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Com o grafeno, o Brasil briga pela ponta

Um novo centro de pesquisa em São Paulo vai estudar aplicações para o grafeno — um material com potencial revolucionário. Eis uma iniciativa que o Brasil deve multiplicar

Aguiar Neto (à esq.) e Eunezio de Souza, da Universidade Mackenzie, e Castro Neto, da Universidade de Singapura: cooperação para a pesquisa do grafeno em telecomunicações (Germano Lüders/EXAME.com)

Aguiar Neto (à esq.) e Eunezio de Souza, da Universidade Mackenzie, e Castro Neto, da Universidade de Singapura: cooperação para a pesquisa do grafeno em telecomunicações (Germano Lüders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 1 de maio de 2014 às 09h07.

São Paulo - É raro ver alguma corrida tecnológica mundial em que o Brasil esteja brigando pela ponta, embora seja a sétima economia do planeta. Os números não mentem. O país é o 13º que mais produz artigos científicos, mas o 22º em número de patentes, de acordo com dados da agência federal de fomento Capes e da Organização Mundial de Propriedade Intelectual. O Brasil tem menos invenções que o México e a Ucrânia.

“No meio acadêmico brasileiro, tem valor quem publica muitos artigos em revistas científicas internacionais. Isso não necessariamente se converte em tecnologia aplicada”, diz Benedito Aguiar Neto, reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo. A provocação vem de alguém que está se empenhando em mudar o cenário.

Desde o início de 2012, o Mackenzie se movimenta para criar o primeiro centro de pesquisa brasileiro em um material que pode mudar o mundo: o grafeno. Com base no carbono, a substância oferece características físicas — como resistência, maleabilidade e capacidade de conduzir energia — com potencial de revolucionar uma gama de produtos que vai de tablets a aviões. 

Já estão sendo feitas as fundações de um prédio de seis andares no centro de São Paulo que será totalmente voltado para o estudo desse cristal. A rapidez impressiona. Desde a tomada da decisão, decorreu menos de um ano para o começo da obra do chamado Mackgrafe. O investimento é de 26 milhões de reais.

Um terço vem da Fapesp, agência de fomento à pesquisa do estado de São Paulo, que aprovou o projeto em sete meses, quando investimentos do gênero costumam enroscar por anos na burocracia. A pressa tem motivo. A expectativa é que em cinco anos o Mackgrafe seja capaz de apresentar equipamentos que multipliquem por 100 a velocidade das fibras ópticas.

Isso pode posicionar o Brasil na vanguarda da aplicação do grafeno em telecomunicações. Há poucas universidades no mundo com estudos semelhantes — uma delas é a britânica Cambridge, que também ainda está construindo seu centro de pesquisa. “Ou pegávamos esse bonde agora, ou íamos ficar para trás”, afirma Eunezio de Souza, físico que dirige o Mackgrafe. 

Cristal milagroso

A história do grafeno começou com Andre Geim e Konstantin Novoselov, cientistas russos da Universidade de Manchester, no Reino Unido. Em 2004, eles estudavam as camadas de carbono que formam o grafite e descobriram que, usando uma fita adesiva, conseguiriam tirar uma lâmina da espessura de um átomo. Eis o grafeno, o material mais fino do planeta. Seis anos depois, eles ganharam o prêmio Nobel de Física. O grafeno é o melhor condutor de eletricidade já descoberto.


Poderá substituir o silício na composição de chips. Também permitirá a fabricação de telas incrivelmente finas, maleáveis e resistentes. A Samsung já tem 407 patentes relacionadas ao cristal milagroso. A IBM, quase 150. “A produção de grafeno de qualidade em larga escala é um desafio, mas trará retornos financeiros substanciais, principalmente quando for aplicado em indústrias mais complexas, como a eletrônica, a aeroespacial e a de biotecnologia”, diz Quentin Tannock, presidente da CambridgeIP, consultoria britânica em novas tecnologias.

Já existem dezenas de centros de estudo do grafeno no mundo. Em janeiro, a União Europeia anunciou uma verba de 1 bilhão de euros para os núcleos de pesquisa do material no continente. “A maioria dos países começou a desenvolver pesquisas aplicadas agora”, diz o Nobel Konstantin Novoselov. “Não é tarde para o Brasil entrar na corrida.”

Mas alguns países já estão bem à frente, como é o caso da Coreia do Sul, cujo governo liberou 200 milhões de dólares para o estudo do grafeno em 2012 e ainda conta com a Samsung bancando pesquisas em uma universidade local. Os coreanos já detêm quase 1 800 patentes na área. “Não é surpresa. A Coreia é um país orientado para a tecnologia”, afirma Novoselov. 

O Centro de Pesquisa em Grafeno da Universidade Nacional de Singapura também é uma referência. Ele é dirigido por Antonio Castro Neto, brasileiro que estudou grafeno junto com os vencedores do Nobel. Castro Neto cursou física na Unicamp com Eunezio de Souza, do Mackenzie. As trocas acadêmicas de 20 anos entre os dois amigos culminaram, em janeiro de 2012, na assinatura de um convênio de cooperação entre o Mackenzie e a Universidade de Singapura. Souza levou o reitor do ­Mackenzie ao pequeno país para convencê-lo a ceder 100 metros quadrados para o estudo do grafeno.

Acabou ganhando apoio para fazer um centro com 6 500 metros quadrados e equipa­mentos sofisticados. A inauguração do Mack­grafe está prevista para maio de 2014, mas já há 30 pesquisadores trabalhando com o tema no Mackenzie. Mais 12 professores e bolsistas estão sendo recrutados por meio de anúncios nas revistas científicas Nature e Science.

Pode até ser que o Mackgrafe não revolucione a ciência brasileira, mas a multiplicação de iniciativas como essa, com foco prático e visão de longo prazo, seria bem-vinda para fazer do Brasil, nas palavras do Nobel Novoselov, “um país orientado para a tecnologia”.

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