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Fiocruz considera urgente a adoção de ações de "lockdown" no Rio

A instituição afirma que se a medida não for adotada pode haver um período prolongado de escassez de leitos e insumos, com sofrimento e morte

Coronavírus: lockdown tem sido adotado como medida de isolamento contra a covid-19 (Bloomberg/Getty Images)

Coronavírus: lockdown tem sido adotado como medida de isolamento contra a covid-19 (Bloomberg/Getty Images)

AO

Agência O Globo

Publicado em 6 de maio de 2020 às 19h27.

Última atualização em 6 de maio de 2020 às 20h26.

O governador Wilson Witzel discute com juristas a proposta de lockdown no Rio de Janeiro feita pelo comitê de notáveis que assessora o estado nos temas relativos à Covid-19. Um relatório da Fiocruz com a mesma sugestão foi encaminhado pelo Ministério Público do Rio (MPRJ), que havia pedido estudos sobre a possibilidade da medida, ao governo e à prefeitura no início desta quarta. A adoção de "medidas rígidas de distanciamento e ações de lockdown" é considerada "urgente" pela Fiocruz.

Integrante da comissão, o epidemiologista Roberto Medronho, da UFRJ, diz que o governador analisa se há segurança jurídica para a decretação de um isolamento social mais profundo, como fechamento das divisas do estado e restrição ainda maior de circulação de pessoas. O governo, que nesta quarta-feira publicou no Diário Oficial a criação de mais um comitê, agora envolvendo também representantes da área econômica do Rio, tem até quinta para responder ao Ministério Público questões sobre um possível lockdown.

— O fato dele estar avaliando com juristas é uma boa notícia, porque há algum tempo atrás ele teria descartado imediatamente o lockdown. Ele analisa se há segurança para decretar ou não — afirma Roberto Medronho, dizendo que as respostas para as perguntas do MP serão determinantes.

Fiocruz destaca 'objetivo de salvar vidas'

Na segunda, o MPRJ enviou recomendação solicitando que o governo faça estudos sobre a viabilidade de ações mais duras de confinamento. Foram pedidas informações como impacto econômico da medida no estado e também como um lockdown influenciaria na quantidade de casos e óbitos pelo novo coronavírus. As determinações de distanciamento social em vigor no Rio de Janeiro expiram na segunda-feira. Segundo uma fonte ligada ao governador, a adoção do lockdown está "sendo estudada".

Nesta quarta, a Fiocruz enviou seu relatório ao Ministério Público, que então o encaminhou ao governo. O ofício diz:

"Com o objetivo de salvar vidas e com base em análises técnico-científicas, a Fiocruz considera urgente a adoção de medidas rígidas de distanciamento social e de ações de lockdown no Estado do Rio de Janeiro, em particular na Região Metropolitana".

O documento contém análises, justificativas e ponderações de especialistas sobre o tema. O MP ressalta, no entanto, que é preciso um planejamento prévio e rápido para que seja decretado o lockdown. O relatório da Fiocruz reforça a recomendação já feita pelo comitê científico que auxilia o estado nessa pandemia.

Roberto Medronho é um dos que recomendam o lockdown, mas desde que seja garantida ajuda para os moradores do estado em situação econômica vulnerável. Ele acrescenta que a medida é necessária na Região Metropolitana e que, para outras regiões do estado, precisaria ser analisada.

— A única vacina que nós temos no momento é o lockdown. Nós estamos recomendando sabendo que é um remédio amargo, mas não é por ser remédio amargo que nós deixaremos de receitar ao paciente. No nível coletivo, ele é necessário para salvar vidas. O que nós pedimos aos governantes, especialmente ao governo federal, é que que ajude os mais vulneráveis economicamente. São pessoas que precisam de subsistência, sendo que muitas vivem do trabalho informal. Parando a atividade econômica, elas não têm nenhuma renda. É preciso amenizar as medidas amargas com o necessário e fundamental apoio econômico — ressalta o epidemiologista.

O lockdown incluiria fechar as divisas do estado; restringir a circulação de pessoas a ações essenciais, como para compra de alimentos e medicamentos e serviços de delivery; e a criação de um documento de autodeclaração sobre a necessidade de circular. No caso de descumprimento por motivo fútil, a pessoa abordada poderia ser penalizada com multa. O uso de máscaras para qualquer saída também passaria a ser obrigatório. O comitê de notáveis ainda propôs que a saída do lockdown esteja condicionada à testagem em grande escala, para que haja uma identificação realista das pessoas infectadas.

— Não tenho dúvida de que deveria ser decretado o lockdown para a Região Metropolitana — destaca Medronho.

Para o ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão, médico sanitarista e também integrante da comissão de notáveis, o documento técnico-científico da Fiocruz sobre a evolução e com projeções da Covid-19, além de soluções para a pandemia no país e no Rio de Janeiro, pode contribuir para embasar o lockdown no estado. Ele chama a medida de  "radicalização do isolamento social em defesa da vida".

— O Brasil tem hoje um índice de disseminação mais alto que Estados Unidos e países da Europa. O objetivo da radicalização do isolamento social em defesa da vida é puxar esse índice para baixo.  Mas sem grande mobilização da sociedade, sem a Firjan, Associação Comercial, ONGs, entidades de defesa dos direitos humanos e lideranças comunitárias ela não vai funcionar. Temos que fugir de um viés autoritário de polícia sanitária. No centro do debate está, mais que aspectos técnico-científicos, a questão econômica. Há uma falta de qualidade das políticas federais para garantir que as pessoas fiquem em casa — afirma Temporão.

Para ele, o isolamento caiu "assustadoramente" no Rio, embora ele seja fundamental para reduzir a demanda por leitos e internações e evitar que o sistema de saúde  entre em colapso.

— As pessoas se sentem protegidas, participando, quando conseguem compreender a situação. Mas hoje cada autoridade fala uma coisa — diz o ex-ministro, se referindo à postura do presidente Jair Bolsonaro em relação ao isolamento. —  Hoje, não há proteção econômica para que parte da população fique em casa, e isso é central. Sem isso, não vamos superar essa situação.

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