Jack Dorsey, cofundador do Twitter, reduziu a Web3 a “um brinquedo dos capitalistas de risco”. Vale a pena acompanhar os próximos capítulos (Westend61/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 24 de fevereiro de 2022 às 05h20.
Ela não existe de fato. Ainda assim, domina grande parte das conversas entre pesquisadores, entusiastas e empreendedores de tecnologia. Esse novo modelo de rede, que poderá substituir a Web2, ou “a internet como a conhecemos hoje”, despertou minha curiosidade há algum tempo. Embora seja tudo muito recente e incerto, este me parece ser o momento ideal para nos interessarmos pelo assunto e refletirmos sobre suas possibilidades.
Como bem definiu o analista Packy McCormick, a Web1 (1990-2005) era sobre protocolos abertos descentralizados, governados pela comunidade que tinha acesso à rede. A maioria dos usuários era consumidora, e não produtora de conteúdo. Quem se lembra dos sites com páginas estáticas, da conexão lenta e de quando não era possível nem mesmo anexar arquivos em um e-mail?
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Já a Web2 (2005-2020) era sobre serviços centralizados, administrados por grandes corporações, como Facebook, Amazon, Apple e Google. Na Web2, os sites se tornaram mais interativos e passamos a nos relacionar também online, por meio das redes sociais. Os celulares surgiram, a qualidade e a velocidade da conexão melhoraram, e pudemos nos tornar produtores de conteúdo.
Desde 2021, estaríamos vivendo o início da era da Web3 (2021-?), que deverá combinar o espírito descentralizado e governado pela comunidade da Web1 com a funcionalidade avançada e moderna da Web2. Tudo isso conectado pelos chamados tokens — que podem ser códigos numéricos de verificação e, também, representar ativos.
No final do ano passado, um artigo do analista Chris Dixon com o título Por que a Web3 é importante listou fatores para a relevância, como o fato de dezenas de bilhões de dólares terem sido investidos em startups baseadas na Web3 e a migração de talentos de grandes empresas para esses negócios.
Algumas pessoas se mostram otimistas também com a possibilidade de termos uma rede que ofereça serviços construídos sobre bases tecnológicas descentralizadas, como os blockchains. Atualmente, quase todos os sites e aplicativos que acessamos são de grandes corporações e, não raro, é necessário abrir mão da privacidade para poder utilizá-los. A hipótese a ser testada com a Web3 é: se é possível criar moedas como o bitcoin, talvez seja possível criar também novas redes, games, streamings e fintechs.
Outra oportunidade já mapeada tem relação direta com a maneira como compramos imóveis hoje. Na Loft, o cliente já pode percorrer uma jornada 100% digital — da busca pelo imóvel à assinatura online da escritura, passando pelas visitas online às propriedades —, mas ainda precisa financiar ou arcar com o custo total do imóvel. No caso de um condomínio gerenciado por uma Organização Autônoma Descentralizada (DAO, na sigla em inglês), no entanto, o locatário poderia adquirir apenas uma fração (ou um token) do imóvel que ele ocupa e, com o tempo, se ele assim desejar, comprar outras fatias até se tornar o único proprietário. Uma solução que tem potencial de ampliar o acesso de milhares de pessoas à habitação.
Mas por que as pessoas trabalhariam no desenvolvimento desses serviços? As criptorredes fornecem incentivos econômicos na forma de tokens para desenvolvedores, mantenedores e outros participantes. Elas alinham seus participantes para trabalharem juntos em direção a um objetivo comum — o crescimento da rede e a valorização do token.
Há, ainda, a questão de que, atualmente, os usuários abrem mão da privacidade e ficam vulneráveis a violações de segurança. E, tão importante quanto, o fato de que essa centralização criou tensões sociais mais amplas, que podemos ver nos debates sobre fake news e vieses algorítmicos. Empresas como YouTube, Instagram e Twitter são a “casa” de uma grande fatia do conteúdo disponível online hoje, incluindo discurso político, e podem decidir, sozinhas, quem será banido de suas plataformas.
Tendo a concordar com Chris Dixon quando ele afirma que redes descentralizadas não podem ser vistas como uma bala de prata que resolverá todos os problemas da internet. Mas essa nova proposta de rede inegavelmente oferece uma abordagem muito melhor do que os sistemas centralizados atuais.
Hoje, grupos de funcionários de grandes plataformas, por exemplo, decidem como as informações são classificadas e filtradas, quais usuários são promovidos e quais são banidos, além de outras importantes decisões de governança. Pelo menos no papel, a Web3 se propõe a permitir que essas decisões sejam tomadas pela comunidade, usando mecanismos abertos e transparentes. Como sabemos do mundo offline, os sistemas democráticos podem não ser perfeitos, mas são muito melhores do que as outras alternativas.
Se, ainda assim, você não acredita em um terceiro estágio da internet, saiba que você tem aliados de peso. Jack Dorsey, cofundador e ex-CEO do Twitter, reduziu a Web3 a “um brinquedo dos capitalistas de risco”. Ele inclusive afirmou que a Web3 “não democratizará a internet, mas transferirá o poder de players como o Facebook para fundos de capital de risco”. Elon Musk se mostrou tão cético quanto Dorsey e já disse em uma entrevista que o novo modelo de rede parece “mais chavão de marketing do que realidade”.
Só mesmo uma intervenção regulatória de Washington ou de outro lugar poderia esfriar o “hype” em torno da Web3. Falando em Washington, em dezembro o Congresso americano realizou audiências sobre uma possível regulamentação de criptomoedas — e, por extensão, todos os tokens potenciais da Web3. Vale a pena acompanhar os próximos capítulos.