McAfee, do MIT: conversa sobre tecnologia deve ser mais positiva
Cientista fala sobre a importância de construir tecnologias que melhorem o mercado de trabalho e a vida das pessoas
Thiago Lavado
Publicado em 16 de março de 2018 às 20h01.
Última atualização em 16 de março de 2018 às 20h02.
Mais do que um grande centro de ensino americano, o Massachusetts Institute of Technology (MIT) também tem como missão expandir o conhecimento para outros lugares do mundo. Nesse sentido, é no MIT que está a Iniciativa de Economia Digital (IDE), uma organização que pretende colocar pessoas e negócios juntos em prol da transformação digital.
Todos os anos, o IDE promove o Desafio de Inovação Inclusiva (IIC, na sigla em inglês), que entrega mais de 1 milhão de dólares em prêmios para empreendedores de todos os continentes que usam a tecnologia para promover mudanças no local de trabalho. Em 2018, 12 organizações finalistas na América Latina serão premiadas em São Paulo. Em outubro, as quatro primeiras colocadas vão para a final do desafio nos Estados Unidos. Os temas deste ano são inclusão financeira, crescimento de renda, criação de novos trabalhos na era digital e acesso à tecnologia — cada uma recebendo 250.000 dólares. As inscrições estão abertas no site do IIC e vão até o dia 1º de maio.
Andrew McAfee, cientista do MIT e co-fundador da Iniciativa de Economia Digital, falou com EXAME sobre o desafio, expectativas para este ano e sobre como a tecnologia está impactando a sociedade e nossos ambientes de trabalho.
A Iniciativa de Economia Digital do MIT premia mais de 1 milhão de dólares por ano para empreendedores ao redor do mundo que estão focados em reinventar o futuro do trabalho. O que vocês procuram nos projetos selecionados?
O uso de tecnologia dá oportunidades para pessoas com baixa renda. E há espaço para escalar os ganhos desse aspecto. Entre os pontos que priorizamos quando julgamos os participantes estão o impacto econômico dos projetos e o ganho que a ideia pode proporcionar em termos de oportunidade para populações.
Os vencedores em outros anos focaram em projetos de ensino de programação, acesso à saúde e tratamento ou até inclusão tecnológica de mulheres, por exemplo. O IIC este ano estabeleceu como pontos principais: desenvolvimento de habilidades, acesso à tecnologia, criação de emprego e aumento de renda e inclusão financeira. Por que esses temas foram escolhidos como categorias em 2018?
Principalmente porque tivemos conversas com políticos e oficiais eleitos, legisladores, empreendedores e estes eram os temas que continuavam aparecendo nas conversas. As pessoas precisam de mais iniciativas que as permitam ter acesso ao sistema financeiro, precisam de novas e melhores habilidades de trabalho. Elas precisam ser encaixadas em novas formas de trabalho e aumentar suas chances de subsistência. Esses tópicos meio que vieram naturalmente enquanto decidíamos o que precisava ser abordado.
Nosso relacionamento com o trabalho mudou drasticamente nos últimos anos diante dos avanços tecnológicos. Agora há diversas questões sobre a substituição de humanos por inteligências artificiais em postos de trabalho, ou mesmo quanto à redução da jornada de trabalho e o impacto na renda de trabalhadores. Há uma preocupação de que avanços poderiam trazer uma disrupção enorme no mercado de trabalho e perdas de emprego. Esses são problemas que o IIC tenta solucionar?
Essa é uma grande questão. É preciso ter em mente que, nos 240 anos que se passaram desde o início da revolução industrial, as pessoas sempre estiveram preocupadas com perdas de emprego por causa de avanços tecnológicos. Essas preocupações não se tornaram realidade. Nós vemos muita destruição de emprego, é verdade, mas vimos ainda mais criação de trabalho, aumento no rendimento das famílias. A vida melhorou para pessoas de diferentes níveis de habilidade em todo o mundo. O ponto que estamos tentando apresentar com o Desafio de Inovação Inclusiva é “vamos manter isso acontecendo”. É muito prematuro dizer que teremos um desemprego massivo resultado de fantásticos avanços digitais e tecnológicos. Queremos mostrar que inovação e empreendedorismo em tecnologia trouxeram grandes avanços no mercado de trabalho e nos salários e queremos encorajar mais pessoas a participarem dessas mudanças. A conversa sobre tecnologia é muito negativa e pessimista atualmente. Estamos tentando mudar isso.
Em suas publicações, você fala sobre as questões sociais que envolvem nossas interações diárias e também nossa relação com tecnologia. Por enquanto, inteligências artificiais não têm habilidades humanas, como compaixão, empatia, entendimento. Como você vê a sociedade nessa era de inovação tecnológica? Teremos que nos reinventar como comunidade?
Nós sempre teremos de adaptar a nós mesmos, nossas comunidades e economias aos avanços da tecnologia. A questão agora é que precisamos fazer isso ainda mais rápido, porque o ritmo dos avanços e das inovações aumentou. Precisamos nos adaptar à tecnologia de uma maneira mais profunda do que jamais precisamos antes. Mas isso não é exatamente algo novo. Uma questão que tento enfatizar é que não podemos focar a educação das pessoas em habilidades que os computadores já são melhores. Temos que treinar as pessoas em habilidades que tenham algum tipo de sinergia com a tecnologia, trazendo valor, como empatia e trato humano, como você mencionou.
Vocês querem trazer inovação e empreendedorismo para pessoas que não têm acesso ou dinheiro. Muitas delas estão em países pouco desenvolvidos, como o Brasil. Qual a melhor maneira de trazer a tecnologia para perto dessas pessoas, ainda mais que os custos dessas novidades pode ser elevado?
Quem pode responder a essa pergunta são as pessoas em São Paulo, Washington, Cambridge. Nós queremos encontrar organizações, indivíduos, empreendedores que estão preocupados em encontrar as respostas para perguntas como essa. Nós iremos analisar as ideias e selecionar as melhores. Como trazemos mais pessoas para a prosperidade? Como nós as incluímos no mundo tecnológico que experienciamos? Esse é um trabalho para inovadores e empreendedores.
O que vocês esperam de empreendedores brasileiros e latino-americanos que irão se inscrever no IIC este ano? Qual é a sua mensagem para eles?
Eu quero encorajar o maior número de pessoas a participar e espero aprender e ser surpreendido com as boas ideias vindo de empreendedores latino-americanos dispostos a trazer suas sugestões para nós. Uma das razões para eu participar do IIC é que consigo aprender e me deparar com uma série de grandes ideias, de todos os lugares do mundo.