Robson Galvão, da Gummy Hair: gasto de 3.000 reais na contratação da primeira influenciadora deu retorno de mais de 120.000 reais em vendas (Divulgação/Divulgação)
Editor de Negócios e Carreira
Publicado em 25 de março de 2024 às 13h37.
Última atualização em 25 de março de 2024 às 22h57.
Em 27 de fevereiro, as manchetes de tablóides nos Estados Unidos e na Inglaterra foram tomadas pelo roubo de uma carga avaliada em 4 milhões de dólares de um caminhão que rodava numa autoestrada nos arredores de Los Angeles.
O veículo estava carregado de unidades do Lemme Burn, um suplemento de vitaminas criado pela mega influenciadora digital Kourtney Kardashian. Até agora a polícia da Califórnia não tem notícia do paradeiro dos produtos, que prometem acelerar o metabolismo e ajudar na perda de peso.
Desde o início das vendas, em setembro de 2022, a linha de vitaminas patrocinada por Kourtney é um sucesso. Ao contrário das vitaminas tradicionais, em formato de cápsulas de remédio, os produtos da Lemme parecem balas de goma, com gosto adocicado e feitas para serem mastigadas. Elas chamaram tanto a atenção nas redes sociais a ponto de estabelecer uma nova categoria de vitamínicos: os gummies.
Os mais de 20 gummies da Lemme servem para propósitos distintos como melhorar a qualidade do sono, promover o crescimento de cabelo e unhas, acelerar o metabolismo e até mesmo equilibrar a flora bacteriana da vagina para evitar doenças ou odores na região.
Impulsionada pela popularidade de Kourtney (são 224 milhões de seguidores só no Instagram), a venda dos produtos colaborou para a celebridade ter uma riqueza estimada em 65 milhões de dólares em 2023, segundo reportagem do The Sun.
O alvoroço gerado pela empresa da Kardashian é acompanhado de perto pelo empreendedor recifense Robson Galvão. Ele é fundador da Gummy, uma empresa de suplementos vitamínicos em formato de balas cuja proposta de valor segue muito do visto na empresa da celebridade americana.
No site da Gummy também é possível encontrar vitamínicos com serventias muito parecidas com as da Lemme. Está com problema de queda de cabelo ou unhas fracas? Há ali uma balinha para você. O sono está irregular? Um gummy de melatonina está à disposição. Quer fortalecer a pele? Uma pastilha de goma à base de vinagre de maçã promete dar um up no colágeno natural do corpo.
Aberta em 2018, na garagem de um imóvel emprestado, a Gummy Hair espera receitas de 150 milhões de reais neste ano. No embalo do sucesso online dos gummies, a meta para o ano que vem é dobrar a meta e chegar a um faturamento de 300 milhões de reais.
O otimismo por trás da expansão da Gummy Hair tem muito a ver com o empurrão dado pela entrada da Kardashian no segmento. Isso posto, há outros sinais de um apetite crescente dos consumidores pelas balinhas com alguma finalidade terapêutica.
O mercado dos gummies passou por uma revolução na última década nos Estados Unidos, onde está o berço desta indústria. Por quase 100 anos, a farmacêuticas americanas fizeram vitaminas em formato de gomas para atender a uma demanda de mães e pais às voltas com a dificuldade de convencer filhos pequenos a tomar remédios.
Em 2012, a Perrigo, uma fabricante de vitaminas sediada na Irlanda, foi pioneira na montagem de campanhas publicitárias de gummies para adultos dos Estados Unidos, de acordo com reportagem do New York Times. De lá para cá, concorrentes aderiram à ideia. As vendas globais com os gummies chegaram a 20 bilhões de dólares no mundo em 2023.
Desse total, 66% vieram de produtos voltados para o público adulto, de acordo com a consultoria Global Market Insights. Uma passada rápida numa varejista focada em produtos com apelo saudável, como a americana Whole Foods, indicará gôndolas e mais gôndolas de gummies para adultos.
Para as farmacêuticas e empresas de produtos naturais, é uma forma excelente de aumentar o tíquete das vendas. As balinhas em goma costumam ser vendidas a um preço bem acima de um remédio convencional.
Um pote com 30 unidades de vitamina C da Gummy, em formato de bala, custa 99 reais. As mesmas 30 unidades de vitamina C em cápsulas são vendidas por concorrentes na faixa de 30 reais, em média, na internet.
O preço mais elevado não deve arrefecer o interesse nos gummies. Pelos próximos oito anos, o mercado deverá crescer 10% ao ano e chegar a 51 bilhões de dólares em 2032. Boa parte da expansão deve vir de mercados emergentes, como o Brasil. Não à toa, em maio do ano passado, a gigante Nestlé anunciou a compra da Puravida, um player importante no mercado de gummies no Brasil, por um valor não divulgado.
Galvão tinha pouca dimensão disso tudo ao abrir a Gummy Hair, há seis anos. Na ocasião, ele já tinha interesse no marketing de influência. Na lista de celebridades que acompanhava estavam as irmãs Kardashian que, então, já faziam publi de outras marcas de gummies.
"Elas falavam de gominhas em formato de ursinho com muitas vitaminas na composição", diz Galvão. "Era uma febre nas redes sociais e, por isso, coloquei na cabeça que a ideia poderia funcionar no Brasil."
Com 32 anos, Galvão já tem uma trajetória empreendedora bem calejada. Na escola, ele vendia aos colegas lanches e outras guloseimas compradas em armazéns dos arredores. Em meio aos problemas financeiros da família, chegou a vender camarões em semáforos do Recife para complementar a renda em casa.
Após formar-se em marketing, fazer intercâmbio na Nova Zelândia e virar trainee de multinacionais, Galvão começou a revender produtos vitamínicos comprados para uso pessoal por volta dos 20 anos de idade.
"Foi quando percebi o valor de ter a minha própria marca desse tipo de suplementos", diz ele, que no início investiu na venda direta ao consumidor pela internet, num modelo conhecido pela sigla em inglês DNVB (Digitally Native Vertical Brand ou Marca Vertical Digitalmente Nativa). Ele inclusive virou um garoto-propaganda do DNVB no país, dando aulas e imersões sobre o tema para outras empresas com interesse no tema.
Como parte do foco digital do negócio, o empreendedor foi pioneiro na contratação de influenciadores digitais para o marketing dos produtos. "Esse foi um diferencial para o sucesso da marca", diz ele. "O primeiro investimento, de 3.000 reais numa influenciadora, deu retorno de mais de 120.000 reais em vendas."
Até hoje a Gummy faz propagandas com celebridades como Deborah Secco, Tatá Estaniecki, Luciana Gimenez, Bruna Gonçalves, Gabi Brandt, Andressa Suita, MC Loma, Flavia Pavanelli, Kelly Key e Larissa Manoela.
Olhando para o futuro, Galvão quer ampliar as frentes de negócio da Gummy. O número de produtos deve saltar de 18 para 40 até o fim do ano. No forno estão cosméticos também com propriedades terapêuticas. Em paralelo, quer ampliar os canais de venda da Gummy.
De uns tempos para cá, é possível encontrar as pastilhas em goma em 17.000 pontos de venda físico pelo país, em geral, lojas de produtos naturais ou de suplementos para praticantes de atividades físicas. O plano é chegar a 40.000 lojas ainda neste ano.
Os planos ousados precisarão vencer as resistências crescentes aos gummies. Médicos e nutricionistas cada vez mais têm sido vocais aos potenciais efeitos nocivos do consumo desses produtos, muitos deles com teor elevado de açúcares. O fato de serem saborosos pode induzir a uma tomada exagerada (e perigosa) dessas vitaminas, dizem os especialistas.
Numa forma de contornar os desafios, Galvão planeja investir em gominhas zero açúcar em 2024. Até o fim do ano que vem, o sonho do empreendedor é ver seu negócio valer 1 bilhão de reais. "Nós queremos ser a marca mais desejada quando uma mulher pensa em produtos de saúde e beleza no varejo, assim como fizemos com a Gummy Hair", diz ele.
A julgar pelo alvoroço causado pelos produtos de sua concorrente do clã Kardashian, uma meta tão alta assim está longe de ser só um sonho doce.