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O clube do bilhão das startups está maior

Nos Estados Unidos, o número de startups que valem mais de 1 bilhão de dólares cresceu repentinamente nos últimos dois anos. Será o sinal de uma nova bolha?


	 

	Dorsey, do Square: aos 36 anos, o empreendedor americano já fundou duas empresas que valem mais de 1 bilhão de dólares
 (Divulgação)

  Dorsey, do Square: aos 36 anos, o empreendedor americano já fundou duas empresas que valem mais de 1 bilhão de dólares (Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 23 de março de 2013 às 09h41.

São Paulo - O americano Joe Lonsdale está na lista de empreendedores do Vale do Silício que podem sair na rua sem ser reconhecidos, diferentemente de estrelas como Mark Zuckerberg, criador do Facebook. A Palantir Technologies, empresa fundada por Lonsdale em 2004, também não aparece com frequência em sites e blogs de tecnologia.

Mesmo sem chamar a atenção do grande público, a Palantir é considerada hoje um dos negócios mais promissores do mercado de TI nos Estados Unidos. A empresa tornou-se referência em tecnologias de big data, como são chamados os sistemas dedicados ao tratamento de um grande volume de informações. Seu sistema já foi usado para encontrar os suspeitos do assassinato de um agente de imigração e até para desmembrar redes terroristas na Síria. 

Em certa medida, o anonimato da Palantir revela um novo fenômeno no setor de startups americanas: o crescimento do número de membros do chamado “clube do bilhão”. Até pouco tempo, uma empresa de tecnologia que conseguia ultrapassar a marca de 1 bilhão de dólares em valor de mercado dificilmente passava despercebida.

Hoje, a Palantir tem valor de mercado estimado em 8 bilhões de dólares. Mesmo serviços considerados mais populares, como o Dropbox, software para armazenar arquivos online, e o Square, sistema de pagamento móvel, não causam a sensação que o Google provocou há 15 anos, quando era uma startup.

Até 2011, não mais que 30 empresas iniciantes valiam 1 bilhão de dólares ou mais. Hoje, estima-se que sejam mais de 40, e, segundo Jim Goetz, sócio do fundo americano de capital de risco Sequoia, um dos maiores no Vale do Silício, devem chegar a 100 até o final do ano. A euforia em torno do atual crescimento das empresas bilionárias leva a uma inevitável comparação com o período que antecedeu o estouro da bolha da internet, há cerca de 13 anos. Estaríamos num novo período de exuberância irracional? 

Mudança

Uma análise mais detalhada mostra que os tempos atuais são outros. Segundo um estudo da consultoria inglesa PwC, em 2000, os fundos de capital de risco colocaram mais de 105 bilhões de dólares em cerca de 8 000 empresas de tecnologia. Com os preços dos papéis de companhias de tecnologia totalmente distorcidos, a bolsa de valores veio abaixo. Entre 2000 e 2003, a perda de valor de empresas listadas na Nasdaq, bolsa para o setor de tecnologia, foi de cerca de 7 trilhões de dólares.


Após o desastre, claro, os investimentos caíram. Chegaram a 19 bilhões de dólares em 2003. Recentemente, houve uma melhora, mas para patamares bem mais modestos do que os registrados no período pré-bolha. Em 2012, os fundos investiram 27 bilhões de dólares em cerca de 3 700 empresas.

Outro parâmetro usado para afastar a hipótese de bolha é analisar a relação entre o valor de mercado e o lucro das empresas de tecnologia de capital aberto. Em março de 2000, a Cisco valia 109 vezes seu lucro anual. Hoje vale 12 vezes. O valor da Microsoft, a maior empresa de tecnologia da época, era 75 vezes seu lucro. Hoje, o posto é ocupado pela Apple, que mantém a relação do preço da ação e do lucro na casa de dez a 15 vezes.

O trauma causado pelo estouro da bolha fez com que os investidores adotassem um perfil mais cauteloso e exigente nos últimos anos. Em vez de sair atirando para todos os lados, os fundos de capital de risco passaram a focar seus investimentos em alguns poucos e bons — empresas que parecem estar bem posicionadas para explorar a recente explosão no número de consumidores de tecnologia. Hoje são 2,5 bilhões de usuários de internet no mundo, 560% mais do que uma década atrás.

Os mercados de smartphones e tablets, que no início dos anos 2000 não existiam, abriram novas possibilidades para startups voltadas para o mundo dos aplicativos. O mesmo vale para a computação em nuvem, softwares e serviços oferecidos pela internet. “As últimas inovações criaram um ecossistema mais rico para quem quer em­preen­der”, afirma Brian Feinstein, sócio do fundo de capital de risco Bessemer Venture Partners, com sede na Califórnia. “São mercados que têm espaço para crescer, o que indica que, no longo prazo, teremos mais empresas avaliadas em mais de 1 bilhão de dólares.”

Junto a esse ecossistema mais rico, o que ajuda a ampliação do clube das bilionárias é a mudança no perfil dos empreendedores, que hoje estão mais maduros em relação à geração anterior e passam mais segurança a potenciais investidores. Muitos estão na faixa de 30 a 40 anos, têm passagens por grandes empresas de tecnologia ou já estão na segunda ou na terceira startup.

O americano Jack Dorsey, de 36 anos, tem no currículo a criação de duas empresas que ultrapassaram o valor de 1 bilhão de dólares: o Twitter, de 2006, e o Square, de 2009, um sistema de pagamentos para celular avaliado em 3,2 bilhões de dólares. Ben Silbermann, de 30 anos, tinha 26 quando fundou a rede social Pinterest, em 2009, avaliada hoje em 2,5 bilhões de dólares. Antes de abrir seu negócio, foi funcionário do Google.


Com o perfil mais maduro dos empreendedores, é natural que essas empresas tenham uma postura de negócios menos imediatista, como era comum acontecer nos tempos pré-bolha da internet. A regra era ter uma ideia, escrever um plano de negócios e tentar vendê-lo o mais rápido possível. Em 2000, as empresas que chegaram a 1 bilhão de dólares de valor de mercado levavam, em média, dois anos para atingir a marca.

Hoje, quase nenhuma das empresas do grupo tem menos de quatro anos de vida. Há até casos extremos de negócios que levaram mais de dez anos para se tornar bilionários. A SurveyMonkey, serviço que permite fazer pesquisas online, foi fundada pelo americano Ryan Finley em 1999.

Foi só em dezembro do ano passado, quando recebeu 444 milhões de dólares em uma rodada de investimentos, que a empresa chegou ao valor de mercado de 1,3 bilhão de dólares. “Sobrevivemos por vários anos com poucos aportes”, afirma Dave Goldberg, atual presidente da empresa. “De certo modo, isso foi bom. Quanto mais sócios, mais pressão o empreendedor sofre, o que pode ser ruim quando se está começando.”

Foi para evitar essa pressão que o americano Drew Houston, criador do Dropbox, preferiu esperar. Sua empresa levou sete anos para se tornar bilionária. Só em 2011 uma rodada de investimentos de dez fundos de capital de risco a fez atingir um valor de mercado de 4 bilhões de dólares. Em 2009, Houston teve propostas para vender seu negócio até do fundador da Apple, Steve Jobs, mas recusou. “Tínhamos planos de longo prazo que envolviam atender usuários de todos os sistemas e não queríamos nos prender aos da Apple”, diz.

Quem analisa o mercado de tecnologia nos Estados Unidos diz que o aumento no número de empresas bilionárias está apenas no começo. Até onde a vista alcança não faltarão investidores dispostos a colocar dinheiro no Vale do Silício e consumidores de tecnologia em abundância por todos os cantos do mundo. Se continuar assim, não vai demorar muito para nascer o clube dos 10 bilhões.

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