Xbox Kinect, da Microsoft: Claudio Pinhanez desenvolveu um sensor similar 15 anos atrás (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 28 de março de 2011 às 15h23.
São Paulo — O Kinect veio ao mundo graças a um brasileiro, o engenheiro Alex Kipman. O curioso é que, há 15 anos, outro brasileiro, o cientista Claudio Pinhanez, fazia experiências muito similares no laboratório do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), renomada universidade americana e berço de grandes invenções. O sensor de movimento não é novidade para a comunidade científica, que estuda a tecnologia desde os anos 70. O conceito é pesquisado por especialistas da área de visão computacional e chegou a ser testado em meados da década de 90.
Pinhanez é cientista da IBM e PhD pelo MIT. As primeiras experiências no que viria a ser o avô do Kinect, conta, exigiam um computador no valor de 200.000 dólares. Ele destaca, no entanto, que a reação das pessoas ao interagirem com o acessório do Xbox 360, nos dias de hoje, é exatamente a mesma testemunhada ao longo de sua pesquisa no passado. Estou vendo no mercado muitas das coisas que observamos em 1995. Não mudou nada!, diz.
Entusiasta das novas tecnologias, o especialista afirma ainda ter desenvolvido uma das primeiras plataformas de blog da web. Para se comunicar com os demais pesquisadores da universidade, Pinhanez criou um sistema simples, ainda sem o recurso dos comentários, capaz de permitir a publicação de mensagens de texto em tempo real. Nostálgico, lembra do feito: "Fui o primeiro a criar um diário on-line. Confira a entrevista a seguir.
Como foi desenvolvida a tecnologia de sensores de movimento utilizada no Kinect?
No MIT trabalhei com questões ligadas à tecnologia para a percepção humana, principalmente visão computacional. Criávamos interações através de câmeras que, acopladas a um computador, informavam ao sistema a posição e a atividade de pessoas monitoradas por elas. Quando minha sobrinha ganhou um Kinect, percebi que o equipamento fazia exatamente o que testávamos em 1995. A diferença é que na época era necessário uma computador de 200.000 dólares para processar o movimento captado pelas câmeras e repeti-lo na tela. Para se ter uma ideia, uma câmera como a usada no Kinect custava algo em torno de 15.000 dólares nos anos 90. Se o custo dessa tecnologia tivesse baixado, provavelmente teríamos lançado o sensor naquela época.
Assista, a seguir, ao vídeo de uma experiência realizada no MIT com o protótipo:
E o conceito do sensor de movimento já existia?
Sim. Esse conceito existe desde 1970, quando um pesquisador construiu um hardware só para isso. É claro que a ideia não era viável na época. O Kinect permite a interação do homem com a máquina por meio dos sensores. Essa conexão deve aumentar?
Essa é a história do homem. Estamos cada vez mais conectados aos dispositivos tecnológicos. O computador é uma extensão do nosso cérebro, assim como os óculos são extensões dos nossos olhos. Atualmente, meu conhecimento está armazenado em três lugares: no meu cérebro, no meu laptop e no meu caderno de anotações. É uma grande bobagem gastar os meus neurônio para guardar coisas que ficam melhor armazenadas em uma máquina.
O senhor ainda usa um caderno de anotações?
Eu uso um bloco, porque a interface para fazer alguns tipos de anotações ainda não é boa o suficiente no computador. O bloco me permite preservar a cronologia das minhas ações e pensamentos.
O senhor já foi premiado por obras artísticas que permitem a interação homem-máquina. Em sua opinião, a literatura vai mudar com livros e leitores digitais?
O romance, por exemplo, é uma narrativa linear e funciona bem no formato livro. Isso não vai mudar. O que surgirão serão novos gêneros literários, como o blog, que possui uma linguagem e uma estética próprias, que jamais poderão ser adaptadas para um livro. Pouca gente sabe, mas o primeiro diário on-line foi desenvolvido por mim, em 1994, no MIT. Foi uma experiência muito interessante, embora ainda não tivéssemos suporte para inserir um campo de comentários. Eu interagia com os leitores, a maioria do MIT, por e-mail.
Em que projeto da IBM o senhor trabalha atualmente?
Quando comecei a pesquisar a relação homem-máquina lá no MIT, o computador era algo isolado do mundo. Com a internet, essa ideia desapareceu. Ao longo desse processo ocorreu algo que ninguém imaginava: a maneira como as pessoas passaram a interagir umas com as outras e com a informação mudou e empresas de serviços passaram a funcionar como mediadoras dessa comunicação. O Google é um bom exemplo. Eles prestam serviços, como e-mail e buscas. Por trás do gigantesco parque de servidores há pessoas comandando esse sistema. Trata-se de um sistema humano-computacional. Aqui na IBM pesquiso essa relação homem-máquina para evitar que sistemas travem a relação com o consumidor.
Qual tecnologia mudará nossa forma de enxergar o mundo daqui a, digamos, vinte anos?
Não sei se isso acontecerá nos próximos vinte ou trinta anos, mas tenho visto pesquisas fascinantes lá no MIT. Atualmente, as coisas são construídas através de processos físicos e químicos, mas o mundo mudará radicalmente quando processos biológicos forem utilizados na construção de coisas. Será possível comprar uma planta que produza fibra de carbono. Tudo isso funcionará através da programação de células. No futuro, teremos um organismo trabalhando para criar materiais e elementos.
Essas pesquisas já estão sendo feitas?
Um professor de lá já está tocando essa pesquisa. Claro que tudo ainda está muito no início. Pode parecer surreal, mas em 1970 era loucura dizer que três computadores em todos os Estados Unidos poderiam ser conectados através de uma rede. Já chegamos ao limite na informática. A próxima barreira é fazer com que sistemas humano-computacionais funcionem de forma mais orgânica.