Investidora Monique Evelle: “Eu invisto no que gera comportamento. Comportamento vira recompra. Recompra vira caixa” (Leandro Fonseca /Exame)
Repórter de Negócios
Publicado em 22 de dezembro de 2025 às 09h00.
Monique Evelle sempre esteve em cena. O que ela nunca fez foi seguir o roteiro.
Aos 14 anos, pediu demissão do primeiro emprego. Aos 16, decidiu que não enviaria mais currículo. Anos depois, recusou contratos grandes porque não conseguiria dormir em paz.
Em um mercado que confunde visibilidade com sucesso, ela construiu a própria carreira impondo método — inclusive quando o palco cresce.
Hoje, aos 31 anos, a investidora baiana acaba de entrar no capital da Ummix Ads, uma media tech que tenta resolver um problema antigo da publicidade tradicional: medir se rádio, TV e mídia exterior realmente convertem.
Monique comprou 5% da empresa, avaliada em 5 milhões de reais.
A escolha ajuda a explicar a tese que Monique construiu longe do improviso. Ela investe pouco, acompanha de perto e cobra operação. O dinheiro entra depois do entendimento. “Eu prefiro ser cliente primeiro para depois virar investidora”, afirma.
Essa lógica não surgiu agora. É resultado de uma trajetória marcada por inconformismo, cortes duros e decisões que custaram capital, mas preservaram controle.
“Eu entendi cedo que não funcionava em ambientes que não me deixavam fazer melhor”, diz.
O próximo passo dessa história ainda não está nos negócios. Está na cultura. E, se tudo sair como ela planeja, começa no carnaval de Salvador de 2026.
Monique cresceu na periferia de Salvador e entrou cedo no mercado de trabalho como jovem aprendiz. Ficou três meses.
Não por falta de oportunidade, mas por excesso de limites.
“Me colocaram para organizar arquivo em ordem alfabética, cheio de poeira. Eu falei: eu consigo fazer mais do que isso”, afirma.
Ela pediu para mudar de área. Tentou contabilidade. Depois, fiscal-financeiro. Nada encaixava. “Eu tinha 14 anos e já entendia que aquilo não fazia sentido para mim”, diz. A saída veio depois de uma conversa com a direção e os pais. Monique pediu demissão. E saiu.
Aos 16, no colégio estadual, criou um grêmio estudantil. Ganhou a eleição no último ano do ensino médio. O mandato terminou rápido, mas deixou um aprendizado duradouro.
“Eu entendi que era legal criar alguma coisa. Criar, independente do que fosse”, afirma.
Ela não sabia o que era empreendedorismo. Não falava em empresa, lucro ou tese. Queria resolver problemas próximos. Primeiro na escola. Depois, na faculdade. “Eu achava que estava mudando o mundo. Se tivesse dinheiro, beleza. Depois você entende que não é bem assim”, diz.
A ideia inicial virou o Desabafo Social, projeto que misturava educação, direitos humanos e consultoria. O nome chamava atenção. A execução, nem sempre. “A narrativa era linda para a mídia, mas a empresa não parava de pé”, afirma. O mercado via ONG. O CAC subia. O negócio travava.
Foi quando Monique tomou uma decisão difícil: matar a marca que a apresentava melhor, para salvar o que realmente funcionava. “Eu tive que me afastar desse lugar do ativismo, senão não conseguiria fazer a empresa funcionar”, diz.
A virada veio com uma mudança simples e estratégica: trocar o nome. O Desabafo Social deu lugar à Evelle Consultoria. O serviço era o mesmo. A percepção, não. “Mudou o nome e as pessoas passaram a entender que era um negócio”, afirma.
O aprendizado foi incorporado como regra. Em 2020, ela funda a Inventivos, focada em educação empreendedora e investimento. Primeiro, prepara. Depois, investe.
“Os empreendedores sempre acham que estão prontos. Quando você vai ver, ainda estão na validação”, diz.
A lógica ganhou ainda mais rigidez com o tempo. Monique passou a dizer mais “não” do que “sim”. E a demitir empresas do portfólio quando o brilho começava a atrapalhar. “O holofote cega. As pessoas se empolgam e esquecem da operação”, afirma.
Ela viu empreendedores confundirem exposição com progresso. Outros transformarem investimento em suporte emocional. “Durante seis meses, toda reunião era sobre a vida da pessoa. Nunca sobre a empresa”, diz. Não durou.
A régua ficou clara: negócio vem antes de narrativa. “Eu entendo a dor. Mas isso não pode ser a relação de negócio”, afirma. Em alguns casos, a exigência foi literal. “Já coloquei em cláusula que o empreendedor precisava fazer terapia. Porque não vai aguentar”, diz.
Não se trata de frieza. É método. “Se você está lidando com milhões que nunca viu na vida, isso dói. Eu entendo, porque eu sou essa pessoa. Mas é negócio”, afirma.
A exposição não foi um acidente de percurso. Foi escolha. Primeiro na televisão, como repórter do programa Profissão Repórter, da TV Globo.
Depois, no Shark Tank Brasil. Monique entrou no programa aos 28 anos impondo uma condição básica: fazer ali exatamente o mesmo trabalho que já fazia fora das câmeras. “Eu não vou performar uma mentira”, diz.
No programa, recusou o papel de personagem midiática. Fez diligência, estudou negócios, comprou briga quando fazia sentido. “Ali não é brincadeira. É negócio”, afirma.
Quando foi convidada para participar, sabia o que enfrentaria. “Não crítica construtiva. Racismo”, diz.
Monique recebe críticas por parte dos telespectadores de ficar fora de investimentos. Em uma única temporada, porém, investiu em sete negócios.
A melhor decisão foi não ler comentários. E mais do que isso: não mudar o comportamento. “Não importa se eu investir dez milhões, cem milhões ou nada. Vai ser a mesma coisa. Então eu vou continuar fazendo meu trabalho”, afirma.
A postura virou marca. Alguns empreendedores demoraram a procurá-la. Outros chegaram depois de estudar suas entrevistas e falas públicas. “Você foi pela linha de pensamento. Que é a primeira coisa para dar match”, diz.
O critério central segue o mesmo: comportamento. “Eu invisto no que gera comportamento. Comportamento vira recompra. Recompra vira caixa”, afirma. É assim com água energética, palha italiana sem açúcar, telemedicina, logística e, agora, mídia.
A entrada na Ummix Ads segue essa lógica.
A empresa usa dados e métricas para medir a eficiência da publicidade offline, aplicando à rádio e TV a lógica do digital. Para Monique, o ponto não é tecnologia. É precisão. “Matemática não é opinião”, diz.
Ela viu ali uma forma de tirar dinheiro das big techs e devolver eficiência ao mercado local. “Por mais que você queira a rádio número 1, às vezes seu público está na número 4. O resto é ego”, afirma.
O modelo chamou atenção porque resolve uma dor antiga: saber se a verba converte. “Quem tem 10 mil reais consegue ver conversão em 30 dias. Depois coloca 100. E a mídia fica feliz também”, diz.
É mais um investimento acompanhado de perto, dentro de um ecossistema que se retroalimenta. “Quem ficou no portfólio ficou porque gera hábito. Fora isso, a galera brinca de faturamento”, afirma.
O futuro da Monique investidora passa menos por startups e mais por vocação. Cultura e entretenimento entraram no radar. Não como tendência. Como comportamento. “Cultura salva pessoas”, diz.
Ela já ensaia os primeiros movimentos. O spoiler está dado: carnaval de Salvador, em 2026. “Talvez eu comece por aí”, diz, rindo. O formato ainda não está fechado. O propósito, sim.
Não é uma guinada romântica. É coerente. “Tudo que está no meu portfólio gera comportamento. Cultura também gera”, afirma.
Monique Evelle segue em cena. Mas sem jamais confundir palco com método.
Assista ao Choque de Gestão, programa da EXAME com Monique Evelle