Dirceu diz que reconhece a coragem de FHC ao apresentar a situação de fragilidade dos partidos de oposição hoje no Brasil, mas contesta suas críticas (Ana Araujo/Veja)
Da Redação
Publicado em 6 de agosto de 2012 às 23h40.
São Paulo - A defesa do ex-ministro José Dirceu, apontado como réu número um do mensalão, tentou desqualificar nesta segunda-feira, no Supremo Tribunal Federal (STF), a acusação do Ministério Público de que seria o “chefe de quadrilha” e questionou a credibilidade do presidente do PTB, Roberto Jefferson, denunciante do maior esquema de corrupção do governo Lula.
O advogado José Luiz de Oliveira Lima, que coordena a banca de defesa de Dirceu, disse que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, se valeu de testemunhas que teriam atestado a influência do então ministro no esquema apenas por “ouvir dizer”. Ele afirmou que outros depoentes “negaram taxativamente” o pagamento sistemático de parlamentares - tese defendida pela acusação - e declarou não existirem provas cabais da participação de José Dirceu como chefe ou participante do mensalão.
“José Dirceu talvez tenha sido uma das pessoas mais investigadas nesse país. Meu cliente não é quadrilheiro, não é chefe de uma organização criminosa”, disse o defensor. Ironizando o procurador-geral, Oliveira Lima afirmou que “o pedido de condenação de José Dirceu é o mais atrevido e escandaloso ataque à Constituição”. O petista é acusado de corrupção ativa e formação de quadrilha.
Prova testemunhal - Em sua exposição, o advogado disse que as provas testemunhais são a base de toda a denúncia do Ministério Público, mas criticou o fato de o procurador-geral ter defendido a procedência da denúncia ainda que a maior parte dos depoentes tenha negado, em juízo, a existência do mensalão. Ele destacou que, em geral, os cerca de 600 depoimentos tomados na instrução do processo isentam Dirceu. O advogado lembrou, por exemplo, que o ex-presidente Lula e a atual presidente Dilma Rousseff defenderam José Dirceu em seus depoimentos à Justiça.
“Acho Dirceu uma pessoa injustiçada. Tenho pelo ministro grande respeito”, afirmou Dilma ao prestar depoimento enquanto ainda ocupava a chefia da Casa Civil no governo Lula - cargo para o qual ela foi conduzida após a queda de Dirceu em meio ao escândalo do mensalão. Lula também elogiou Dirceu em depoimento, por escrito, anexado à ação penal do mensalão. “Desconheço qualquer fato desabonador sobre José Dirceu, que lutou pela democratização do Brasil, pagando com o exílio”, relatou. “(Dirceu) É um quadro político de grande relevância no cenário nacional”, completou o ex-presidente.
“O que tem mais validade, o interrogatório de Roberto Jefferson, que não tem compromisso de dizer a verdade, ou testemunhas que têm a obrigação de dizer a verdade?”, questionou o advogado. “Se não se pode dar credibilidade para esses depoimentos, eles (depoentes) têm que ser processados por falso testemunho”, disse.
Aos ministros do Supremo Tribunal Federal, o advogado negou a existência do mensalão. “O Ministério Público não comprovou sua tese (de existência do mensalão) não por incompetência, não por inércia, mas porque não é verdade que houve a propalada compra de votos. Não existe prova dessa acusação dos autos”, completou Oliveira Lima. Para ele, a procuradoria-geral da República pede a condenação de José Dirceu para que ele sirva de “exemplo” para a classe política, embora, em seu entender, não existam provas para qualquer condenação.
“O Ministério Público apresenta frases de efeito, diz que a condenação vai servir de exemplo. Desde quando condenação com desprezo ao contraditório e sem provas pode servir de exemplo?”, indagou.
Julgamento técnico - Em sua sustentação oral, o advogado de Dirceu disse ainda esperar que o Supremo promova um “julgamento técnico” do processo do mensalão e afirmou que não usa a biografia do ex-ministro da Casa Civil como eventual atenuante ou fator para sua absolvição. “Não vou pedir a absolvição de Dirceu por seu passado. Ele tem uma folha de serviços prestados ao país, gostem ou não. Ele não tem folha corrida”, declarou.
Influência no PT - Apesar de petista histórico, José Dirceu, nas palavras do advogado, deixou de ter influência direta no PT assim que assumiu a chefia da Casa Civil, em 2003. Seu afastamento das atividades partidárias formais seria, segundo a defesa, prova de que não comandou ou coordenou qualquer proposta de compra de parlamentares.
“Não estou afirmando que Dirceu é um homem sem importância no PT, mas quando assumiu a chefia da Casa Civil, ele deixou de participar da vida do partido. Quem fala isso são as testemunhas. Não foi um depoimento ou dois depoimentos, foram dezenas de depoimentos nesse sentido. Qual depoimento de contraditório consta na ação penal? Nenhum”, afirmou o defensor de Dirceu.
“É inegável que Dirceu, enquanto ocupou a Casa Civil, participava, sim, da negociação dos cargos do governo. Mas isso não quer dizer que ele indicava a todos ou que isso é um ato ilegal”, completou.
Mentor do mensalão - Na acusação feita pelo procurador-geral da República, na última sexta-feira, o chefe do Ministério Público listou laudos periciais, depoimentos e interrogatórios para comprovar que José Dirceu foi o “mentor” do mensalão, uma figura onipresente em todas as fases da organização criminosa: no desvio de recursos públicos, na fraude de empréstimos, na negociação de cargos na administração pública e na corrupção de congressistas. “Dirceu está em todas”, acusou Gurgel.
“Dirceu sabia da cooptação de políticos para a compra de base parlamentar de apoio ao governo, sabia que essa base estava sendo formada à custa de vantagens indevidas e, acima de tudo, sabia de onde vinha o dinheiro”, disse Gurgel. Para ele, como em sofisticadas organizações criminosas, a participação do chefe da quadrilha não aparece em provas cabais. Para o MP, “autor” também é o chefe da quadrilha que planeja as atividades criminosas, mesmo sem as executar.
“O autor dos chamados crimes organizados agem a quatro paredes. O autor intelectual quase sempre não fala ao telefone, não envia mensagens, não assina documentos e não movimenta contas”, explicou o procurador-geral na acusação.