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Bolsonaro recua na TV: vamos fazer de 2021 o ano da vacinação

A confirmação do pronunciamento de hoje veio menos de 48 horas depois que um grupo de economistas e empresários produziu uma carta aberta pedindo soluções para o caos na saúde

 (Marcos Corrêa/PR/Flickr)

(Marcos Corrêa/PR/Flickr)

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Carolina Riveira

Publicado em 23 de março de 2021 às 20h39.

Última atualização em 25 de março de 2021 às 11h45.

No dia em que o Brasil registrou a triste marca de mais de 3.000 mortes pela covid-19, o presidente Jair Bolsonaro falou pela primeira vez em pronunciamento em rede nacional desde a escalada recente da crise sanitária.

No discurso, o presidente não criticou diretamente o distanciamento social como havia feito em falas anteriores, exaltou a campanha de vacinação e disse que 2021 será "o ano da vacinação dos brasileiros".

"Em poucos meses seremos autossuficientes na produção de vacinas", disse, sobre a produção que está sendo feita por Fundação Oswaldo Cruz e Butantan. Bolsonaro disse também que intercedeu "pessoalmente" à Pfizer e à Janssen, da Johnson e Johnson's, para a compra recente de 138 milhões de doses das duas vacinas fechada neste mês.

No ano passado, o governo chegou a divulgar carta afirmando que não compraria as 70 milhões de doses oferecidas então pela Pfizer, mas mudou de posição neste ano. A negativa atrasou a chegada das vacinas e foi criticada por especialistas.

Em diversas regiões do Brasil foram registrados panelaços em meio à fala do presidente, que durou quatro minutos.

Bolsonaro afirmou que todos os brasileiros poderão ser vacinados neste ano e que o Brasil terá 500 milhões de doses de vacinas contra o coronavírus.

O Brasil precisará ampliar o estoque de vacinas para que os mais de 150 milhões de adultos possam receber as duas doses neste ano. Apesar da fala otimista do presidente, pelos acordos fechados pelo Brasil até agora, a vacinação em massa só deve ocorrer a partir do segundo semestre.

"Quero ressaltar que o Brasil é o quinto país que mais vacinou no mundo", disse Bolsonaro. Em números absolutos, o Brasil tem mais de 17 milhões de doses aplicadas, mas o equivalente a 6% da população foi vacinada com a primeira dose desde que a vacinação começou, em janeiro.

No ranking de vacinas a cada 100.000 habitantes, o Brasil está somente entre os 70 países com melhores resultados, e foi ultrapassado neste mês pelos vizinhos Argentina e Uruguai, além do Chile.

No discurso, Bolsonaro relembrou o processo de compra de vacinas do Brasil e disse que as vacinas disponíveis hoje são "graças às ações que tomamos logo no início da pandemia".

O presidente exaltou os acordos assinados com a Universidade de Oxford para produção da vacina da AstraZeneca e a participação do Brasil no consórcio de vacinas da Organização Mundial da Saúde, o Covax.

Ressaltou ainda que adquiriu a Coronavac em dezembro junto ao Instituto Butantan — sem repetir acusações de declarações anteriores, em que questionou a eficácia do imunizante desenvolvido na China e chegou a dizer que o governo federal não compraria a vacina. No momento, a Coronavac representa nove em cada dez doses aplicadas no Brasil. 

O último discurso de Bolsonaro havia ocorrido em 24 de dezembro, véspera de Natal, quando o Brasil registrava menos de 800 mortes diárias por covid-19 na média móvel — desde então, esse número subiu mais de 200%, com a média móvel brasileira hoje acima de 2.300 mortes.

Um pronunciamento anterior do presidente estava previsto para 3 de março e já havia sido gravado, mas o governo desistiu da transmissão na ocasião. Segundo fontes em Brasília próximas ao Planalto, o governo decidiu se pronunciar nesta terça-feira diante das críticas crescentes sobre a gestão na pandemia.

Pesou também a manifestação recente de grandes nomes da iniciativa privada, cada vez mais impacientes com a gestão da crise.

A confirmação do pronunciamento de hoje veio menos de 48 horas depois que um grupo de economistas e empresários produziu uma carta aberta pedindo soluções mais eficazes para administrar o caos na saúde e medidas centralizadas do governo federal.

O documento foi divulgado inicialmente no fim de semana e já conta com mais de 1.000 assinaturas. Nos bastidores em Brasília, comenta-se que a "carta do PIB" repercutiu no Congresso e no Palácio do Planalto.

Solidariedade às famílias

Ao contrário do que fez em pronunciamentos anteriores, Bolsonaro também prestou condolências às famílias das vítimas da covid-19. "Solidarizo-me com todos aqueles que tiveram perdas em suas famílias", disse.

Pela primeira vez em fala nacional, o presidente não criticou diretamente medidas de quarentena e isolamento tomadas por governadores, o que foi visto como uma guinada em seu discurso.

Na fala, Bolsonaro disse que o governo é "incansável" na luta contra o coronavírus. Ao longo do discurso, no entanto, o presidente não mencionou o uso de máscaras e outras medidas de prevenção a serem tomadas pela população antes que haja vacinas para todos.

O avanço da variante P1 do coronavírus encontrada em Manaus, com maior carga viral, é a principal preocupação caso a vacinação siga mais lenta do que o esperado. Diante do aumento do número de casos, têm faltado também nos hospitais leitos de emergência e medicamentos para que os pacientes possam ser intubados.

Segundo a última pesquisa EXAME/IDEIA neste mês, a aprovação do presidente, que passou de 40% em meados do ano passado com o auxílio emergencial, chegou à casa dos 26%.

"Carta do PIB"

A carta de economistas e empresários criticando a gestão na pandemia — embora sem citar o nome do presidente — foi encaminhada a nomes como o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux; ao senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado; e ao deputado Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados. O documento também foi encaminhado ao ministro da Economia, Paulo Guedes.

"O país pode se sair melhor se perseguimos uma agenda responsável. O país tem pressa; o país quer seriedade com a coisa pública; o país está cansado de ideias fora do lugar, palavras inconsequentes, ações erradas ou tardias. O Brasil exige respeito", diz um trecho do documento.

"A carta não nomeia uma pessoa, mas implicitamente é direcionada ao presidente e aos ministros que tratam do tema", disse à EXAME o economista Cláudio Frischtak, um dos responsáveis pela redação do documento.

Apesar das declarações recentes de Bolsonaro afirmando que as medidas de contenção ficaram a cargo dos governadores e não do governo federal, Frischtak aponta que "o governo central não combate com eficácia" a pandemia. Para os autores da carta, ações como desestimular o uso de máscaras, incentivar aglomerações e falar contra a vacina são "inaceitáveis" e prejudiciais à retomada da economia.

Revés no STF

A fala de Bolsonaro acontece em dia agitado em Brasília. Nesta terça-feira, foi empossado em cerimônia a portas fechadas o novo ministro da Saúde, o médico Marcelo Queiroga, substituindo o general Eduardo Pazuello, que vinha sendo amplamente criticado. 

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), também rejeitou uma ação de inconstitucionalidade proposta por Bolsonaro contra os lockdowns decretados pelos governos do Distrito Federal, da Bahia e do Rio Grande do Sul. 

Ainda nesta terça-feira, a Segunda Turma do STF continuou o julgamento sobre a suspeição do ex-juiz Sergio Moro. Após a ministra Cármen Lúcia mudar voto para posição a favor da suspeição, o placar passou a ser de três a favor e dois contra.

Cármen Lúcia acompanhou os votos de Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, que se posicionaram a favor da declaração de suspeição. A decisão abre caminho de vez para que o ex-presidente Lula possa concorrer a eleições em 2022. 

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