Brasil tem 9% da população identificada como LGBTQIAP+
Os números fazem parte da Pesquisa do Orgulho divulgada esta semana pelo Instituto Datafolha. Levantamento também revelou que 62% da população LGBTQIAPN+ economicamente ativa não fala sobre orientação sexual ou identidade de gênero no trabalho
Estadão Conteúdo
Publicado em 24 de setembro de 2022 às 13h34.
Última atualização em 24 de setembro de 2022 às 17h47.
Pelo menos 9,3% da população brasileira se identifica como integrante da comunidade LGBT+, formada por pessoas lésbicas, gays, bissexuais, trans, queer, intersexo, assexuadas, pansexuais, não binárias e mais.
O porcentual pode ser ainda maior, porque 8% não quiseram responder, enquanto 81% disseram não fazer parte do grupo. Os números fazem parte da Pesquisa do Orgulho divulgada esta semana pelo Instituto Datafolha.
Com metodologia semelhante à das pesquisas eleitorais, o trabalho foi realizado com 3.674 pessoas em 120 municípios das cinco regiões do País - representativos da população total - entre maio e junho. A margem de erro é de dois pontos porcentuais para mais ou para menos. O trabalho foi contratado pela ONG All Out e pela marca Havaianas.
A pesquisa revela que a proporção de pessoas que se identifica com alguma das letras da sigla LGBTQIAPN+ é bem maior entre os jovens do que entre os mais velhos. Dos 16 aos 24 anos, o porcentual de pessoas que se identifica como integrante da comunidade é de 18%. Cai para 13% na faixa dos 25 aos 34 anos.
E vai caindo progressivamente até chegar a 5,3% entre aqueles com mais de 60 anos. O número alto de pessoas que não quiseram responder pode indicar tanto um receio de conversar com o entrevistador quanto simplesmente a não compreensão das opções.
Liberdade
"A questão de gênero tem pautado muitos debates", constata Paulo Alves, do Datafolha, responsável pela pesquisa. "Dimensionar essa comunidade é importante para orientar políticas públicas e também as ações das empresas e dos cidadãos. É natural que o porcentual seja maior entre os mais jovens, tem a ver com a liberdade de ser, de se expressar, de falar. Os mais velhos não tiveram sequer a chance de pensar nessas possibilidades. A sociedade brasileira mudou muito nos últimos anos."
Gerente de campanhas da ONG All Out, Ana Andrade concorda como colega. "O dimensionamento nos dá mais assertividade para cobrar politicas públicas e cobrar de forma específica: nessa região, o problema maior é de violência; nessa outra, é saúde. Esse é um avanço importante."
A comunidade tende a ser mais presente nas regiões metropolitanas (10,9%) do que nas cidades do interior (8,2%). O mesmo ocorre entre as pessoas com maior nível de escolaridade (11% das que têm curso superior). A maioria é solteira (59%) e não tem filhos (70%). A variação entre as diferentes regiões do País também é significativa. São 10,1% no Centro-Oeste, 9,9% no Sudeste, 9,8% no Norte, 8,7% no Sul e 8,5% no Nordeste.
Silêncio
O trabalho mostrou também que 62% da população LGBTQIAPN+ economicamente ativa não costuma falar sobre sua orientação sexual ou identidade de gênero no trabalho. A hostilidade ou preconceito dentro da família é 16 pontos porcentuais mais alta do que entre o restante da população. Além disso, 17% dizem sofrer discriminação, ante 9% dos demais.
Para os 81% que disseram não fazer parte da comunidade, o Datafolha perguntou a opinião sobre a população LGBTQIAPN+. Segundo a pesquisa, 85% afirmaram respeitar as pessoas LGBTQIAPN+. O porcentual cai para 79% quando a pergunta é se a comunidade deve ter os mesmos direitos da população heteronormativa.
E cai ainda mais, para 53%, quando o Datafolha indagou se os LGBTQIAPN+ têm direito de realizar demonstrações públicas de afeto. "Sabíamos que encontraríamos discriminação e visões preconceituosas, mas alguns números são muito fortes", diz Paulo Alves, do Datafolha.
'Não tenho vergonha, mas tenho receio'
Para o servidor público Bruno Ferreira, de 27 anos, que mora em Niterói, região metropolitana do Rio, o dado que indica discriminação não foi uma surpresa. "Existe esse mito de que a sociedade brasileira acolhe bem a diversidade", afirma. Ferreira já foi abordado na fila do cinema por estar de mãos dadas com o namorado. "Isso vem de uma percepção equivocada de que, quando uma população minoritária ganha direitos, o outro grupo está perdendo direitos. E não é isso que acontece. Ninguém está perdendo nada."
A designer Luiza Ribeiro, de 28 anos, que vive em Belém, no Pará concorda. "Eu não tenho vergonha de andar de mãos dadas com a minha namorada, mas tenho receio", afirma. "Principalmente por ser mulher. Já fomos questionadas dentro de um Uber, o motorista começou a tratar a gente de forma diferente, ficou um clima tenso no carro... Aquela agonia de estar com uma pessoa que não gosta da gente."
Dados
A violência é real e vem aumentando. Em maio deste ano, levantamento do Observatório de Mortes e Violências contra LGBT+ mostrou que pelo menos cinco pessoas da comunidade haviam sido vítimas de homicídio por semana no País. Ao todo, foram 262 assassinatos, um aumento de 21,9% em relação ao ano anterior.
Também em maio deste ano, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou pela primeira vez dados oficiais sobre a orientação sexual da população brasileira. Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), 1,9% da população se declara homossexual ou bissexual, enquanto outros 3,4% não quiseram responder ou não sabiam.
A pesquisa não propôs questões sobre identidade de gênero e os números foram considerados subestimados. No lançamento, a coordenadora do trabalho, Maria Lúcia Franca Pontes Vieira, elogiou a iniciativa. "Ainda que os números estejam subnotificados, considero um passo importante para podermos, de alguma forma, entender as características sociodemográficas desse grupo."
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.