Facebook enfrenta desafio à sua altura: a mobilidade
Crescimento da receita da rede desacelera à medida que usuários migram para tablets e celulares. Reação a essa tendência pode definir destino do serviço
Da Redação
Publicado em 17 de junho de 2012 às 17h51.
São Paulo - Há um mês, o Facebook parecia um gigante invulnerável. Com o número de usuários em ascensão e beirando os 900 milhões, o serviço se preparava para abrir capital na bolsa de valores e fazer mais bilionários. Para o infinito e além, parecia dizer a rede.
De fato, no dia 18 de maio, veio a oferta inicial de ações (IPO), que atraiu nada menos do que 16 bilhões de dólares – maior cifra já registrada na abertura de capital de uma empresa de tecnologia. Com ela, foi revelado também um problema. À medida que os usuários da rede migram para dispositivos móveis, a receita do serviço desacelera. Sim, mobilidade é o calcanhar de aquiles do Facebook. Isso vem motivando as mais variadas especulações sobre o que Mark Zuckerberg, criador e CEO do Facebook, deve fazer para redefinir o destino de sua criação.
Surgiram também previsões catastróficas sobre a "morte" do serviço no prazo de oito anos (o que é uma eternidade no mundo digital): "O problema do Facebook está em seu DNA, definido na era pré-mobilidade", diz a VEJA Eric Jackson, analista americano do mercado de tecnologia e autor da profecia. "Caso não mude, o serviço pode ter o mesmo fim de Yahoo! e MySpace, que hoje são irrelevantes."
As águas tranquilas em que navegava o Facebook se agitaram dias após o IPO. O escritório de advocacia americano Robbins Geller abriu uma ação judicial acusando a rede de omitir informações relevantes a potenciais investidores no período que antecedeu a abertura de capital.
O ponto que realmente importa é o arrefecimento do ritmo de crescimento da receita, fortemente dependente dos anúncios de produtos e serviços exibidos nas páginas e perfis dos usuários. No primeiro trimestre de 2012, o faturamento subiu incríveis 45% em relação ao mesmo período de 2011, mas a taxa foi sensivelmente inferior aos 55% da medição anterior.
"Na estreia na bolsa, o Facebook passava por severa e prenunciada redução no crescimento de suas receitas" argumentou a acusação. E emendou a causa: em vez de utilizar o programa na web, as pessoas o utilizam cada vez mais em dispositivos móveis.
De fato, a parcela de cadastrados que acessa a rede a partir de tablets e celulares disparou nos últimos anos, a tal ponto que hoje o acesso móvel já é majoritário (confira quadro abaixo). Boa parte das pessoas acessa a rede social a partir de aplicativos especialmente desenvolvidos para rodar nas telinhas de tablets e celulares. Ocorre, porém, que até o início deste mês esses aplicativos não exibiam anúncios.
Ou seja, quem entrava no serviço para papear com amigos ou postar a foto da nova namorada não enxergava ali mensagens publicitárias – que só eram exibidas aos cadastrados que acessavam o Facebook por meio dos navegadores de internet (Chrome, Internet Explorer, Firefox etc.).
Eis uma provável razão para a desaceleração da receita. De acordo com a mecânica do serviço, o anunciante só remunera o Facebook quando seu anúncio é efetivamente visto ou clicado pelos usuários: se este não vê a propaganda, a rede social não recebe.
O Facebook se apressou para corrigir o problema, é verdade. No início deste mês, dois novos modelos de anúncios passaram a ser exibidos em aplicativos para dispositivos móveis. Um deles já foi torpedeado pelos usuários: são as histórias patrocinadas, que, no feed de notícias, se misturam a postagens que amigos do usuário fazem na rede. "É uma solução eficaz, mas invasiva, uma vez que apresenta um conteúdo no perfil do usuário sem seu consentimento. É como colocar palavras na boca dele", diz Guilherme Rios, diretor da Social Agency, especializada em ações de marketing na rede social.
Rios não foi o único a achar a ação do Facebook desajeitada. Para Eric Jackson, ela demonstra mais uma vez que o DNA da rede não traz know-how para operar na era da internet móvel, mas em uma fase anterior, a da web social. "Hoje, podemos ver que a internet é constituída por três ondas de empreendimentos digitais", diz Jackson. "A primeira engloba companhias criadas entre 1994 e 2001, que buscavam agregar conteúdos: é o caso do Google.
A segunda é das redes sociais, como LinkedIn, MySpace e Facebook. A última, iniciada em 2010, se dedica exclusivamente ao mundo móvel, são negócios concebidos para funcionar onde o usuário está." É o caso do Instagram, ferramenta de edição e compartilhamento de fotos, do Foursquare, serviço baseado em geolocalização, e do Social Cam, uma espécie de Instagram de vídeos. Todos são, por excelência, produtos concebidos para rodar em tablets e celulares e colar em seus usuários, onde quer que eles estejam.
Embora faça bastante barulho, a tese de Jackson de que o Facebook está fadado ao fracasso não é aceita sem resistência. Argumenta-se que nada impede Zuckerberg, um empresário de apenas 28 anos, de se adaptar aos novos tempos. Prova disso foi o recente esforço de aquisição e incorporação do Instagram, por 1 bilhão de dólares, em abril.
"O Google também provou que essas empresas podem incorporar tecnologia nova ao lançar o Android, sistema operacional para dispositivos móveis", diz Silvio Meira, cientista-chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar). "Com ele, o gigante de buscas mergulhou na mobilidade."
Divergências à parte, há uma interseção entre os pontos de vista dos analistas: o Facebook está de fato diante de um desafio à sua altura – como fazer dinheiro num ambiente em que mais e mais gente utiliza a rede a qualquer hora, em qualquer lugar, graças a aparelhinhos portáteis e seus aplicativos.
"Outras grandes empresas, como Apple e Google, ainda têm dificuldades para criar estratégias de monetização", diz Fernando Belfort, analista de mercado sênior da consultoria Frost & Sullivan. Dados da Interactive Advertising Bureau, instituição voltada ao desenvolvimento do mercado de mídia digital, mostram que a receita aferida com publicidade em dispositivos móveis em todo o mundo chegou em 2011 a 5,3 bilhões dólares. É uma cifra respeitável, mas oito vezes inferior à registrada pela internet como um todo só nos Estados Unidos. E
m resumo, o dinheiro ainda está em migração. Dificulta esse movimento o fato de que uma infinidade de aparelhos de celular e tablet inundam o mercado, com sistemas e formatos diferentes. "A diversidade de aparelhos e a desigualdade entre eles comprometem a apresentação de serviços digitais", afirma Meira.
Para o americano Brian Blau, analista do instituto de pesquisas Gartner, o Facebook está ciente da ligação íntima as pessoas e seus smartphones. "Celulares e tablets são hoje a tecnologia com maior potencial de socialização à disposição da humanidade. Conteúdos em texto, foto e vídeo podem ser compartilhados durante o deslocamento das pessoas, liberando-as para atividades, reflexões e interações. As empresas terão que trabalhar duro para reter a atenção de seus consumidores."
São Paulo - Há um mês, o Facebook parecia um gigante invulnerável. Com o número de usuários em ascensão e beirando os 900 milhões, o serviço se preparava para abrir capital na bolsa de valores e fazer mais bilionários. Para o infinito e além, parecia dizer a rede.
De fato, no dia 18 de maio, veio a oferta inicial de ações (IPO), que atraiu nada menos do que 16 bilhões de dólares – maior cifra já registrada na abertura de capital de uma empresa de tecnologia. Com ela, foi revelado também um problema. À medida que os usuários da rede migram para dispositivos móveis, a receita do serviço desacelera. Sim, mobilidade é o calcanhar de aquiles do Facebook. Isso vem motivando as mais variadas especulações sobre o que Mark Zuckerberg, criador e CEO do Facebook, deve fazer para redefinir o destino de sua criação.
Surgiram também previsões catastróficas sobre a "morte" do serviço no prazo de oito anos (o que é uma eternidade no mundo digital): "O problema do Facebook está em seu DNA, definido na era pré-mobilidade", diz a VEJA Eric Jackson, analista americano do mercado de tecnologia e autor da profecia. "Caso não mude, o serviço pode ter o mesmo fim de Yahoo! e MySpace, que hoje são irrelevantes."
As águas tranquilas em que navegava o Facebook se agitaram dias após o IPO. O escritório de advocacia americano Robbins Geller abriu uma ação judicial acusando a rede de omitir informações relevantes a potenciais investidores no período que antecedeu a abertura de capital.
O ponto que realmente importa é o arrefecimento do ritmo de crescimento da receita, fortemente dependente dos anúncios de produtos e serviços exibidos nas páginas e perfis dos usuários. No primeiro trimestre de 2012, o faturamento subiu incríveis 45% em relação ao mesmo período de 2011, mas a taxa foi sensivelmente inferior aos 55% da medição anterior.
"Na estreia na bolsa, o Facebook passava por severa e prenunciada redução no crescimento de suas receitas" argumentou a acusação. E emendou a causa: em vez de utilizar o programa na web, as pessoas o utilizam cada vez mais em dispositivos móveis.
De fato, a parcela de cadastrados que acessa a rede a partir de tablets e celulares disparou nos últimos anos, a tal ponto que hoje o acesso móvel já é majoritário (confira quadro abaixo). Boa parte das pessoas acessa a rede social a partir de aplicativos especialmente desenvolvidos para rodar nas telinhas de tablets e celulares. Ocorre, porém, que até o início deste mês esses aplicativos não exibiam anúncios.
Ou seja, quem entrava no serviço para papear com amigos ou postar a foto da nova namorada não enxergava ali mensagens publicitárias – que só eram exibidas aos cadastrados que acessavam o Facebook por meio dos navegadores de internet (Chrome, Internet Explorer, Firefox etc.).
Eis uma provável razão para a desaceleração da receita. De acordo com a mecânica do serviço, o anunciante só remunera o Facebook quando seu anúncio é efetivamente visto ou clicado pelos usuários: se este não vê a propaganda, a rede social não recebe.
O Facebook se apressou para corrigir o problema, é verdade. No início deste mês, dois novos modelos de anúncios passaram a ser exibidos em aplicativos para dispositivos móveis. Um deles já foi torpedeado pelos usuários: são as histórias patrocinadas, que, no feed de notícias, se misturam a postagens que amigos do usuário fazem na rede. "É uma solução eficaz, mas invasiva, uma vez que apresenta um conteúdo no perfil do usuário sem seu consentimento. É como colocar palavras na boca dele", diz Guilherme Rios, diretor da Social Agency, especializada em ações de marketing na rede social.
Rios não foi o único a achar a ação do Facebook desajeitada. Para Eric Jackson, ela demonstra mais uma vez que o DNA da rede não traz know-how para operar na era da internet móvel, mas em uma fase anterior, a da web social. "Hoje, podemos ver que a internet é constituída por três ondas de empreendimentos digitais", diz Jackson. "A primeira engloba companhias criadas entre 1994 e 2001, que buscavam agregar conteúdos: é o caso do Google.
A segunda é das redes sociais, como LinkedIn, MySpace e Facebook. A última, iniciada em 2010, se dedica exclusivamente ao mundo móvel, são negócios concebidos para funcionar onde o usuário está." É o caso do Instagram, ferramenta de edição e compartilhamento de fotos, do Foursquare, serviço baseado em geolocalização, e do Social Cam, uma espécie de Instagram de vídeos. Todos são, por excelência, produtos concebidos para rodar em tablets e celulares e colar em seus usuários, onde quer que eles estejam.
Embora faça bastante barulho, a tese de Jackson de que o Facebook está fadado ao fracasso não é aceita sem resistência. Argumenta-se que nada impede Zuckerberg, um empresário de apenas 28 anos, de se adaptar aos novos tempos. Prova disso foi o recente esforço de aquisição e incorporação do Instagram, por 1 bilhão de dólares, em abril.
"O Google também provou que essas empresas podem incorporar tecnologia nova ao lançar o Android, sistema operacional para dispositivos móveis", diz Silvio Meira, cientista-chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar). "Com ele, o gigante de buscas mergulhou na mobilidade."
Divergências à parte, há uma interseção entre os pontos de vista dos analistas: o Facebook está de fato diante de um desafio à sua altura – como fazer dinheiro num ambiente em que mais e mais gente utiliza a rede a qualquer hora, em qualquer lugar, graças a aparelhinhos portáteis e seus aplicativos.
"Outras grandes empresas, como Apple e Google, ainda têm dificuldades para criar estratégias de monetização", diz Fernando Belfort, analista de mercado sênior da consultoria Frost & Sullivan. Dados da Interactive Advertising Bureau, instituição voltada ao desenvolvimento do mercado de mídia digital, mostram que a receita aferida com publicidade em dispositivos móveis em todo o mundo chegou em 2011 a 5,3 bilhões dólares. É uma cifra respeitável, mas oito vezes inferior à registrada pela internet como um todo só nos Estados Unidos. E
m resumo, o dinheiro ainda está em migração. Dificulta esse movimento o fato de que uma infinidade de aparelhos de celular e tablet inundam o mercado, com sistemas e formatos diferentes. "A diversidade de aparelhos e a desigualdade entre eles comprometem a apresentação de serviços digitais", afirma Meira.
Para o americano Brian Blau, analista do instituto de pesquisas Gartner, o Facebook está ciente da ligação íntima as pessoas e seus smartphones. "Celulares e tablets são hoje a tecnologia com maior potencial de socialização à disposição da humanidade. Conteúdos em texto, foto e vídeo podem ser compartilhados durante o deslocamento das pessoas, liberando-as para atividades, reflexões e interações. As empresas terão que trabalhar duro para reter a atenção de seus consumidores."