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Longe da química, espumantes orgânicos são nova tendência

Após o modismo dos vinhos orgânicos, biodinâmicos e naturais, chega a vez dos espumantes elaborados quase sem intervenção humana

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Vinícola Vivente, na Serra Gaúcha: produção de espumantes pét-nats já esgotada (Marcelo Curia/Divulgação)

Vinícola Vivente, na Serra Gaúcha: produção de espumantes pét-nats já esgotada (Marcelo Curia/Divulgação)

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Daniel Salles

Publicado em 22 de outubro de 2020, 05h25.

Última atualização em 27 de outubro de 2020, 14h33.

Não chega a ser uma polarização radical. Mas a voltagem das maledicências desferidas de lado a lado é alta. De um lado, os entusiastas dos vinhos naturais, orgânicos e biodinâmicos, que, em conjunto, passaram a fazer sucesso de uns anos para cá. Do outro, os defensores dos demais rótulos, que, via de regra, o primeiro grupo não engole, tachando-os de químicos. Alguns dos termos usados no contra-ataque para descrever os fãs de naturais: hippies, novos enochatos e bebedores de vinhos ruins. Cansaço? Estafa? Burnout? Faça da pandemia uma oportunidade de reset mental

No Brasil, um dos líderes do primeiro grupo é o enólogo gaúcho Luís Henrique Zanini. Que, a bem da verdade, não se diz líder de nada e está mais para um moderado. Em 2004, ele fundou na Serra Gaúcha, em parceria com outro enólogo, Álvaro ­Escher, também gaúcho, a vinícola Era dos Ventos. Dela brotou, em 2008, o cultuado Peverella, o primeiro vinho laranja nacional de que se tem notícia — uma garrafa da safra 2017, a mais recente, custa 290 reais.

A elaboração do vinho laranja remonta a uns 5.000 anos. É fruto do mais rudimentar dos métodos, segundo o qual, grosso modo, basta esmagar as uvas brancas, com casca e tudo, aguardar a fermentação e coar em seguida. Daí a coloração alaranjada — um chardonnay tem a cor que tem principalmente porque a casca é descartada. Empregado pelos primeiros colonos da Serra Gaúcha, o antigo método, válido também para uvas tintas, foi resgatado por Zanini e ­Escher como um experimento.

Deu certo, e a Era dos Ventos virou um dos principais representantes no Brasil dos vinhos naturais. Também chamados de vivos, são aqueles produzidos com o mínimo de interferência. Estão vetados a clarificação e o uso de agrotóxicos, embora uma pequena adição de sulfito, que combate a oxidação e favorece o transporte da bebida, seja tolerada. Privilegiam-se leveduras selvagens e castas fora do óbvio, caso da peverella.

“Somos uma alternativa à padronização imposta pela indústria, que costuma produzir vinhos com as mesmíssimas características em qualquer país”, diz Zanini. Mas pondera: “Os naturais têm características diferentes e essa é a maior vantagem deles, mas não podem ser sinônimo de vinagre”.

Com uma produção anual de 5.000 garrafas, a vinícola também aposta nos espumantes elaborados com quase nenhuma intervenção humana — eis os novos queridinhos de quem torce o nariz para os industrializados. Dessa categoria, produz em linha o espumante Peverella, vendido por 256,50 reais a garrafa. Quase sem intervenção não significa falta de trabalho. Sua base é a mistura do Peverella tradicional com uvas do mesmo tipo (desidratadas e maceradas). Na sequência, recorre-se ao método champenoise, no qual uma segunda fermentação ocorre dentro das garrafas e ao longo de dois anos.

A Era dos Ventos também produz, por ora para consumo próprio, os ­pétillants naturels, ou pét-nats, que viraram febre mundo afora. Trata-se de espumantes elaborados com apenas uma fermentação, concluída dentro das garrafas, num processo que pode se encerrar em apenas dois meses. “Em resumo, é um caminho que tira o enólogo do controle, pois impede qualquer correção”, explica Zanini. “Dá origem a vinhos fáceis de beber, mas também sem a complexidade oriunda da segunda fermentação.” O gaúcho Diego Cartier, um dos sócios da vinícola Vivente, emenda: “O gás dos pét-nats é muito mais sutil”.

A Vivente funciona desde 2018 na Serra Gaúcha. Ex-beer hunter de clubes de cerveja, Cartier fez parceria com o também gaúcho Micael Eckert, um dos fundadores da cervejaria Coruja, de Santa Catarina. “Os vinhos convencionais oferecem menos riscos aos produtores e atendem ao que o público está acostumado, enquanto os naturais estão livres de padronização e expressam as diferenças de cada safra”, defende o primeiro.

Dos 25 rótulos produzidos até aqui, 12 são pét-nats, que custam cerca de 120 reais e estão à venda em restaurantes como o paulistano Corrutela e o carioca Oteque. O aumento da produção da Vivente espelha o sucesso dos espumantes desse tipo. Neste ano foram 17.000 garrafas, o dobro de 2019, e todo o estoque já se esgotou.


A FESTA DOS NATUREBAS

Feira de vinhos naturais, orgânicos e biodinâmicos acontece em novembro

Feira de vinhos naturais, orgânicos e biodinâmicos acontece em novembro (Divulgação/Divulgação)

Situada na Vila Nova Conceição, em São Paulo, a Enoteca Saint VinSaint abriu as portas em 2008 determinada a difundir os vinhos naturais, orgânicos e biodinâmicos. “Fui chamada de louca e excluída do mundo do vinho por uma década”, exagera Lis Cereja, a dona. Hoje ela colhe os frutos por ter apostado em rótulos que caíram na moda. “O crescimento foi meteórico, e agora me levam a sério.”

Criada por ela em 2013, a feira Naturebas, que congrega produtores de vinhos não industrializados e entusiastas, chega à oitava edição com cerca de 300 vinicultores. De 1º a 30 de novembro, envolverá atividades online e presenciais (confira a programação em feiranaturebas.com.br). Para quem vai provar um vinho não industrializado pela primeira vez, Lis deixa o seguinte conselho: “Se você só tomou suco de laranja de caixinha, vai estranhar, de início, o sabor da fruta ao natural. Mas logo se convencerá de que esta é muito melhor.”

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