Justiça diz que ensino domiciliar é direito da família
Julgamento do recurso no STF, que tem como relator o ministro Luís Barroso, deverá ocorrer nesta quinta, 30
Estadão Conteúdo
Publicado em 30 de agosto de 2018 às 09h43.
Última atualização em 11 de abril de 2019 às 16h13.
São Paulo - A Promotoria de Justiça de Defesa da Educação, braço do Ministério Público no Distrito Federal, sustenta que a homeschooling "está em consonância com o princípio fundamental da República do pluralismo político e compatível com o sistema jurídico-legal em vigência, dispondo a família do direito ao exercício da liberdade educacional quanto à prioridade na escolha da direção na criação e educação dos filhos menores - liberdade de aprender e ensinar, incluindo a educação familiar".
Na terça, 28, o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG) emitiu Nota Técnica no âmbito do Recurso Extraordinário nº 888815, que decidirá se o ensino domiciliar pode ser considerado meio lícito de cumprimento, pela família, do dever de garantir a educação dos filhos. O julgamento do recurso no Supremo Tribunal Federal, que tem como relator o ministro Luís Barroso, deverá ocorrer nesta quinta, 30.
Em Nota Técnica, na quarta, 29, as promotoras Cátia Gisele Martins Vergara e Márcia Pereira da Rocha, da Proeduc (Promotoria da Educação), divulgaram o posicionamento do órgão de execução de defesa da educação do Ministério Público/DF, "acerca da constitucionalidade da educação domiciliar, sob o prisma do pluralismo político, da liberdade educacional e da autonomia familiar".
"A presente Nota Técnica tem por objetivo apresentar o entendimento jurídico-legal das Promotoras de Justiça de Defesa da Educação - Proeduc, enquanto órgãos de execução do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT, com atribuições de fiscalização do cumprimento do ordenamento jurídico pertinente à educação básica no Distrito Federal, em relação à constitucionalidade da educação domiciliar (homeschooling), consistente na educação ministrada pela família no ambiente familiar, sob os fundamentos do pluralismo político, da liberdade educacional e da autonomia familiar", assinala o documento.
"Colocada a família no mesmo patamar obrigacional do Estado em relação à educação, depreende-se que o texto constitucional não estabelece uma divisão das obrigações entre Estado e família, de modo que ambos detêm igualmente o dever de promover a educação visando o cumprimento de suas finalidades que são o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho", argumentam Cátia Gisele Martins Vergara e Márcia Pereira da Rocha.
As promotores anotam que a Constituição Federal estabelece, no artigo 206, que: "O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; V - valorização dos profissionais do ensino, garantido, na forma da lei, plano de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, assegurado regime jurídico único para todas as instituições mantidas pela União; VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei; VII - garantia de padrão de qualidade.
"Conjugados os dispositivos, verifica-se que a família, por meio dos pais e responsáveis, enquanto detentores do poder familiar, possuem a liberdade e autonomia em escolher o modelo de educação de seus filhos, considerado o respeito à pluralidade de concepções pedagógicas e desde que cumpridas as finalidades educacionais previstas no próprio texto constitucional. Se por um lado, a família está obrigada ao dever de educação dos filhos, não detendo qualquer discricionariedade ou disposição quanto à efetivação desse direito fundamental, de outro lado, por força normativa constitucional, a família tem a liberdade de escolher e promover a educação de maneira distinta da educação tradicional de massa realizada no ambiente escolar, assegurando-se o pluralismo político no contexto educacional", afirmam as promotoras.
"É certo que a família, embora detentora da escolha do modelo educacional, não dispõe de liberdade em não adotar os conteúdos mínimos de aprendizagem, devendo o Estado efetuar a fiscalização e o controle por meio de avaliações e outros mecanismos de verificação da qualidade e do cumprimento das finalidades educacionais, segue o documento.
"Todavia, respeitada a soberania da família no que diz respeito aos seus deveres intrínsecos, entre os quais está a liberdade educacional, incumbe ao ente estatal, o que se apresenta como dever inderrogável, promover a regulamentação e a fiscalização e controle de padrões mínimos de conteúdo e qualidade da educação domiciliar, para efetivo cumprimento da finalidade do pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho."