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Há tempo para o governo Bolsonaro agir?

O presidente Jair Bolsonaro chega à metade de seu mandato sem ter aproveitado os dois primeiros anos para avançar em uma agenda possível. Dá tempo de mudar?

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O próximo ano deve ser marcado pela saída da pandemia e pelo crescimento robusto em diferentes segmentos. Ainda assim, é necessário manter o foco na questão fiscal (Getty Images/Getty Images)

O próximo ano deve ser marcado pela saída da pandemia e pelo crescimento robusto em diferentes segmentos. Ainda assim, é necessário manter o foco na questão fiscal (Getty Images/Getty Images)

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Sergio Vale

Publicado em 3 de dezembro de 2020 às, 05h05.

Ao ser eleito em 2018, o presidente Jair Bolsonaro tinha pela frente vários desafios na esfera econômica e muita expectativa do mercado de conseguir entregar a ambiciosa agenda do ministro da Economia,Paulo Guedes. Do muito que foi pensado e proposto, porém, pouco resta dois anos depois.

A forte agenda liberal se perdeu em uma pauta concentrada na reforma da Previdência no primeiro ano e em lidar com a pandemia de covid-19 no segundo ano. Diga-se de passagem, uma reforma distante do modelo liberal chileno que o governo queria e uma pandemia que o forçou a uma resposta keynesiana padrão de mais gastos públicos.

Talvez não tenha sido suficiente para perceber em dois anos que agendas liberais, em um país de Estado pesado, como o Brasil, são difíceis de prosperar e precisam de muita força política. Ainda há certa tentativa dessa agenda quando se ouve aqui e ali que as privatizações estão na esquina para ocorrer.

Mas houve uma tentativa de ser mais pragmático, e o governo se viu às voltas com propostas mais pé no chão. A reforma tributária, por exemplo, focou a junção de PIS e Cofins e não se ouviu falar mais sobre isso, enquanto a reforma administrativa tentada é para novos entrantes apenas. Vale dizer que a infame tentativa de retomar a CPMF não vale como pragmatismo — simplesmente, não faz sentido mesmo.

Com isso, o governo saiu de uma explosão liberal para um minimalismo programático e perdeu o rumo de achar um meio-termo. As reformas não são ambiciosas o suficiente para o capital político que o governo tem e acabam pecando pela timidez. O meio do caminho que seria o ideal não parece algo palatável ao governo, que tem um presidente que, por natureza, não costuma ter posições de conciliação.

Nesse espírito, chegamos à metade do mandato e, quando se vê o horizonte, ele não tem como não ser preocupante. O governo deixou de aproveitar os dois primeiros anos para avançar em uma agenda possível. A opção pelo tudo liberal ou por quase nada que é politicamente possível nos faz crer que 2021 deverá ser mais do mesmo.

Mas o resultado fiscal da pandemia trará dificuldades para essa agenda minimalista. Demandam-se, em momentos de crise, agendas mais robustas, e esse caminho do meio fica prejudicado quando as pontes que poderiam ter sido feitas foram sendo dinamitadas ao longo do tempo. Em um governo com tantas fragilidades, como votar o que será necessário para contornar a crise fiscal?

De imediato, no primeiro trimestre e, no máximo, no segundo trimestre deveria haver uma resposta firme na área fiscal. A dívida bruta, que em dois anos deverá chegar a 100% do PIB, terá de ser atacada com a aprovação da PEC emergencial, regulamentando os gatilhos necessários para a regra do teto, e uma reforma administrativa que — espera-se — envolva os funcionários da ativa.

Reformas desse calibre, se ocorrerem, serão insuficientes para diminuir a trajetória da dívida pública. Serão mais como puxadinhos em um governo que tem dificuldade em seguir pelo meio. O mercado, entretanto, dá cada vez mais sinais de que migalhas de reformas não serão suficientes. A equipe econômica segue perdendo força na capacidade de mostrar que está com as rédeas da política econômica.

Assim, entramos no terceiro ano de governo com muitos ajustes a ser feitos e o governo em sua maior fragilidade política. O resultado da eleição municipal mostra a força do centro e do centrão ao mesmo tempo, mas esses são campos opostos e o presidente terá de se agarrar de fato ao centrão.

Do ponto de vista internacional, a recuperação pós-covid com a vacina deveria trazer certo alívio para o mundo e, consequentemente, para o Brasil. A eleição de Biden, entretanto, deve trazer dificuldades crescentes ao governo em entender a necessidade de uma agenda ambiental mais técnica e menos política. O risco de perdermos investimentos será grande com a tendência de o governo não colocar a questão ambiental nos moldes do Acordo de Paris.

Nesse mar revolto, será verdade que as commodities devem continuar indo bem. Com a taxa de câmbio ainda muito depreciada pelas tensões aqui listadas e com os preços de commodities pressionados por uma China crescendo 8% e um dólar no mínimo estável, deveremos ver outro ano favorável para o agronegócio, para as commodities metálicas e para o petróleo, que deve ter recuperação mínima de preços. Além disso, a construção deverá ter outro ano positivo, com taxas de juro de financiamento ainda baixas. Juntos, esses segmentos representam cerca de 50% do PIB brasileiro, o que demonstra que teremos vigor em boa parte da economia.

O ano de 2021 será o da saída da pandemia e de crescimento robusto em diversos segmentos, o que por si só é positivo para a economia. Mas, para evitar que essas boas notícias se percam, o governo precisa focar a questão fiscal relevante. De nada adianta ter uma boa Lei de Saneamento se as condições de investimento não estão dadas por um nebuloso cenário macro. Se o governo conseguir focar e entregar resultados nessa esfera, o horizonte vai melhorar. O contrário já vimos diversas vezes no passado e nunca terminou bem.

(Gustavo Lourenção/Valor/Folhapress)

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