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Após incêndio em SP, moradores tentam reconstruir barracos

Hoje, muitos deles, principalmente autônomos, não foram trabalhar. As crianças também faltaram às aulas porque perderam uniforme e material escolar no incêndio


	Incêndio: fogo exigiu o trabalho de 21 viaturas e 70 homens do Corpo de Bombeiros
 (Stock.Xchange)

Incêndio: fogo exigiu o trabalho de 21 viaturas e 70 homens do Corpo de Bombeiros (Stock.Xchange)

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Da Redação

Publicado em 13 de outubro de 2014 às 19h39.

São Paulo - Três dias após o incêndio que destruiu pelo menos 90 barracos e deixou cerca de 150 famílias desabrigadas na favela da Rua 21 de Abril, no Brás, os moradores tentam agora reconstruir e retomar a vida.

Hoje (13), muitos deles, principalmente os autônomos, não foram trabalhar.

As crianças também faltaram às aulas porque perderam uniforme e material escolar no incêndio.

Todas as roupas que os moradores usavam nesta segunda-feira eram fruto de doações da comunidade.

O almoço também foi oferecido pelo dono de um mercado ao lado da favela, mas foi insuficiente para atender a todos.

“No dia a dia, conheci muitos dos moradores. Vi o prejuízo que eles tomaram, perdendo tudo, e a vida não é fácil. Eu já vivi em favela e hoje, graças a Deus, tenho uma vida melhor”, contou Josué Junior, que doou 40 marmitex, refrigerantes e até dinheiro para os moradores.

Ele conta que viu quando ocorreu o incêndio.

“Quando saí [para ver o incêndio] e vi a multidão,pensei: 400 pessoas desabrigadas no Dia das Crianças. Só penso nisso. Muito triste”, disse ele à Agência Brasil.

A reportagem visitou o local na tarde de hoje (13) e e encontrou tudo destruído.

O chão estava todo coberto de cinzas, resultado do incêndio que tomou a favela sexta-feira (10). O fogo começou por volta das 13h50 e exigiu o trabalho de 21 viaturas e 70 homens do Corpo de Bombeiros.

Pelo menos dois moradores ficaram feridos: uma mulher, que tentava escapar do incêndio com uma criança no colo e acabou caindo, machucando o braço e a perna; e um homem, que machucou a perna ao fugir do fogo.

Dos barracos, nada sobrou: geladeiras, fogões, sofás, fotos e documentos foram todos perdidos. Um dos moradores ficou sem a motocicleta.

A comunidade lamentou também a morte de muitos cachorros que viviam no local.

Parte do material que sobrou do incêndio [principalmente geladeiras] foi vendida para reciclagem e, com o dinheiro arrecadado, cerca de R$ 1,5 mil, os moradores esperam comprar material para fazer a tubulação de água e fornecer luz para o local.

Nesta tarde, os que não foram trabalhar uniam-se para levantar novas casas com a madeira que também receberam de doação.

Com o esforço de todos, e se a madeira for suficiente, eles esperam terminar a construção dos barracos no fim da semana.

Sulamita dos Santos, de 32 anos, mora no local há seis anos com o marido, disse que a sensação foi de perda, de descaso.

"Dá a impressão que a gente é bicho”, definiu. “Eu estava trabalhando, mas corri para cá e consegui salvar o cachorro. Todo mundo perdeu tudo”, lembrou.

Moradora no local há dez anos, o marido e com dois filhos, Elisandra Silva conta que não perdeu nada porque morava na parte de blocos.

"Quem morava na área de barracos – 90 famílias – perdeu tudo. Quanto às dez [famílias] que moravam no bloco, umas perderam, outras, não. "Eu não perdi nada, mas fiquei muito triste. Chorei pelos amigos que perderam documentos, fotos de família.”

A vendedora ambulante Ana Maria Batista Xavier, que vive no local há oito anos, com uma filha, perdeu tudo.

"Não sobrou nada. O que temos aqui é doação. Estamos aqui há muito tempo. Já pedimos projetos [para o local]. Temos moradias fixas aqui e agora querem levar a gente para um albergue? O que a gente precisa é de moradia”, desabafou.

Depois do incêndio, embora a prefeitura tenha oferecido albergues e alojamentos, os moradores preferiram passar a noite na rua, em frente ao terreno.

Da prefeitura eles receberam colchões, cobertores, material de higiene e cesta básica.

“Dormimos na calçada. Foi oferecido albergue, mas não aceitamos porque temos um processo [judicial]. Se abandonarmos o terreno, eles [governo estadual] vão entrar. No outro dia, pressionamos a Defesa Civil para limpar [a área] e voltamos a ocupá-la”, contou Sulamita.

Desde sábado as famílias dormem no terreno espalhando sobre as cinzas os colchões que receberam da prefeitura.

Segundo os moradores ouvidos pela reportagem, o fogo começou com uma briga de casal, que morava no local há pouco mais de um ano.

A mulher, após brigar com o marido, teria cortado o cano de gás e riscado um fósforo, dando origem ao fogo. Nunca havia ocorrido incêndio nessa favela.

O terreno, ocupado há dez anos, pertence à Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU). De acordo com Sulamita, no terreno havia um hospital, que foi demolido. A área foi, então, invadida.

"Há dez anos moramos aqui. Estamos enfrentando um processo em busca de moradia há anos.”

Sulamita disse esperar que algum órgão público faça seu papel, que é cuidar da população.

"Queremos pagar nossa água, nossa luz, nosso apartamento. Se o governo nos beneficiasse, além de dar moradia para essas 150 famílias, caberia muito mais gente. Olha o tamanho desse terreno [estimado em cerca de mil metros quadrados]. O terreno é do estado. Eles vão deixar a gente fazer favela outra vez?”, perguntou.

Durante todo o dia de hoje, nenhum órgão municipal ou estadual tinha enviado representantes ao local até as 15h30, quando a reportagem passou por lá.

Segundo os moradores, hoje a prefeitura mandou apenas o café da manhã, contaram os moradores.

“Na época de eleição, vem todo mundo ver a gente. Mas hoje não veio ninguém para ver se já almoçamos, não veio ninguém para saber de nada. Quem está ajudando são os conhecidos e os vizinhos porque os que devem ajudar não vieram”, reclamou Elisandra.

Procurada pela Agência Brasil, a subprefeitura da Mooca respondeu ter estado no local com a equipe de Defesa Civil, um engenheiro e um agente.

Em nota, já distribuída à imprensa na sexta-feira (10), eles disseram que a Secretaria de Assistência Social esteve no local para fazer encaminhamento a abrigos e fornecer passagens, entre outras medidas.

Já a CDHU informou que o lote pertence a ela e que a área é destinada à construção de moradias para famílias de baixa renda que residem ou trabalham na região central.

“Após invasão do terreno, a companhia entrou com ação de reintegração de posse e aguarda decisão judicial”, diz nota da companhia.

A Agência Brasil também procurou a Secretaria de Assistência Social para saber por que não foi dado almoço para os moradores hoje, mas, até o fechamento desta reportagem, não obteve retorno.

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