Mais caro e mais pobre: a gastança oficial a descoberto está gerando inflação e recessão ao mesmo tempo (Alexandre Severo / EXAME)
Da Redação
Publicado em 26 de agosto de 2015 às 18h00.
São Paulo — Vamos ver se dá para entender. O governo da presidente Dilma Rousseff, que, em sua autoavaliação, faz uma das melhores gestões jamais registradas na história da economia mundial, foi injustamente atacado por uma súbita e misteriosa crise econômica fabricada no exterior — tão misteriosa que até agora não foi possível descobrir onde ela está, quem a criou e por que tem prejudicado só o Brasil, junto com umas poucas economias bem-sucedidas, como a da Venezuela, a da Grécia e a de lugares parecidos.
Por causa disso, e só disso, o governo ficou sem dinheiro e não tem como cumprir suas obrigações, sendo forçado a fazer um ajuste — quer dizer, pisar no freio das despesas que até outro dia vinha fazendo com tanto orgulho e que apresentava como prova de sua competência para governar o país.
Esse ajuste tem uma característica inédita: destina-se a diminuir gastos, mas prevê que a economia a ser feita no orçamento deste ano será de 0% sobre a arrecadação estimada até o fim de dezembro. Outro aspecto interessante, e ainda não acessível ao entendimento comum, é a decisão de reduzir a despesa pública e, ao mesmo tempo, aumentar os juros — incluindo, naturalmente, os que o governo paga sobre a própria dívida.
Imaginava-se, até outro dia, que juro é custo; serve para diversos propósitos de política econômica, sem dúvida, mas também é certo que, quando sobe, aumenta os gastos de quem precisa pagar o dinheiro que tomou emprestado. Além de encarecer os desembolsos da dívida pública, reduz os ganhos de toda a economia privada e faz com que ela pague menos impostos — justo na hora em que o Tesouro Nacional está precisando arrecadar mais. Complicado até aqui? Calma, porque ainda vai complicar mais.
Um programa de ajuste, pelo que se imagina, destina-se a ajustar o que está desajustado — no caso, despesas que estão acima das receitas, o que leva o poder público a se endividar mais e a gastar mais com sua dívida.
Mas tudo o que o governo está fazendo no momento é segurar pagamentos, anular investimentos e tentar escapes de emergência, como a retenção do adiantamento da metade do 13º salário — coisa que, por sinal, o ministro da Fazenda anunciou, mas não conseguiu fazer porque o PT não gostou e a presidente mandou que voltasse atrás.
Não há até agora, após oito meses de ajuste, a eliminação real de nenhuma fonte geradora de despesa, e isso garante que a despesa de sempre continuará sendo feita como sempre. As coisas ficam ainda mais difíceis para os ajustadores quando se leva em conta que 90% das receitas do orçamento, por lei, têm de ser obrigatoriamente usadas em pagamentos já determinados.
É proibido mexer nesses gastos — se a arrecadação aumentar, a despesa tem de aumentar junto, o que torna impossível a intenção de economizar. Para piorar, a arrecadação está caindo. As empresas estão pagando menos imposto de renda, porque estão tendo menos renda; na verdade, o conjunto da economia está gerando menos imposto, porque todos estão consumindo menos e todos estão faturando menos.
Não poderia ser diferente. O Brasil, por ação direta do governo, está em recessão desde o ano passado — teve crescimento vizinho a zero em 2014 e vai andar para trás em 2015. Apesar dos fatos, porém, a gerência geral de Brasília decidiu que a receita deste ano aumentaria. Já estava difícil pagar a fatura com o dinheiro que efetivamente recebia. Fica mais difícil pagá-la com dinheiro que não recebeu.
O mais confuso, nisso tudo, é a posição da presidente da República, que não admite erro algum: segundo ela, o governo só “gastou mais” até agora porque “tinha mais”. Daqui para diante terá de gastar menos porque tem menos.
Mas não tinha nada, nem ontem nem hoje: só tinha uma eleição a ganhar, trocou o baralho da contabilidade oficial para continuar gastando a descoberto durante a campanha e conseguiu produzir despesa e recessão ao mesmo tempo. Fez do Brasil um país mais caro e mais pobre. Isso, pelo menos, dá para entender perfeitamente.