Dilma pode escalar Coutinho para conter gastos que ele criou
Para alcançar a meta de 30% do PIB em dívida líquida, governo terá que conter expansão de gastos em empréstimos do BNDES
Da Redação
Publicado em 3 de novembro de 2010 às 10h19.
Brasília/Rio de Janeiro - Luciano Coutinho poderá ser escalado pela Presidente-eleita Dilma Rousseff para conter o aumento nos gastos públicos que ele mesmo ajudou a fomentar à frente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e social.
Professor de Economia de Dilma na Universidade de Campinas no final dos anos 1990, Coutinho, de 64 anos, deverá ser um dos principais conselheiros econômicos da presidente a partir de 1º de janeiro e é um dos nomes cotados para assumir o Ministério da Fazenda, de acordo com Tony Volpon, estrategista para América Latina da Nomura Securities International Inc. em Nova York, e o Eurasia Group, uma empresa de pesquisas com sede em Nova York.
Para cumprir a promessa de Dilma de reduzir a dívida líquida dos atuais 41 por cento para cerca de 30 por cento do Produto Interno Bruto até 2014, o próximo ministro da Fazenda terá de conter a expansão dos gastos. Para sustentar os empréstimos do BNDES, o Tesouro Nacional injetou no banco R$ 205 bilhões desde o início de 2009, equivalente a cerca de 75 por cento do crescimento da dívida pública interna no período.
“O papel que Coutinho desempenha hoje no BNDES vai na direção oposta do que ele teria de fazer como ministro da Fazenda”, disse Felipe Salto, economista especializado em finanças públicas da Tendências Consultoria Integrada em São Paulo. Não se sabe que atitude Coutinho teria porque a própria Dilma enviou mensagens desencontradas sobre as intenções dela, disse Salto. “Até que ela dê um sinal mais claro, as pessoas vão ficar um pouco em dúvida.”
À frente do BNDES desde 2007, Coutinho dobrou os empréstimos do banco para R$ 137,4 bilhões (US$ 81 bilhões) no ano passado, superando o total das operações do Banco Mundial, que somaram US$ 72,2 bilhões em 2009.
Duas políticas monetárias
O aumento dos empréstimos subsidiados do BNDES, que ajudaram o País a superar a crise de crédito global, exige do Banco Central a imposição de juros mais altos para conter a inflação, de acordo com Ricardo Hausmann, professor da Universidade Harvard em Cambridge, Massachusetts.
O juro real do Brasil, após descontada a inflação, é de cerca de 6 por cento ao ano, o mais elevado entre o Grupo dos 20. A taxa Selic está em 10.75 por cento e o BNDES oferece empréstimos que têm como referência a Taxa de Juros de Longo Prazo de 6 por cento.
Cada ponto percentual de diferença entre as duas taxas custa ao governo cerca de R$ 4 bilhões, Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Banco Santander em São Paulo, disse numa entrevista no mês passado.
“O Brasil tem, de fato, duas políticas monetárias: uma comandada pelo Banco Central e outra pelo BNDES”, disse Hausmann, ex-economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento em Washington.
Substituição de importações
Criado em Recife, Coutinho aderiu à escola “desenvolvimentista” de pensamento econômico que defendeu na década de 70 proteção tarifária contra importações e investimento liderado pelo Estado para ampliar a capacidade industrial do Brasil.
Ele “defendeu de forma brilhante” uma tese de doutorado em 1974 na Universidade Cornell intitulada “A Internacionalização do Capitalismo Oligárquico”, disse Tom Davis, orientador de Coutinho na época. Coutinho compartilha a visão do economista keynesiano Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel, quanto a “um papel predominante para o Estado”, disse Davis, hoje aposentado, numa entrevista por telefone.
Unicamp
Coutinho voltou ao Brasil após os estudos em Cornell. Ele era filiado ao Movimento Democrático Brasileiro, que junto com a Arena era um dos dois partidos políticos com permissão para atuar sob a ditadura militar vigente de 1964 a 1985. Ele serviu como secretário-executivo do Ministério de Ciência e Tecnologia na década de 1980 e se especializou em política industrial, publicando um estudo de 510 páginas em 1994 sobre concorrência econômica. Ele fundou a LCA Consultores em São Paulo em 1995.
Ele dava aula de Economia na Unicamp quando Dilma fazia seu mestrado. Mesmo sendo um conselheiro influente da antiga aluna, ele não é o único candidato a ministro da Fazenda, disse Christopher Garman, diretor para América Latina do Eurasia. O atual ministro Guido Mantega, o secretário de Política Econômica dele, Nelson Barbosa, e o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, que foi o principal assessor econômico de Dilma durante a campanha eleitoral, estão competindo com Coutinho pelos principais cargos, Garman disse.
Coutinho não atendeu ao pedido de entrevista para esta reportagem. Em uma entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo em julho, ele disse que os empréstimos do BNDES ajudam no combate à inflação porque aumentam a capacidade produtiva do País.