Sítio em Atibaia (Montagem/VEJA)
Estadão Conteúdo
Publicado em 4 de março de 2019 às 15h03.
Última atualização em 4 de março de 2019 às 15h04.
São Paulo - A 1ª Vara Federal de Bragança Paulista informou a juíza Gabriela Hardt de que foi registrado, no cartório de Atibaia, no interior de São Paulo, o confisco do sítio Santa Bárbara, pivô da condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 12 anos e 11 meses na Operação Lava Jato. A ordem de confisco do sítio está entre as determinações da sentença.
Segundo a magistrada, a lei de lavagem de dinheiro prevê a 'perda, em favor da União, dos bens e valores relacionados, direta ou indiretamente, à prática dos crimes'.
A juíza afirma que ter concluído 'que são proveito do crime de lavagem as benfeitorias feitas nas reformas do sítio de Atibaia, para as quais foram empregados ao menos R$ 1.020.500,00'. "Já foi narrado nesta sentença que não se discute aqui a propriedade do sítio. Contudo, os valores das benfeitorias, feitas em especial no imóvel de matrícula 55.422, registrado em nome de Fernando Bittar e sua esposa, no mínimo equivalem ao valor do terreno, comprado em 2010 pelo valor de R$ 500.000,00".
Após a sentença, a juíza determinou que o cartório de imóveis em Atibaia formalize o confisco do sítio. A carta precatória enviada pela juíza à Justiça Federal em Bragança Paulista tem como objetivo a 'formalização do sequestro do imóvel, bem como registro do sequestro no Cartório de Registro de Imóveis competente'. A ordem de confisco do sítio está entre as determinações da sentença que condenou Lula.
Em cumprimento à decisão, a1ª Vara Federal de Bragança Paulista informou que o 'Auto de Sequestro de bem imóvel datado de 15/02/2019, foi efetivado o registro do sequestro no R.8 da Matricula 55.422, conforme determinado'.
Agora, na matrícula da propriedade do Sítio,que, após a alienação do imóvel, "eventual diferença entre o valor das benfeitorias objeto dos crimes reconhecidos na sentença e o valor pago pela totalidade' dele 'seja revertida aos proprietários'. O sítio está em nome Fernando e Lilian Bittar.
A sentença de Gabriela Hardt tem 360 páginas. Também foram condenados os empresários José Adelmário Pinheiro Neto, o Léo Pinheiro, ligado a OAS, a 1 ano, 7 meses e 15 dias, o pecuarista José Carlos Bumlai a 3 anos e 9 meses, o advogado Roberto Teixeira a 2 anos de reclusão, o empresário Fernando Bittar (proprietário formal do sítio) a 3 anos de reclusão e o empresário ligado à OAS Paulo Gordilho a 3 anos de reclusão.
A juíza condenou os empresários Marcelo Odebrecht a 5 anos e 4 meses , Emilio Odebrecht a 3 anos e 3 meses, Alexandrino Alencar a 4 anos e Carlos Armando Guedes Paschoal a 2 anos. O engenheiro Emyr Diniz Costa Junior recebeu 3 anos de prisão. Todos são delatores e, por isso, vão cumprir as penas acertadas em seus acordos.
Gabriela Hardt absolveu Rogério Aurélio Pimentel, o 'capataz' das obras do sítio.
A Lava Jato afirma que o sítio passou por três reformas: uma sob comando do pecuarista José Carlos Bumlai, no valor de R$ 150 mil, outra da Odebrecht, de R$ 700 mil e uma terceira reforma na cozinha, pela OAS, de R$ 170 mil, em um total de R$ 1,02 milhão.
O sítio Santa Bárbara é pivô da terceira ação penal da Lava Jato, no Paraná, contra o ex-presidente - além de sua segunda condenação. O petista ainda é acusado por corrupção e lavagem de dinheiro por supostas propinas da Odebrecht - um terreno que abrigaria o Instituto Lula e um apartamento vizinho ao que morava o ex-presidente em São Bernardo do Campo.
O ex-presidente já cumpre pena de 12 anos e um mês de prisão no caso triplex, em 'sala especial', na sede da Polícia Federal do Paraná, em Curitiba, desde 7 abril de 2018, por ordem do então juiz federal Sérgio Moro.
Lula foi sentenciado pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro envolvendo suposta propina de R$ 2,2 milhões da OAS referente às reformas do imóvel.
A defesa do ex-presidente Lula recorrerá de mais uma decisão condenatória proferida hoje (06/02/2019) pela 13ª. Justiça Federal de Curitiba que atenta aos mais basilares parâmetros jurídicos e reforça o uso perverso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política, prática que reputamos como "lawfare".
A sentença segue a mesma linha da sentença proferida pelo ex-juiz Sérgio Moro, que condenou Lula sem ele ter praticado qualquer ato de ofício vinculado ao recebimento de vantagens indevidas, vale dizer, sem ter praticado o crime de corrupção que lhe foi imputado. Uma vez mais a Justiça Federal de Curitiba atribuiu responsabilidade criminal ao ex-presidente tendo por base uma acusação que envolve um imóvel do qual ele não é o proprietário, um "caixa geral" e outras narrativas acusatórias referenciadas apenas por delatores generosamente beneficiados.
A decisão desconsiderou as provas de inocência apresentadas pela Defesa de Lula nas 1.643 páginas das alegações finais protocoladas há menos de um mês (07/01/2019) - com exaustivo exame dos 101 depoimentos prestados no curso da ação penal, laudos técnicos e documentos anexados aos autos. Chega-se ao ponto de a sentença rebater genericamente a argumentação da defesa de Lula fazendo referência a "depoimentos prestados por colaboradores e co-réus Leo Pinheiro e José Adelmário" (p. 114), como se fossem pessoas diferentes, o que evidencia o distanciamento dos fundamentos apresentados na sentença da realidade.
Ainda para evidenciar o absurdo da nova sentença condenatória, registra-se que:
- Lula foi condenado pelo "pelo recebimento de R$ 700 mil em vantagens indevidas da Odebrecht" mesmo a defesa tendo comprovado, por meio de laudo pericial elaborado a partir da análise do próprio sistema de contabilidade paralelo da Odebrecht, que tal valor foi sacado em proveito de um dos principais executivos do grupo Odebrecht (presidente do Conselho de Administração); esse documento técnico (elaborado por auditor e perito com responsabilidade legal sobre o seu conteúdo) e comprovado por documentos do próprio sistema da Odebrecht foi descartado sob o censurável fundamento de que "esta é uma análise contratada por parte da ação penal, buscando corroborar a tese defensiva" - como se toda demonstração técnica apresentada no processo pela defesa não tivesse valor probatório;
- Lula foi condenado pelo crime de corrupção passiva por afirmado "recebimento de R$ 170 mil em vantagens indevidas da OAS" no ano de 2014 quando ele não exercia qualquer função pública e, a despeito do reconhecimento, já exposto, de que não foi identificado pela sentença qualquer ato de ofício praticado pelo ex-presidente em benefício das empreiteiras envolvidas no processo;
- foi aplicada a Lula, uma vez mais, uma pena fora de qualquer parâmetro das penas já aplicadas no âmbito da própria Operação Lava Jato - que segundo julgamento do TRF4 realizado em 2016, não precisa seguir as "regras gerais" - mediante fundamentação retórica e sem a observância dos padrões legalmente estabelecidos.
Em 2016 a defesa demonstrou perante o Comitê de Direitos Humanos da ONU a ocorrência de grosseiras violações às garantais fundamentais, inclusive no tocante à ausência de um julgamento justo, imparcial e independente. O conteúdo da sentença condenatória proferida hoje somente confirma essa situação e por isso será levada ao conhecimento do Comitê, que poderá julgar o comunicado ainda neste ano - e eventualmente auxiliar o país a restabelecer os direitos de Lula.
Cristiano Zanin Martins
O criminalista Alberto Zacharias Toron, que defende o empresário Fernando Bittar, condenado a 3 anos de reclusão no processo do sítio de Atibaia, disse que a sentença da juíza Gabriela Hardt 'é equilibrada'. "Vamos recorrer, mas a sentença mostra a disparidade entre a acusação e a realidade reconhecida por uma juíza que não é exatamente uma liberal, ao contrário, é reconhecida como uma juíza linha dura."
Para Toron, é importante destacar que a força-tarefa do Ministério Público Federal da Operação Lava Jato imputava a Bittar - proprietário do sítio de Atibaia - a prática de 44 atos de lavagem de dinheiro. "A doutora Gabriela Hardt condenou Bittar por apenas uma lavagem. Isso mostra a prática de acusação excessiva do Ministério Público."
O criminalista avalia que a força-tarefa da Lava Jato 'com sua estratégia usual de fazer acusação excessiva quer compelir a pessoa a fazer uma delação, no caso queriam que falassem do Lula e da dona Marisa, quando na verdade não há base nenhuma para uma acusação dessa magnitude'.
O advogado demonstra preocupação com o plea bargain, acordo penal adotado em larga escala nos Estados Unidos e que o ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro incluiu no pacote anticrime entregue ao Congresso nesta quarta, 6.
"Agora vem o plea bargain do Moro. Vão te acusar de crimes que levam a uma pena de 100 anos. O que você faz? Se fizer acordo a pena cai para 5 anos. A pessoa vai aceitar. Vamos ter que discutir muito isso."
"O que é importante destacar é que o próprio Ministério Público, nas alegações finais, reconheceu que o Fernando Bittar é o verdadeiro proprietário do sítio de Atibaia", segue Toron. "Enfim, ficou definida a propriedade do sítio."
"José Carlos Bumlai recebeu com imensa surpresa a notícia de sua condenação e dela irá recorrer, pois jamais contribuiu financeiramente com as reformas do sítio de Atibaia. A sentença é atécnica e não aponta a origem nem a ilicitude dos valores que seriam objeto da suposta lavagem. Além disso, a pena e o regime de cumprimento impostos a ele são totalmente desproporcionais."
"A magistrada já deu a substituição, aplicou regime aberto e substituiu por prestação de serviços à comunidade. Mas vou recorrer, até porque o Ministério Público Federal vai recorrer."
"A defesa de Roberto Teixeira, embora reconheça qualidades e méritos da prolatora da sentença irá recorrer, pois entende que ele, como exposto desde a resposta à denúncia até as alegações finais, não cometeu o delito que lhe é imputado."
"Entende também que a sua inocência ficou comprovada pela prova dos autos e que, em consequência, a sentença contrariou todos os elementos carreados para o processo que demonstraram a atipicidade da conduta de Roberto Teixeira."
"É importante deixar claro que a conduta de Roberto Teixeira foi uma conduta do advogado. Sua conduta foi a do advogado na defesa dos interesses de seu cliente. Dessa forma não pode ele ser punido criminalmente porque será punida assim a Advocacia."