contrastando com os registros documentais atestados e que serviram de base para os pagamentos, os registros fotográficos identificaram não mais do que 20 andaimes pelo local, além de constatar que o serviço foi feito por meio da técnica do uso de cordas para manter os trabalhadores suspensos", diz a denúncia.
As provas reunidas na investigação levaram à conclusão de que, do total de recursos retirados dos cofres públicos, apenas 35% foram destinados ao pagamento por serviços prestados pelas empresas subcontratadas.
Segundo a denúncia, a maior parte (65%) seria relativa ao superfaturamento e sobrepreço, tendo como destino o repasse ao governador, ao irmão e a outros envolvidos.
Para Carlos Frederico, o peculato 'está devidamente comprovado, bem como o dolo e a má fé dos acusados'.
Defesa de Gladson Cameli
Esse pedido de afastamento é arbitrário e absurdo. Não há nenhum fato novo que justifique esse pedido de afastamento. Ele decorre de um outro pedido que já tinha sido indeferido pelo Superior Tribunal de Justiça. É além de tudo, ele foi feito na vagância do cargo de procurador-geral da República.
Essa investigação é toda ilegal. Ela decorre de uma devassa realizada pela Polícia Federal de Cruzeiro do Sul, sem que tivesse competência para investigar o governador Gladson Cameli. Para se ter uma ideia, quebraram o sigilo de uma criança de apenas sete anos de idade, o filho do governador.
É não há nenhuma ilegalidade atribuível ao governador Gladson Cameli. As obras foram todas executadas e entregues ao povo do Acre, que reelegeu Gladson Cameli no primeiro turno. Esse pedido de afastamento é uma afronta ao mandato conferido pelo povo do Acre.
O governador Gladson Cameli confia no Poder Judiciário, Superior Tribunal de Justiça e fará sua defesa e tem a convicção que esse pedido ao final será indeferido.
Pedro Ivo, advogado do governador Gladson Cameli