O presidente russo, Vladimir Putin, com o premiê indiano Narendra Modi, na chegada do líder da Rússia em Nova Déli, em 4 de dezembro (Grigory Sysoyev/AFP)
Repórter
Publicado em 4 de dezembro de 2025 às 16h01.
Líderes e analistas observam o encontro entre o presidente russo Vladimir Putin e o primeiro-ministro indiano Narendra Modi, na Índia, que começa nesta quinta-feira, 4. Ambos disseram que a Rússia e a Índia gostariam de impulsionar o comércio entre os países e expandir a variedade de itens disponíveis nas transações, segundo reportagem de Reuters.
A visita durará dois dias, durante os quais os países buscarão debater meios de fortalecer sua independência econômica e geopolítica.
A Índia busca saídas para lidar com as altas tarifas impostas por Washington devido ao seu comércio com a Rússia durante a guerra da Ucrânia, durante a qual se aproveitou dos baixos preços para importar bens russos. Washington considera que este comércio financia a guerra de Putin.
A Rússia, por sua vez, vê na Índia um fértil mercado que marca as relações entre os países desde os tempos da União Soviética. As boas relações mesmo apesar da guerra também são um indicativo à Europa e aos EUA que a Rússia não está totalmente isolada no cenário internacional, demonstrando que os esforços de isolação dos blocos falharam, segundo a BBC.
Aparna Pande, diretora da iniciativa sobre Índia e Ásia do Sul no Hudson Institute, think tank baseado em Washington DC, diz ao The Guardian: “Do ponto de vista indiano – apesar de toda a conversa sobre a Rússia ser uma grande e leal amiga – a verdadeira razão pela qual essa relação é importante é a geografia. A China continua sendo a maior ameaça para a Índia num futuro próximo e, desde a União Soviética, a Índia sempre contou com a Rússia como um contrapeso continental contra a China.”
Em um estudo publicado pelo instituto em outubro, Pande detalha que estaria no interesse indiano manter Moscou fora da órbita de Pequim. Também é por isso que continua sendo parceiro econômico vital da Rússia, apesar de sanções no ocidente e da guerra na Ucrânia.
“Para que a Rússia sirva como o contrapeso continental que a Índia almeja, ela não pode se tornar uma potência regional dependente da China, incapaz de projetar influência de maneiras que se alinhem aos interesses indianos,” escreve Pande no estudo. “Ainda assim, a Índia mantém laços estreitos com a Rússia e é sua parceira no Brics, na OCS e no G20. Nova Déli vê isso como um passo estratégico para conter o domínio chinês nesses grupos e se esforça para manter seus próprios interesses no radar de Moscou.”
Nesta quinta, Putin afirmou que as negociações com os Estados Unidos sobre a Ucrânia são "complexas", mas que é necessário "participar" delas e não obstruir os esforços, segundo uma entrevista divulgada nesta quinta-feira (4) por uma televisão indiana.
"É uma tarefa complexa e uma missão difícil que o presidente [Donald] Trump assumiu", disse Putin em declarações traduzidas pela India Today.
"Alcançar o consenso entre as partes em conflito não é uma tarefa fácil, mas acredito que o presidente Trump está tentando sinceramente", acrescentou. "Acho que devemos participar desse esforço em vez de obstruir" as conversas, continuou.
Na véspera da chegada de Putin, um artigo de opinião escrito em conjunto pelos embaixadores da Alemanha, França, e Reino Unido para a Índia, com o título de “A Rússia não parece levar a paz a sério”, foi publicado no jornal Times of India, onde foi detalhada a destruição que a Rússia vem causado na Ucrânia ao longo dos anos de conflito, e as ações de Putin foram condenadas.
“Todos os dias testemunhamos novos ataques indiscriminados da Rússia nesta guerra ilegal, visando infraestrutura civil, destruindo casas, hospitais e escolas. Ataques que continuam a matar civis inocentes, incluindo crianças. Só na última semana, a Rússia lançou mais de 1.200 drones e mais de 60 mísseis de cruzeiro e balísticos contra a Ucrânia”, diz o artigo.
“Estas não são as ações de alguém que leva a paz a sério. Nem estes ataques indiscriminados são meros acidentes – são uma escolha sistemática da Rússia de travar a sua guerra de agressão com absoluta crueldade. E isso tem de acabar.”
Em resposta, o Ministério do Exterior da Índia disse que “fornecer conselhos públicos sobre como a Índia deveria conduzir relações com outros países não é uma prática diplomática aceitável.”
A Índia e a Rússia já têm um histórico de relações comerciais e diplomática por décadas. Desde sua independência da autoridade britânica, a Índia apresenta um posicionamento de política externa multipolar, onde conduz negociações e diplomacia independentemente de posicionamentos ideológicos, segundo o jornal The Guardian.
Por mais que tenha atraído certa condenação internacional, essa condução de política externa foi historicamente tolerada por outros governos. Todavia, o retorno de Donald Trump à Casa Branca marcou uma queda acentuada nas relações da Índia com os Estados Unidos, caracterizada por altas tarifas impostas pelo republicano.