Indígenas associados com assaltos podem ser causa de ataque no Maranhão
De acordo com Funai, indígenas recebem ameaças devido a uma associação deles com os assaltos executados por não-índigenas
Agência O Globo
Publicado em 9 de dezembro de 2019 às 10h13.
Última atualização em 9 de dezembro de 2019 às 10h54.
São Paulo — A morte de dois indígenas em ataque na BR-226 no Maranhão no sábado pode ter relação com os constantes assaltos que acontecem no trecho da rodovia federal no município de Jenipapo dos Vieiras. Segundo o coordenador da Fundação Nacional do Índio ( Funai ), em Imperatriz (MA), Guaraci Mendes, os indígenas da região vêm recebendo ameaças devido a uma associação deles com os assaltos executados por não-indígenas que acontecem na rodovia.
"Pessoas mal intencionadas se aproveitam da má preservação da BR dentro do território (indígena) para cometer ilícitos. Aproveitam também a falta de policiamento. Então isso (assaltos) acaba se associando à imagem dos indígenas, e por conta disso eles (índios) vinham recebendo ameaças", disse Guaraci Mendes ao site G1.
O ataque provocou a morte dos caciques Firmino Silvino Guajajara, de 45 anos, atingido por quatro disparos, e Raimundo Benício Guajajara, de 38 anos. Eles são da Terra Indígena Cana Brava e Lagoa Comprida respectivamente. Firmino morreu no local, enquanto Raimundo chegou a ser levado à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Jenipapo dos Vieiras, mas não resistiu.
Eles voltavam de uma reunião entre a Funai e a Eletronorte, na aldeia Coquinho, para tratar da compensação aos índios pelo impacto ambiental causado pela passagem de linhas de energia elétrica dentro das terras indígenas. Participavam da reunião cerca de 60 caciques e lideranças Guajajara.
“Era toda a cúpula, caciques e lideranças, da Terra Indígena Cana Brava. Parece que foi ação planejada”, afirmou Mendes.
Duas pessoas ficaram feridas. Segundo a Secretaria de Direitos Humanos e Participação Popular do Maranhão (Sedihop), Nico Alfredo, da aldeia Mussun, foi atingido por um tiro no glúteo e está com suspeita de hemorragia interna. Já Neucy Cabral Vieira, da aldeia Nova Vitoriano, foi ferido em uma das pernas e teve alta neste domingo.
“Estávamos tratando do assunto da Eletronorte. Ao finalizar a reunião, os indígenas voltaram para casa de moto. Numa descida na ladeira, os parentes foram abordados e alvejados. Simplesmente atiraram nos parentes. No trajeto, baixaram o vidro e olharam para identificar seeram indígenas. Aceleraram e atiraram. Foi um tiro fatal. Ninguém sabe por que ocorreram esses disparos, essa violência, essa manifestação de ódio”, afirmou a liderança Magno Guajajara ao site de notícias Amazônia Real.
Em nota, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) exige imediata e isenta apuração sobre a onda de crimes contra os povos indígenas e que os criminosos sejam identificados e penalizados nos termos da legislação brasileira. O Cime também atribui os ataques a indígenas, em parte, a discursos racistas e ações ditadas pelo governo federal contra os direitos indígenas .
"Tais crimes, contanto ainda com atentados, ameaças, tortura e agressões ocorridas por todo país contra essas populações, têm acontecido na esteira de discursos racistas e ações ditadas pelo governo federal contra os direitos indígenas", diz a nota.
O trecho da BR-226 na altura das aldeias indígenas Boa Vista e El Betel, localizado entre os municípios de Barra do Corda e Grajaú, segue interditado neste domingo, segundo Polícia Rodoviária Federal do Maranhão (PRF-MA). A via foi bloqueada por índios da etnia Guajajara após o atentado no sábado.
Segundo a PRF, não há previsão para que a via seja liberada. Por conta do bloqueio, foi registrado um congestionamento de veículos de mais de 1,5 quilômetro.
Em um vídeo que circula nas redes sociais, um indígena identificado como 'Nelsi' contou que foi surpreendido por um veículo de cor branca que disparou diversas vezes contra a motocicleta onde ele e o índio Firmino Guajajara estavam.
"Ele [o carro] passou devagarzinho perto de nós ali e quando chegou perto de nós ele atirou, deu dois tiros. E ele ainda atirou nele ali (Firmino Guajajara)", diz o índio.
Há um mês, outro indígena da etnia Guajajara foi assassinado no Maranhão. O líder e integrante do grupo Guardiões da Floresta, Paulo Paulino Guajajara, foi morto durante uma emboscada na Terra Indígena Arariboia, na região de Bom Jesus das Selvas. No mesmo episódio, o líder indígena Laércio Souza Silva ficou ferido. A investigação ficou a cargo da Polícia Federal.