Obras para a Copa provocam desapropriações em Pernambuco
Região que abrigava 200 famílias foi desapropriada para a ampliação de terminal de ônibus em Pernambuco, obra que faz parte do ramal da Copa do Mundo
Da Redação
Publicado em 6 de maio de 2014 às 10h27.
Recife -Onde se viam casas, ruas repletas de gente e quitandas à beira da pista, hoje se vê terra, caminhões, escavações e poeira.
Na região metropolitana do Recife, o terreno vazio, que antes abrigava 200 famílias do Loteamento São Francisco do Timbi, foi desapropriado para a ampliação do terminal de ônibus do município de Camaragibe.
A obra, que faz parte do ramal da Copa do Mundo , ganhou fôlego com a necessidade de levar torcedores de Recife até a Arena Pernambuco, onde serão disputadas cinco partidas do campeonato mundial de futebol .
A dificuldade de alugar um imóvel nas mesmas condições que o demolido e a impossibilidade de comprar uma casa nova com as baixas indenizações fazem com que famílias passem por situações difíceis.
Para discutir soluções conjuntas, os antigos moradores passaram a se reunir na comunidade.
Em uma dessas reuniões, Augusto*, de 71 anos, pede ajuda para compreender uma intimação do Conselho Tutelar local.
É que desde a mudança, para uma casa onde já viviam duas famílias, o filho, de 11 anos, não vai a escola e se “envolve em confusões”, conta.
O Conselho Tutelar de Camaragibe não tem um levantamento do impacto das remoções sobre as crianças e adolescentes nem sobre a ausência de escolas, creches e equipamentos de esporte e lazer no local e nas proximidades, para onde muitos se mudaram.
Reconhece, entretanto, que a fragilidade da situação, a mudança e a necessidade de se adaptar a uma nova rotina em condições que não são tão favoráveis como a anterior acentuam problemas já existentes.
“A questão é que os problemas familiares já existem, mas se agravam. O que se fazia antes, dentro do ambiente deles, da família, e que a vizinhança socorria, ajudava, participava, não acontece mais”, disse a conselheira tutelar de Camaragibe Josefa Maria de Mello.
As famílias que restaram no São Francisco também sofrem com a retirada de metade da comunidade e contabilizam dificuldades com o fim de uma série de serviços no bairro.
A padaria e o mercadinho não existem mais e a única creche da localidade fechou as portas por falta de aluno.
O Educandário Bom Jesus, que é particular, não recebeu nenhuma matrícula em 2014 e funciona hoje apenas como ponto de encontro para a reunião de moradores.
* O nome do entrevistado foi alterado para preservar a identidade da criança
Edilza Ferreira de Brito, mãe de Vitória Ferreira, de 7 anos, disse que esperou a abertura de uma turma para as crianças remanescentes do São Francisco. “Fiquei até o fim esperando. Mas quando surgiu o boato de que poderemos ter que sair nos próximos anos ninguém matriculou os meninos”, contou.
A comunidade ficou com medo de ficar sem a escolinha no meio do semestre e de os filhos acabarem perdendo o ano com a desapropriação da creche.
Mãe de três crianças, entre elas, um bebê de 11 meses, Rosângela Henrique Barbosa também sofre com o fim da creche e as intervenções no bairro.
Ela conta que ficou mais difícil levar e buscar o mais velho na escola, coisa que ela faz a pé todos os dias.
“Antes era aqui pertinho, em um instante ele chegava, voltava até só, agora é longe, a gente caminha no calor, na poeira, por causa dessas obras. Vivemos em crise de alergia”, contou.
A prefeitura de Camaragibe disse que não acompanhava os problemas causados pelas remoções por ser uma intervenção do estado.
“Todas as desapropriações foram dadas pelo estado, a prefeitura está dando suporte social”, disse o secretário de Assistência Social, Eduardo Napoleão.
O órgão passou a oferecer atenção psicossocial no início deste ano, depois das cobranças dos moradores.
Não há, no entanto, nenhum acompanhamento sobre a situação dos jovens.
Responsável pelas desapropriações, a Procuradoria-Geral do estado de Pernambuco reconhece que os processos são “traumáticos paras as populações atingidas” e que muitas vezes o valor das indenizações são insuficientes para a compra de um novo imóvel no mesmo bairro.
“A gente tenta remediar encaminhando para os programas de auxílio-moradia e programas habitacionais da prefeitura ou do governo do estado”, disse o procurador-geral, Thiago Norões.
Segundo ele, um planejamento de longo prazo para as cidades seria o ideal.
“Eu poderia dizer que o governo federal, antes de fazer uma Copa do Mundo, deveria pensar no direito à moradia para toda a população. Agora, é feito um programa, pactuado com todos os níveis de governo, para resolver um problema específico [as desapropriações]. A gente resolve o problema”, afirmou.
Depois da visita da reportagem ao local, o governo do estado anunciou a construção de 1,2 mil casas para moradores de São Francisco no município de São Lourenço da Mata, onde fica o estádio da Copa.
A localidade fica a poucos quilômetros de Camaragibe.
O projeto que deu origem a esta reportagem foi vencedor da Categoria Rádio do 7º Concurso Tim Lopes de Jornalismo Investigativo, realizado pela Andi, Childhood Brasil e pelo Fundo das Nações Unidos para a Infância (Unicef).
Recife -Onde se viam casas, ruas repletas de gente e quitandas à beira da pista, hoje se vê terra, caminhões, escavações e poeira.
Na região metropolitana do Recife, o terreno vazio, que antes abrigava 200 famílias do Loteamento São Francisco do Timbi, foi desapropriado para a ampliação do terminal de ônibus do município de Camaragibe.
A obra, que faz parte do ramal da Copa do Mundo , ganhou fôlego com a necessidade de levar torcedores de Recife até a Arena Pernambuco, onde serão disputadas cinco partidas do campeonato mundial de futebol .
A dificuldade de alugar um imóvel nas mesmas condições que o demolido e a impossibilidade de comprar uma casa nova com as baixas indenizações fazem com que famílias passem por situações difíceis.
Para discutir soluções conjuntas, os antigos moradores passaram a se reunir na comunidade.
Em uma dessas reuniões, Augusto*, de 71 anos, pede ajuda para compreender uma intimação do Conselho Tutelar local.
É que desde a mudança, para uma casa onde já viviam duas famílias, o filho, de 11 anos, não vai a escola e se “envolve em confusões”, conta.
O Conselho Tutelar de Camaragibe não tem um levantamento do impacto das remoções sobre as crianças e adolescentes nem sobre a ausência de escolas, creches e equipamentos de esporte e lazer no local e nas proximidades, para onde muitos se mudaram.
Reconhece, entretanto, que a fragilidade da situação, a mudança e a necessidade de se adaptar a uma nova rotina em condições que não são tão favoráveis como a anterior acentuam problemas já existentes.
“A questão é que os problemas familiares já existem, mas se agravam. O que se fazia antes, dentro do ambiente deles, da família, e que a vizinhança socorria, ajudava, participava, não acontece mais”, disse a conselheira tutelar de Camaragibe Josefa Maria de Mello.
As famílias que restaram no São Francisco também sofrem com a retirada de metade da comunidade e contabilizam dificuldades com o fim de uma série de serviços no bairro.
A padaria e o mercadinho não existem mais e a única creche da localidade fechou as portas por falta de aluno.
O Educandário Bom Jesus, que é particular, não recebeu nenhuma matrícula em 2014 e funciona hoje apenas como ponto de encontro para a reunião de moradores.
* O nome do entrevistado foi alterado para preservar a identidade da criança
Edilza Ferreira de Brito, mãe de Vitória Ferreira, de 7 anos, disse que esperou a abertura de uma turma para as crianças remanescentes do São Francisco. “Fiquei até o fim esperando. Mas quando surgiu o boato de que poderemos ter que sair nos próximos anos ninguém matriculou os meninos”, contou.
A comunidade ficou com medo de ficar sem a escolinha no meio do semestre e de os filhos acabarem perdendo o ano com a desapropriação da creche.
Mãe de três crianças, entre elas, um bebê de 11 meses, Rosângela Henrique Barbosa também sofre com o fim da creche e as intervenções no bairro.
Ela conta que ficou mais difícil levar e buscar o mais velho na escola, coisa que ela faz a pé todos os dias.
“Antes era aqui pertinho, em um instante ele chegava, voltava até só, agora é longe, a gente caminha no calor, na poeira, por causa dessas obras. Vivemos em crise de alergia”, contou.
A prefeitura de Camaragibe disse que não acompanhava os problemas causados pelas remoções por ser uma intervenção do estado.
“Todas as desapropriações foram dadas pelo estado, a prefeitura está dando suporte social”, disse o secretário de Assistência Social, Eduardo Napoleão.
O órgão passou a oferecer atenção psicossocial no início deste ano, depois das cobranças dos moradores.
Não há, no entanto, nenhum acompanhamento sobre a situação dos jovens.
Responsável pelas desapropriações, a Procuradoria-Geral do estado de Pernambuco reconhece que os processos são “traumáticos paras as populações atingidas” e que muitas vezes o valor das indenizações são insuficientes para a compra de um novo imóvel no mesmo bairro.
“A gente tenta remediar encaminhando para os programas de auxílio-moradia e programas habitacionais da prefeitura ou do governo do estado”, disse o procurador-geral, Thiago Norões.
Segundo ele, um planejamento de longo prazo para as cidades seria o ideal.
“Eu poderia dizer que o governo federal, antes de fazer uma Copa do Mundo, deveria pensar no direito à moradia para toda a população. Agora, é feito um programa, pactuado com todos os níveis de governo, para resolver um problema específico [as desapropriações]. A gente resolve o problema”, afirmou.
Depois da visita da reportagem ao local, o governo do estado anunciou a construção de 1,2 mil casas para moradores de São Francisco no município de São Lourenço da Mata, onde fica o estádio da Copa.
A localidade fica a poucos quilômetros de Camaragibe.
O projeto que deu origem a esta reportagem foi vencedor da Categoria Rádio do 7º Concurso Tim Lopes de Jornalismo Investigativo, realizado pela Andi, Childhood Brasil e pelo Fundo das Nações Unidos para a Infância (Unicef).