O que bons prefeitos fazem em 100 dias de governo
Para um novo governo, os 100 primeiros dias de gestão são decisivos para se conectar com cidadãos - mas nem todos são eficazes nisso
Bárbara Ferreira Santos
Publicado em 14 de abril de 2017 às 06h30.
Última atualização em 14 de abril de 2017 às 06h30.
São Paulo -- As gestões municipais completam cem dias de mandato nesta semana. Nesse período, metas foram traçadas para os próximos anos de governo e os primeiros balanços foram divulgados.
Mas, no meio de tanta informação divulgada pelas prefeituras , no que é preciso prestar atenção? O que bons prefeitos fazem nesse período?
Dois especialistas consultados por EXAME.com dão suas respostas:
100 dias: época de organizar a gestão e comunicar metas
Segundo Humberto Dantas, cientista político e coordenador do Master em Liderança Pública do Centro de Liderança Pública (CLP), esse é o período para cada prefeito mostrar seu “cartão de visitas” .
Na visão dele, em 100 dias, os gestores municipais devem ser hábeis para organizar informações e comunicar os próximos passos do governo.
Ele explica que a primeira coisa a ser feita pelo gestor é ter a exata dimensão de tudo o que foi prometido na campanha, não só o que se registrou no plano de governo, mas o que estava nos folders e no que foi dito nas ruas, nos comícios e nas entrevistas.
O segundo grande ponto é montar uma boa equipe, alerta Dantas. “Tem que montar uma equipe para enfrentar desafios técnicos e políticos. E também saber quem, dentro dessa equipe, é que vai dizer a verdade, mesmo que essa verdade não agrade”.
Segundo Dantas, esses 100 dias também são o período em que o prefeito se dá conta da real situação do município que vai gerir. “Sempre brinco que o prefeito tem que fazer terapia porque eles entram no mandato com complexo de super herói e descobrem que não vão poder fazer tudo”, diz Dantas.
Nesse primeiro momento, as metas têm de ser bem comunicadas para a população. Mas é também importante expor as dificuldades para atingir cada um dos objetivos. “Um candidato muitas vezes ganha a eleição dizendo o que o eleitor quer ouvir, o que muitas vezes não condiz com a realidade da cidade”, alerta Dantas.
Em síntese, o especialista destaca três pontos centrais como importantes de serem feitos pelos prefeitos nos 100 dias:
1. Mostrar e organizar todas as promessas e compromissos de campanha dividindo em ações de curto, médio e longo prazo. Também concluir nos 100 dias as ações de curto prazo que já podem ser cumpridas.
2. Fazer um resumo do que foi levantado na prefeitura, como o balanço das contas públicas e da situação fiscal, para mostrar a situação encontrada.
3. Criar um bom relacionamento no campo da comunicação para impactar a cidade. Prefeito tem que explicar o que quer fazer a longo prazo e de como será esse governo.
Período serve para mostrar como serão os 4 anos de governo
Já o coordenador geral da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis, Jorge Abrahão, explica que, nos primeiros 100 dias, os prefeitos “criam as bases para o governo de 4 anos”, ou seja, eles mostram o estilo de administração e os projetos que a gestão quer fazer e concluir.
Ele destaca ainda a importância dos planos de metas, documentos que traçam os objetivos das gestões, e que normalmente são divulgados dentro dos 100 dias.
Mas o que cabe à sociedade fazer nesse período? As pessoas devem olhar esse planejamento e checar se ele contempla o que é prioridade para os moradores da cidade, explica Abrahão. “É a hora de ver onde está a prioridade da prefeitura e ver onde o dinheiro será aplicado”, afirma ele.
Abrahão diz ainda que, se os interesses da maioria não estiverem atendidos no planejamento, é preciso que a população busque um diálogo com a prefeitura para analisar o que é possível ser feito - e vice versa. “A relação dos políticos com a sociedade tem que ser mais franca e verdadeira. E também é preciso entender as diferenças e saber que elas são saudáveis”, afirma Abrahão.
“Quando a gente defende a participação da sociedade, não significa que tem que incorporar tudo o que é pedido. Mas o diálogo é importante para, inclusive, saber por que motivo os projetos não podem ser consolidados”, explica ele.
Uma forma de ver qual é a realidade da cidade e o que precisa ser melhorado é acompanhar os observatórios das prefeituras e das organizações civis, criados com o conjunto de indicadores municipais, recomenda Abrahão.
“O que a gente espera é que os recursos sejam destinados na direção de reduzir as desigualdades. Em São Paulo, por exemplo, há grandes distorções socioeconômicas entre os bairros. E a periferia têm déficit em serviços de saúde, educação, mobilidade, urbanização e tudo o que impacta na qualidade de vida”, afirma Abrahão.
Mas, para que melhoras efetivas sejam alcançadas, não adianta acompanhar apenas os primeiros cem dias da gestão. É preciso fazer isso durante o resto do mandato, diz o especialista. Uma boa forma de o cidadão exigir mudanças é participar das audiências públicas, que acontecem nas prefeituras e nas câmaras municipais.
“O fortalecimento da democracia tem que ter participação da sociedade. É importante a gente não se satisfazer com a democracia participativa, ou seja, aqueles que foram eleitos para nos representar, mas também participar do processo”, afirma Jorge Abrahão.
Depois dos 100 dias, jornada que segue
Se os 100 dias não mostram tudo o que será feito nos quatro anos de gestão, eles ao menos servem como um bom indicativo do que os prefeitos planejam para a cidade.
Cabe aos gestores o planejamento para a jornada que se inicia e, para a população, cobrar que as metas sejam de fato cumpridas. Uma coisa é certa: em todo o país, ainda há muito o que ser feito até 2020. O mandato só começou.