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"Bolsa Família é democratização do poder", diz Nobel da Paz

"O Bolsa Família não é simplesmente um programa de desenvolvimento, é a democratização do poder e o empoderamento da população pobre", disse Satyarthi


	Nobel da Paz: "O Bolsa Família não é simplesmente um programa de desenvolvimento, é a democratização do poder e o empoderamento da população pobre", disse Satyarthi
 (Jefferson Rudy/Agência Senado/Fotos Públicas)

Nobel da Paz: "O Bolsa Família não é simplesmente um programa de desenvolvimento, é a democratização do poder e o empoderamento da população pobre", disse Satyarthi (Jefferson Rudy/Agência Senado/Fotos Públicas)

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Da Redação

Publicado em 6 de fevereiro de 2016 às 10h23.

Sábado - Vozes da luta contra o trabalho infantil. Uma de suas missões, que libertou 80 mil crianças em situação de escravidão na Índia, foi reconhecida, em 2014, com o Prêmio Nobel da Paz, ao lado da paquistanesa Malala Yousafzai.

Em visita ao Brasil, o ativista participou de reuniões com ministros e autoridades.

Na última quinta-feira (4), Satyarthi teve um encontro com a presidenta Dilma Rousseff para discutir novas ações contra o trabalho infantil e sugeriu que o Brasil encabece uma conferência entre os países do Brics, para debater a sustentabilidade na pauta da infância.

O indiano se declarou parceiro do país e fã das políticas públicas brasileiras de inclusão social e combate à pobreza.

'O Bolsa Família não é simplesmente um programa de desenvolvimento, é a democratização do poder e o empoderamento da população pobre. Mais importante que isso, ele cria esperança na parcela mais pobre da sociedade', disse, em entrevista exclusiva ao Portal Brasil, no Palácio do Planalto.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

- O que levou o Sr. a trabalhar com o tema do trabalho infantil?

- Kailash Satyarthi: Era muito apaixonado desde a minha própria infância sobre o assunto. Quando tinha cerca de cinco anos, vi um garoto sapateiro trabalhando no portão da minha escola. Era meu primeiro dia de escola e fiquei chocado. Perguntei aos meus professores, aos meus amigos e todo mundo disse 'ah, são crianças pobres e estão trabalhando', como se não tivesse nada fora do comum. Depois de uma semana, fui àquela criança sapateira e perguntei ao seu pai: 'por que você não manda seu filho à escola?'. Ele respondeu que nunca tinha conversado sobre isso. Ele disse que seu pai, seu avô e ele, todos começaram a trabalhar na infância, e assim seria com seu filho. Ele disse para mim que, talvez eu não soubesse, mas eles eram obrigados a trabalhar. Essa foi a resposta dele, mas foi um desafio para mim durante toda a minha vida. Por que algumas crianças eram obrigadas a trabalhar, aos custos da sua educação, saúde, liberdade, infância e isso deveria ser aceitável? Comecei a pensar nisso e a enxergar o mundo com um olhar diferente. Fiz graduação, me tornei um engenheiro e dei aulas na universidade. Mas finalmente segui meu coração, deixei minha carreira e comecei a trabalhar com esse assunto. Foi um pouco difícil, porque não tinha exemplos no meu país para aprender a lutar. Principalmente porque ele não é, muitas vezes, visto como um problema. Mas, aos poucos, as pessoas foram enxergando essa questão não simplesmente como a pobreza, e sim a negação de direitos, dignidade e liberdade. Isso não é negociável.

- Quais iniciativas brasileiras considera exitosas no combate ao trabalho infantil?

- Satyarthi: Penso que a iniciativa mais bem-sucedida, definitivamente, é o Bolsa Família, porque junta diferentes aspectos da infância. Desse modo, a criança não é vista isoladamente. Ela é vista como parte de uma família. A educação, a saúde, a erradicação da pobreza e má nutrição, tudo isso é contemplado em um só programa, e é muito impressionante - e isso tudo condiciona a transferência de renda. Aquele dinheiro é dado às mães de filhos que estão indo à escola e os que estão recebendo atenção de saúde. O Brasil tem uma legislação muito mais progressista contra o trabalho infantil e trabalho forçado do que os padrões internacionais. O Brasil dá exemplo nesse quesito e deve ser seguido por outros países.

- O Sr. acredita que iniciativas parecidas podem ser utilizadas em países semelhantes ao Brasil, como a própria Índia?

- Satyarthi: A Índia também tem esse problema, mas nós tivemos progresso ao longo dos anos. Não é só o crescimento da economia, tecnologia de informação e engenharia. É igualmente importante o fato de termos constituído o direito legal à educação. Temos leis específicas para garantir educação gratuita para todas as crianças. E pudemos assistir à redução do trabalho infantil de 12,5 milhões de crianças, há dez anos, para cerca de quatro milhões agora. Houve progresso, mas esses países como a Índia, Brasil, África do Sul, Rússia, todos esses países do Brics e semelhantes, têm demonstrado liderança em diversas formas. Apesar de todas as dificuldades e desafios que eles têm enfrentado por dentro e fora, suas vozes agora são ouvidas. E eles deveriam tomar a liderança e mostrar a todo o mundo que conseguimos achar soluções. Mas é necessário demonstrar suas práticas, garantir que elas funcionem de forma adequada, para mostrar que os problemas relacionados à infância estão resolvidos e serem modelos para todo o mundo. Eles devem ser os porta-vozes para o resto do planeta e falarem alto: priorizem as crianças, gastem mais verba com a infância e a educação infantil, garantam sua proteção e saúde, e as políticas serão mais integradas.

- O Sr. elencou o Bolsa Família como sendo a principal política pública brasileira contra o trabalho infantil. O programa é alvo de muitas críticas no país. Por que você acha que essas críticas existem?

- Satyarthi: Qualquer tentativa de mudar o status quo da sociedade sempre irá encarar críticas. O criticismo contra o Bolsa Família não é uma coisa nova. Aqueles que sentem que controlam o poder das terras, o poder do dinheiro e o poder do lucro se sentem ameaçados. Porque agora, com o Bolsa Família, o poder está sendo descentralizado. O Bolsa Família não é simplesmente um programa de desenvolvimento, é a democratização do poder e o empoderamento da população pobre. Mais importante que isso, ele cria esperança na parcela mais pobre da sociedade. Eles se sentem empoderados e algumas pessoas não gostam disso.

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