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Um terço de mulheres do Quênia foi ou será vítima de estupro

De acordo com um estudo, um terço das menores quenianas terá sido o objeto de alguma violência sexual antes dos 18 anos

Mulheres carregam baldes com água na cabeça em meio a um cenário de seca e abandono em Turkana, no Quênia (Simon Maina/AFP)
DR

Da Redação

Publicado em 17 de agosto de 2013 às 11h24.

Nairóbi - Ser mulher no Quênia significa ter mais de 30% de possibilidade de sofrer algum tipo de abuso sexual durante a infância e adolescência, uma estatística assustadora que bate frontalmente com o pouco apoio recebido pelas vítimas.

De acordo com um estudo realizado pelo governo do Quênia, em parceria com a ONU, um terço das menores quenianas terá sido o objeto de alguma violência sexual antes de completar 18 anos.

Este número é bem conhecido pelo Centro de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual que a ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) opera no bairro de periferia de Kibera, em Nairóbi, uma das maiores cidades da África.

Estima-se que em torno de 25% das pessoas que buscam ajuda são meninas menores de 12 anos.

Zaina Ahamed, queniana de 46 anos e uma das responsáveis pelo programa da MSF, conta que as menores são estupradas ou agredidas por pessoas de seu círculo, como vizinhos, conhecidos, membros da família, e até mesmo seus pais.

'Aos menores temos que dar ainda mais apoio que o normal, porque às vezes os estupradores são os próprios pais, e por isso temos que ter certeza que seu núcleo familiar é seguro', explica Zaina na porta do centro, que fica em uma das caóticas e empoeiradas ruas de Kibera.

Zaina diz ser muito comum serem os pais os violentadores, os vizinhos, e que normalmente a comunidade costuma ficar contra a vítima, a quem culpam por mentir ou criar uma má reputação para o bairro.

'As vítimas vêm aqui porque não recebem nenhum tipo de apoio da comunidade. É preciso ser muito forte para sobreviver a um caso assim', ressalta.

O caso mais marcante para Zaina é o de uma menina de 12 anos que foi estuprada por um vizinho.

'A menina demorou uma semana em contar à família que tinha sido violentada pelo vizinho. Quando a irmã foi enfrentar o estuprador, ele negou veementemente, mas uma hora depois se suicidou', contou.

Longe de receber o apoio do resto das pessoas da comunidade, a menina foi acusada de ser a responsável pela morte do morador.

'Tal foi o assédio para ela, que teve que se mudar', relata Zina, com a naturalidade de quem viu centenas de casos similares.

Mas não são só as meninas que contam com uma rede de apoio praticamente inexistente. As mulheres, já adultas, também sofrem a mesma rejeição.

Segundo Ahamed, muitas mulheres que contam ao marido terem sido estupradas são expulsas de seus lares ou acusadas de serem mentirosas.

'Muitos homens acusam suas esposas de mentirosas, de dizer que foram agredidas sexualmente quando na realidade se tratava relação consentida', declara a funcionária da MSF.

A causa do estigma e da rejeição que vem com a violência sexual, a pouca confiança que os quenianos têm em sua polícia e em seu sistema judiciário, fazem com que a maioria dos estupros nem sequer sejam denunciados, apesar da legislação impor penas duras aos estupradores.

Apesar disso, Helen Achieng, de 49 que mora em Kibera, denunciou às autoridades ter sido violentada, mas sem resultado. Ela vive nesta cidade há mais de 18 anos, depois da morte de seu marido, que, Helen suspeita ter morrido de Aids.

Infectada pelo vírus, Helen foi estuprada numa noite quando voltava com um grupo de amigos de um ato para arrecadar dinheiro para o funeral de uma amiga. A caminho de casa ela encontrou um grupo de homens armados que a levaram, junto com outra amiga, a uma floresta. Ali foi violentada por quatro homens diferentes durante mais de três horas.

Os estupradores nunca foram detidos nem processados, apesar de Helen ter buscado ajuda no centro da MSF e denunciado a violência.

Além da incompetência das autoridades, Helen está cansada do pouco apoio e compreensão que recebeu dos vizinhos com quem conviveu por duas décadas.

'Os vizinhos que sabem do estupro dizem muitas coisas estúpidas. Alguns perguntam porque andava pela rua, que talvez estivesse procurando pelo que me aconteceu', explica com amargura.

'Dizem que mudei, que fiquei sombria, que estou com o pavio curto e que estou mais magra', acrescenta.

Até seu filho mais velho pediu que não denunciasse os estupradores, que não continuasse investigando a identidade de seus agressores, como se assim fosse possível esquecer aquela noite. ''Aconteceu e ponto. Agora é preciso esquecer', dizia meu filho'.

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Nairóbi - Ser mulher no Quênia significa ter mais de 30% de possibilidade de sofrer algum tipo de abuso sexual durante a infância e adolescência, uma estatística assustadora que bate frontalmente com o pouco apoio recebido pelas vítimas.

De acordo com um estudo realizado pelo governo do Quênia, em parceria com a ONU, um terço das menores quenianas terá sido o objeto de alguma violência sexual antes de completar 18 anos.

Este número é bem conhecido pelo Centro de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual que a ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) opera no bairro de periferia de Kibera, em Nairóbi, uma das maiores cidades da África.

Estima-se que em torno de 25% das pessoas que buscam ajuda são meninas menores de 12 anos.

Zaina Ahamed, queniana de 46 anos e uma das responsáveis pelo programa da MSF, conta que as menores são estupradas ou agredidas por pessoas de seu círculo, como vizinhos, conhecidos, membros da família, e até mesmo seus pais.

'Aos menores temos que dar ainda mais apoio que o normal, porque às vezes os estupradores são os próprios pais, e por isso temos que ter certeza que seu núcleo familiar é seguro', explica Zaina na porta do centro, que fica em uma das caóticas e empoeiradas ruas de Kibera.

Zaina diz ser muito comum serem os pais os violentadores, os vizinhos, e que normalmente a comunidade costuma ficar contra a vítima, a quem culpam por mentir ou criar uma má reputação para o bairro.

'As vítimas vêm aqui porque não recebem nenhum tipo de apoio da comunidade. É preciso ser muito forte para sobreviver a um caso assim', ressalta.

O caso mais marcante para Zaina é o de uma menina de 12 anos que foi estuprada por um vizinho.

'A menina demorou uma semana em contar à família que tinha sido violentada pelo vizinho. Quando a irmã foi enfrentar o estuprador, ele negou veementemente, mas uma hora depois se suicidou', contou.

Longe de receber o apoio do resto das pessoas da comunidade, a menina foi acusada de ser a responsável pela morte do morador.

'Tal foi o assédio para ela, que teve que se mudar', relata Zina, com a naturalidade de quem viu centenas de casos similares.

Mas não são só as meninas que contam com uma rede de apoio praticamente inexistente. As mulheres, já adultas, também sofrem a mesma rejeição.

Segundo Ahamed, muitas mulheres que contam ao marido terem sido estupradas são expulsas de seus lares ou acusadas de serem mentirosas.

'Muitos homens acusam suas esposas de mentirosas, de dizer que foram agredidas sexualmente quando na realidade se tratava relação consentida', declara a funcionária da MSF.

A causa do estigma e da rejeição que vem com a violência sexual, a pouca confiança que os quenianos têm em sua polícia e em seu sistema judiciário, fazem com que a maioria dos estupros nem sequer sejam denunciados, apesar da legislação impor penas duras aos estupradores.

Apesar disso, Helen Achieng, de 49 que mora em Kibera, denunciou às autoridades ter sido violentada, mas sem resultado. Ela vive nesta cidade há mais de 18 anos, depois da morte de seu marido, que, Helen suspeita ter morrido de Aids.

Infectada pelo vírus, Helen foi estuprada numa noite quando voltava com um grupo de amigos de um ato para arrecadar dinheiro para o funeral de uma amiga. A caminho de casa ela encontrou um grupo de homens armados que a levaram, junto com outra amiga, a uma floresta. Ali foi violentada por quatro homens diferentes durante mais de três horas.

Os estupradores nunca foram detidos nem processados, apesar de Helen ter buscado ajuda no centro da MSF e denunciado a violência.

Além da incompetência das autoridades, Helen está cansada do pouco apoio e compreensão que recebeu dos vizinhos com quem conviveu por duas décadas.

'Os vizinhos que sabem do estupro dizem muitas coisas estúpidas. Alguns perguntam porque andava pela rua, que talvez estivesse procurando pelo que me aconteceu', explica com amargura.

'Dizem que mudei, que fiquei sombria, que estou com o pavio curto e que estou mais magra', acrescenta.

Até seu filho mais velho pediu que não denunciasse os estupradores, que não continuasse investigando a identidade de seus agressores, como se assim fosse possível esquecer aquela noite. ''Aconteceu e ponto. Agora é preciso esquecer', dizia meu filho'.

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