Brasil

Dilma busca elevar tarifas para ofuscar efeito do real

Presidente eleita Dilma Rousseff planeja medidas agressivas, como aumento de tarifas e redução de impostos

Força do real é preocupação da presidente eleita Dilma Rousseff (Sergio Dutti/Veja)

Força do real é preocupação da presidente eleita Dilma Rousseff (Sergio Dutti/Veja)

DR

Da Redação

Publicado em 30 de dezembro de 2010 às 16h45.

São Paulo - A presidente eleita Dilma Rousseff planeja medidas agressivas, como aumento de tarifas e redução de impostos, para lidar com os prejuízos que o real valorizado causa a empresas manufatureiras.

A força do real, que é uma das moedas mais sobrevalorizadas do mundo, foi a principal questão econômica nas reuniões recentes de Dilma com conselheiros antes da posse em 1o de janeiro, disseram à Reuters fontes próximas ao futuro governo.

"Há uma preocupação aguda sobre o câmbio", disse uma autoridade sênior do governo de Dilma, falando em condição de anonimato porque a presidente ainda não tomou posse. "Nós estávamos esperando que a situação melhorasse antes (da posse), mas não há sinais disso ... e nós percebemos que precisamos agir rápido."

O real subiu 11 por cento contra o dólar desde maio, e acumula alta de mais de 100 por cento desde 2003, com a forte expansão da economia brasileira e as elevadas taxas de juros atraindo enormes fluxos de capital dos países desenvolvido.

Taxas de câmbio sobrevalorizadas têm sido um problema em toda a América Latina e no mundo em desenvolvimento, em parte devido aos desequilíbrios restantes da crise financeira de 2008 e 2009. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, alertou sobre uma "guerra cambial", enquanto países como Estados Unidos e China tentam deprimir o valor de suas moedas e tomam outras medidas para impulsionar a produção e as exportações locais.

Como exemplo do tipo de medida que Dilma adotaria para aliviar os problemas gerados pelo real forte, fontes citaram a decisão tomada nesta semana pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para aumentar as tarifas sobre 14 tipos de brinquedos importados, de 20 para 35 por cento.

"Você verá mais medidas nessa linha (das tarifas sobre brinquedos) nos próximos meses..., sempre respeitando nossas obrigações internacionais (sob acordos comerciais)", disse a autoridade sênior, sem especificar setores. "A defesa comercial é legítima", acrescentou.

A decisão de Lula é permitida sob as regras internacionais de comércio por causa das provisões que permitem que o Brasil proteja a indústria doméstica, disse uma autoridade do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

A indústria brasileira de brinquedos, como muitas outras manufatureiras nacionais, reduziu o número de vagas nos últimos anos, apesar do crescimento econômico geral. O real valorizado deixou os produtores locais incapazes de competir com as importações baratas da China -- que agora responde pela maior parte das vendas de brinquedos no mercado brasileiro, de acordo com a Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq).

A China é acusada por muitos outros governos, como os EUA, de manter sua moeda artificialmente depreciada.

As manufatureiras nacionais pedem há meses para o governo aumentar as tarifas de importação em certos setores. Lula hesita a fazê-lo em meio à expansão do consumo no último ano de sua Presidência e à crescente relação comercial entre Brasil e China. A alta das tarifas sobre brinquedos coincidiu com o fim do mandato de Lula e a passagem do Natal.

Ainda assim, autoridades disseram que a continuidade da forte entrada de dólares e os níveis menores de produção industrial ao longo de 2010 fizeram a equipe econômica de Dilma ter uma abordagem mais agressiva.

Incentivo trubutário para bens intermediários e finais

A elevação de tarifas, se realizada em grande escala e imitada por outros países, pode espalhar temores de uma onda de protecionismo que poderia atrapalhar a recuperação econômica global.


Porém, a decisão de manter o foco de curto prazo na atenuação das consequências do real forte, ao invés de tentar enfraquecer agressivamente a moeda, pode ter consequências secundárias positivas nas ações e nos mercados de bônus.

O governo recorreu, nos últimos meses, a elevações do imposto (IOF) sobre investimentos em bônus e ações locais como uma forma de desencorajar o influxo de dólares. A possibilidade de taxar mais as transações acionárias pressionou a Bovespa nos últimos meses, disse Oliver Leyland, gerente de carteira de ações da Mirae Asset, em São Paulo.

Para Leyland, a alta em certas tarifas "fazem algum sentido" como método para aliviar a pressão gerada pelo real.

Ele disse, no entanto, que a política pode acabar sendo "neutra para o mercado", uma vez que tarifas mais elevadas em setores como aço -- que ele considera um candidato "óbvio" -- podem acelerar a inflação dos bens de consumo, erodindo lucros.

Dilma anunciou cortes moderados no Orçamento para 2011, que devem ajudar a reduzir a pressão sobre a taxa de câmbio. Impostos mais baixos e políticas que encorajem a inovação são outras ferramentas que a presidente eleita pode utilizar para ajudar as indústrias locais a recuperar competitividade em casa e no exterior.

"A melhor coisa (para enfraquecer o real) seria uma queda rápida nos juros, claro", disse uma das fontes. "Mas nós reconhecemos que isso não vai acontecer (no futuro próximo)."

As fontes disseram à Reuters que é provável que incentivos tributários sejam implementados no curto prazo para manufatureiras de alguns bens intermediários e finais, que foram especialmente prejudicadas pelo real forte.

"Nós vamos olhar para todas as partes da cadeia produtiva ... para incentivar as exportações e reduzir o dano", disse uma autoridade.

(Reportagem adicional de Raymond Colitt)

Acompanhe tudo sobre:GovernoGoverno DilmaPolítica

Mais de Brasil

Convenção para oficializar chapa Boulos-Marta em SP terá Lula e 7 ministros do governo

Convenção do PRTB e disputas judiciais podem barrar Pablo Marçal na disputa em SP; entenda

TSE divulga perfil do eleitor que vai às urnas em outubro; veja qual é

Brasil terá mais de 155 milhões de eleitores nas eleições municipais de 2024

Mais na Exame