O estudioso britânico Mabon: “Uma guerra prejudicaria os sauditas” (Foto/Divulgação)
Da Redação
Publicado em 26 de setembro de 2019 às 05h02.
Última atualização em 26 de setembro de 2019 às 10h18.
O britânico Simon Mabon, professor de relações internacionais na Universidade Lancaster, perdeu a conta de quantas vezes foi ao Oriente Médio, seu foco de estudo — é autor do livro Saudi Arabia and Iran: Power and Rivalry in the Middle East (“Arábia Saudita e Irã: poder e rivalidade no Oriente Médio”).
Quando um ataque sem precedentes a duas refinarias da Arábia Saudita afetou as cotações do petróleo no mundo, em 14 de setembro, Mabon não se surpreendeu. O disparo de 25 mísseis e drones contra as refinarias foi mais um capítulo no conflito, que afetou 6% do abastecimento global. Aqui, Marbon analisa os efeitos do ataque e as disputas regionais, que podem provocar mais estragos no mundo.
Quais podem ser as repercussões geopolíticas e econômicas dos ataques às instalações petrolíferas da Arábia Saudita?
O ataque à refinaria foi uma escalada de tensões e mexeu peças do tabuleiro geopolítico. Se os drones e os mísseis que atingiram a Arábia Saudita foram disparados de bases no Irã ou no sul do Iraque, onde há milícias apoiadas pelo governo iraniano, trata-se de uma clara demonstração de força dos iranianos. Se a ação partiu dos rebeldes houthis, do Iêmen, que reivindicam o atentado, o resultado não muda muito. Eles são financiados pelo Irã.
Pode acontecer de novo?
Sim. O Irã já provou que tem mísseis balísticos e armas de alta precisão. Já ficou claro que o Irã está jogando pesado, com a intenção de desestabilizar a Arábia Saudita, aliada dos Estados Unidos e inimiga dos aiatolás há décadas. Agora, as cartas desse baralho geopolítico parecem estar mais favoráveis ao Irã.
Por quê?
Há uma questão econômica importantíssima em jogo. Até o final deste ano, o governo saudita espera abrir o capital na bolsa da petroleira estatal Aramco, uma empresa gigantesca. Desse modo, ele espera arrecadar bilhões de dólares.
O que mudou com esse ataque?
Além de ter surpreendido a população, os investidores estão mais cautelosos. A Arábia Saudita tem um plano para diversificar sua economia, chamado Visão 2030, e pretende atrair capital. A intenção é construir cidades inteligentes e centros de tecnologia. Tudo isso requer investimento.
Como esses planos interferem na geopolítica da região?
Uma guerra prejudicaria o reino saudita. Conflitos armados não combinam com investimentos. Será difícil ver uma reação mais incisiva do governo saudita ou de seus aliados americanos.
O Irã, então, está usando essa situação para jogar mais pesado?
Sem dúvida. Os iranianos são mestres nessa arte. Eles sabem que não interessa a ninguém deflagrar uma guerra na região. As reações devem se restringir a sanções econômicas e ataques aos houthis, no Iêmen, como já vem acontecendo. Mas as tensões estão se ampliando de forma preocupante.
Enquanto a economia mundial continuar dependente do petróleo, essa situação não deverá mudar?
Provavelmente, não. Os laços comerciais e diplomáticos entre a Arábia Saudita e os Estados Unidos se fortaleceram depois da Segunda Guerra Mundial. Os Estados Unidos viram a importância estratégica do petróleo no final da década de 40. Outros paí-ses os seguiram. Não vejo o que ocorre no Oriente Médio com bons olhos. O conflito regional que ultrapassou as fronteiras afeta a economia mundial. Está difícil prever o futuro. n