Lima, da Vivo: descompasso entre a agressividade comercial e a estrutura da rede
Da Redação
Publicado em 3 de maio de 2011 às 21h02.
Desde que foi criada, em abril de 2003, a Vivo, maior operadora de celulares do país, sempre ocupou uma posição privilegiada no mercado. Fruto da união entre cinco operadoras regionais, a maior parte delas líder em seus respectivos mercados, a empresa já nasceu gigante, um colosso que atualmente conta com faturamento da ordem de 22 bilhões de reais e cerca de 45 milhões de clientes.
Alvo natural do ataque das concorrentes, a Vivo se especializou em estratégias de defesa de mercado, enquanto as demais operadoras se engalfinhavam por pequenos nacos de participação. Agora, pela primeira vez em sua trajetória, a Vivo depara-se com as dificuldades de iniciar uma operação do zero.
Entre outubro e janeiro, a empresa passou a oferecer seus serviços em seis estados do Nordeste (Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas e Piauí). Com isso, seus executivos foram forçados a adotar uma estratégia diferente. Acostumada a se defender das rivais, a Vivo partiu para o ataque.
"Entrar no Nordeste foi a concretização de um sonho", diz Roberto Lima, presidente da empresa. "Queremos a liderança, mas sabemos que ela não virá em um prazo tão curto." A liderança, ao menos por enquanto, está mesmo longe de acontecer. A Vivo permanece como última colocada entre as quatro grandes operadoras que atuam na região. Passados sete meses da estreia, sua participação de mercado é de 2,3%. Na liderança entre os usuários do Nordeste está a Oi, com cerca de 40%.
Até agora, a situação mais delicada é no Ceará e em Pernambuco, os dois maiores mercados da nova região coberta pela operadora. Nesses estados, a Vivo tem participação de mercado na casa dos 3% - bem abaixo do inicialmente previsto pela empresa. Além de constantes problemas de cobertura, sobretudo no serviço 3G, de banda larga, a operadora sofre os efeitos de uma campanha de marketing deflagrada em sua estreia na região, em outubro.
A promoção Fale de Graça, que prometia ligações gratuitas até o final do ano, foi cancelada menos de uma semana após seu lançamento. "A demanda foi muito maior do que esperávamos", afirmou Lima. "Tivemos de suspender a promoção para manter a qualidade do serviço." A justificativa, ainda que compreensível, não impediu um abrupto arrefecimento nas vendas nos meses seguintes.
No Ceará e em Pernambuco, a conquista mensal de novos clientes caiu mais de 90% entre os meses de outubro de 2008 e abril deste ano, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações. (No mesmo período, o mercado cresceu mais de 5%.)
No mercado cearense, a quantidade de cancelamentos superou a de adesões em 1 675 unidades no mês de março, o que fez com que muitos donos de lojas da Vivo cogitassem entrar na Justiça contra a empresa para tentar reaver o prejuízo. "Alguns lojistas realmente ficaram descontentes", diz Lima. "Mas isso é natural em operações que estão iniciando."
A maneira como a Vivo iniciou suas operações no Nordeste pode ser creditada, em larga medida, à urgência por parte da alta cúpula da companhia em inaugurar rapidamente a cobertura na região - e, com isso, tentar estancar a incômoda sangria na participação do mercado nacional. Nos últimos quatro anos, a participação de mercado da Vivo caiu de 34,5% para 29,5%.
A empresa também perdeu a liderança em regiões como Brasília, Minas Gerais e Bahia. A entrada no Nordeste, o mercado de celulares que mais cresce no Brasil, seria, portanto, a maneira encontrada pelos controladores da empresa - a Portugal Telecom e a espanhola Telefónica - de compensar a queda.
A rapidez no lançamento da operação, porém, gerou um descompasso entre a agressividade comercial e a incipiente estrutura de rede montada na região, incapaz de suportar um salto brusco no número de usuários. "A Vivo entrou no Nordeste com a estratégia certa, mas no momento errado", diz um executivo de uma operadora concorrente. "Sua rede ainda não estava preparada."
Os reveses sofridos durante a entrada no Nordeste ocorrem no momento em que a Vivo atravessa uma de suas melhores fases. Depois de transformar o prejuízo de 100 milhões de reais em 2007 no lucro de 390 milhões no ano passado, a Vivo encerrou o primeiro trimestre deste ano como a operadora de telefonia celular mais rentável do Brasil, com uma margem de lucro da ordem de 30%.
A empresa conta atualmente com a base de clientes mais lucrativa - e, portanto, mais disputada - entre as grandes operadoras. E, para espanto de muitos especialistas de mercado, essa base tem crescido em ritmo acelerado. Entre janeiro e abril, a Vivo conquistou, sozinha, um terço dos 500 000 novos assinantes do segmento pós-pago.
Num país em que os planos do tipo pré-pago, mais baratos e com alto índice de migração, ainda reinam absolutos, não é pouca coisa. "Mais importante do que adquirir bons clientes é conseguir mantê-los", diz Lima. "E isso só é possível graças aos investimentos na melhoria da qualidade do serviço." O sucesso da estratégia pode ser medido pelo desempenho da Vivo no mercado de capitais.
A empresa é a única operadora do país cujas ações recebem recomendação de compra no prestigiado Global Wireless Matrix, a bíblia do setor de telecomunicações, elaborado pelo banco Merrill Lynch e que lista as maiores companhias de celular do mundo.
A despeito do bom desempenho da Vivo na bolsa, a recente entrada da empresa no Nordeste tem dividido analistas de mercado e investidores.
Se, por um lado, a operadora finalmente passa a contar com uma cobertura nacional - algo que, até então, era uma desvantagem em relação a seus concorrentes -, por outro, ainda não está claro que tipo de impacto a operação nordestina terá sobre os resultados da companhia no longo prazo.
Isso porque, como última operadora a chegar à região, o custo de aquisição de novos clientes deve ser até três vezes maior em comparação com os mercados em que a Vivo já é líder, o que poderia reduzir sua rentabilidade.
Além disso, no caso do Nordeste, a receita por usuário de celular, principal indicativo da saúde financeira de qualquer operadora, é cerca de um décimo da obtida em São Paulo ou Rio de Janeiro. "Por uma questão socioeconômica, os consumidores do Nordeste são muito suscetíveis a promoções agressivas", afirma um analista de um grande banco.
"A qualidade do serviço, que é o principal atrativo da Vivo no restante do país, acaba ficando em segundo plano." Prova de que, se quiser liderar na região, Roberto Lima terá de afiar - e muito - a sua pontaria.