Liminar de Marco Aurélio dificulta planos de Renan para o Senado
Emedebista, que apoiou Haddad, é considerado um nome hostil ao futuro governo por aliados de Bolsonaro
Estadão Conteúdo
Publicado em 21 de dezembro de 2018 às 08h41.
Última atualização em 21 de dezembro de 2018 às 08h41.
São Paulo - A liminar concedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, determinando que a eleição para a presidência do Senado ocorra por meio de votação aberta, dificultou os planos do senador Renan Calheiros (MDB-AL) de disputar o cargo no dia 1.° de fevereiro. Renan classificou a decisão como uma interferência no Poder Legislativo.
O emedebista, que apoiou Fernando Haddad (PT) na eleição presidencial deste ano, é considerado um nome hostil ao futuro governo por aliados do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). Renan conta com o apoio da bancada do PT.
Para senadores ouvidos pela reportagem, o voto aberto reforça a possibilidade de influência do Executivo sobre os parlamentares porque o Palácio do Planalto saberá como cada um votou. Apesar de Bolsonaro afirmar que não pretende interferir na sucessão no Congresso, seus aliados fizeram chegar aos senadores o recado de que qualquer nome é aceitável na presidência do Senado, menos o de Renan.
Com apenas quatro senadores eleitos, todos novatos na Casa, o PSL de Bolsonaro não deve apresentar uma candidatura própria contra o emedebista.
Pelo menos seis nomes são cotados para a disputa do Senado: além de Renan, estão na lista a líder do MDB, Simone Tebet (MS), Tasso Jereissati (PSDB-CE), Davi Acolumbre (DEM-AP), Alvaro Dias (Podemos-PR) e Esperidião Amin (PP-SC).
Como a próxima legislatura terá um perfil mais fragmentado, a avaliação majoritária no Senado é que o voto aberto vai constranger eleitores de Renan, que é investigado na Lava Jato e tratado pelos bolsonaristas um representante da "velha política".
Renan criticou duramente a decisão de Marco Aurélio, que é defendida por parte dos senadores. "Não cogito que essa decisão chegue viva (até o dia da eleição da Mesa Diretora do Senado). É uma intromissão indevida no Legislativo que não interessa a nenhum dos outros poderes", disse nesta quinta-feira, 20, o senador à reportagem. Renan também fez na quarta-feira um discurso no plenário criticando a liminar. O senador afirmou na tribuna que "até na eleição do Supremo" o voto é secreto.
Recurso
A advocacia do Senado prepara um recurso formal à liminar concedida na quarta por Marco Aurélio no mandado de segurança impetrado no STF pelo senador Lasier Martins (PSD-RS). Segundo as regras previstas no Regimento Interno do Senado, a votação deve ser secreta, mas o senador apresentou projeto de resolução para alterá-las.
A tendência é de que o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), encaminhe o recurso ao presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli. Se a peça chegar à corte na fase final do recesso do Judiciário, o recurso será analisado pelo vice-presidente do tribunal, ministro Luiz Fux.
A liminar de Marco Aurélio foi criticada também pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pré-candidato à reeleição. "O que ocorreu é mais do que interferência no regimento do Senado. Não se respeitar a Constituição é um risco porque podemos ter um presidente eleito no voto aberto com interferência indevida do Executivo", afirmou.
Aliados de Renan no Senado fizeram coro com o emedebista. A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que não se reelegeu, disse que o voto secreto garante a independência do Parlamento e pediu que o Supremo reveja a decisão. "Imaginem voto aberto para a Mesa do senado, para a Mesa da Câmara. Na Câmara de Vereadores, nas Assembleias Legislativas, quem vai ganhar? O candidato apontado e apoiado pelo governador, o candidato apoiado e apontado pelo presidente da República, que detém a chave do cofre, o poder de mando."
Eleito senador por São Paulo, o deputado Major Olímpio (PSL) disse que com o voto fechado "dificilmente" Renan deixaria de ser eleito presidente do Senado. "No momento que eu manifestava minha ira em relação ao ministro Marco Aurélio devido a decisão de soltar o presos condenados em 2° instância, devo admitir que comemorei a decisão dele sobre o voto aberto."
Com oito senadores, a bancada do PSDB no Senado, que deve lançar Tasso Jereissati (CE) na disputa pela presidência da Casa, comemorou a liminar. "O STF tem ampla e total autonomia para tomar qualquer decisão. E o legislativo tem que cumprir. Renan, evidentemente, será o principal prejudicado", disse o senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO).
O senador eleito Irajá Abreu (PSD-TO) tem a mesma avaliação. "Essa legislatura trouxe muita renovação. Renan será prejudicado porque vai haver muita pressão da opinião pública."
O senador Cristovam Buarque (PPS-DF), que está se despedindo do mandato, também defendeu a liminar. "Não gosto de julgar a Justiça. É a Justiça que julga a gente. Se foi uma interferência, foi na direção certa. Parlamentares não têm o direito de votar escondido."
Filiação
Renan tem atuado para inflar a bancada do seu partido no Senado e conquistar mais votos na disputa pela presidência da Casa. Ao menos um parlamentar já aceitou migrar para o MDB e outros dois ainda negociam, o que pode levar a sigla a 15 senadores.
Na última semana, Renan e o presidente da legenda, Romero Jucá (RR), acertaram a filiação do recém-eleito Eduardo Gomes (SD-TO). O acordo ainda não foi anunciado oficialmente.
Por tradição, o presidente do Senado é indicado pelo maior partido, o que torna Renan um dos favoritos para a eleição. Filho do futuro presidente, o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-SP), porém, indicou que não pretende respeitar o acordo tácito. Segundo ele, no Brasil, os eleitores votam em pessoas, não em partidos.
O MDB também negocia com os senadores Elmano Férrer (Podemos-PI) e Rose de Freitas (Podemos-ES). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.