Marlon Reis: afirma que a legislação eleitoral passou a incluir, há décadas, a proibição da prisão a 15 dias das eleições como uma forma de proteger a sociedade (Divulgação/Divulgação)
Estadão Conteúdo
Publicado em 17 de julho de 2017 às 11h26.
Brasília - Um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, o advogado e ex-juiz estadual Márlon Reis disse que é "injustificável" e chamou de "cavalo de troia" a proposta do deputado Vicente Cândido (PT-SP) de incluir, em seu relatório na comissão que discute a reforma política na Câmara, a proibição de prisão de candidatos pré-habilitados para disputar as eleições até oito meses antes da votação.
Ele até defende a medida de antecipar a habilitação dos candidatos, afirmando que é uma maneira de evitar que a discussão sobre quais têm condições de elegibilidade aconteça apenas após o registro da candidatura. "O problema é dizer que um candidato, a partir daí, não pode mais ser preso".
"Na verdade, é um cavalo de troia, porque vem com uma capa de algo que já vinha sendo reivindicado pelo movimento contra a corrupção eleitoral, a antecipação da habilitação, mas isso vem junto com uma outra medida extremamente negativa e injustificável", afirmou o advogado em entrevista ao Broadcast Político.
"Dessa forma como está dada, fica parecendo que a medida é voltada a realmente proteger o candidato em particular que é o Lula. O que não está certo, porque não é só do Lula que estamos falando. Estamos falando de todos os candidatos do Brasil. Entre eles, já foram descobertos candidatos financiados pelo PCC, a grande quantidade de candidatos envolvidos com o crime organizado, homicídios, narcotráfico... todo mundo vai por esta brecha".
Márlon Reis afirma que a legislação eleitoral passou a incluir, há décadas, a proibição da prisão a 15 dias das eleições como uma forma de proteger a sociedade.
"Isso nasce da situação real que existia na época do coronelismo. Como os coronéis tinham uma ascendência completa sobre todos os Poderes e, inclusive, sobre a polícia local, eles conseguiam a prisão de opositores, fazer isso como maneira de intimidá-los e retirá-los do cenário. (A medida) surgiu, portanto, como garantia não para os candidatos, mas para a sociedade, para as pessoas terem o direito de votar nos candidatos que elas quisessem", diz.
O cenário não pode ser comparado com o atual, segundo o advogado. "Hoje existe o devido processo legal, as pessoas que forem injustamente acusadas têm o direito de recorrer, são múltiplas instâncias."
"Eu entendo até que pudesse ser questionada a sobrevivência do prazo que existe hoje na lei, mas a expansão jamais. Não há a menor necessidade de expansão do prazo de salvo conduto previsto na legislação", afirma.
Ele também afirma que, se a ideia é impedir apenas o abuso de autoridade, "teria que deixar claro que é plenamente possível o início da execução da pena, após condenação em segunda instância. Deixar claro que isso não será impedido ser feito".
Outro ponto em que a proposta falharia, segundo o advogado, é que a blindagem representaria uma ofensa ao princípio da igualdade. "É possível afastar o princípio da igualdade em determinadas hipóteses, entretanto para afastar é preciso haver alguma justificativa absolutamente plausível, e nesse caso não há. Por isso, entendo que a proposta, evidentemente, é de inconstitucionalidade chapada", afirmou, opinando que o Judiciário dificilmente a validaria.
Além de ver como benéfica a antecipação do registro, Márlon Reis disse que há outros pontos positivos na proposta do relator, com algumas ressalvas. "Acho que isso (a 'Emenda Lula') não compromete o relatório como todo. Mas é algo que tem de ser extirpado do relatório", afirma.
"Num país que tem graves problemas de segurança púbica, esta medida alcançaria toda a criminalidade geral, inclusive a criminalidade violenta, que poderá usar essa janela para a impunidade. Não é só a corrupção que vai ser favorecida", finalizou.