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Nagel, da UPF: Independência ganhou força na Catalunha

Para especialista, os partidos nacionalistas começaram a se unir em torno de um ideal de independência há menos de 20 anos – e agora estão mais articulados

Klaus Jürgen-Nagel: Cientista político fala sobre a divisão interna da Catalunha (foto/Divulgação)
CA

Camila Almeida

Publicado em 9 de outubro de 2017 às 20h41.

Última atualização em 9 de outubro de 2017 às 20h41.

O presidente regional da Catalunha , Carles Puigdemont, deve fazer um pronunciamento no parlamento catalão nesta terça-feira. Se antes o esperado era uma declaração de independência unilateral, depois de protestos por união, pressão do governo espanhol, dos europeus e das próprias empresas com sede na Catalunha, já se espera um discurso menos radical, apesar de incisivo sobre a decisão da população pelo “sim” no referendo.

Para o cientista político Klaus-Jürgen Nagel, professor da Universidade Pompeu Fabra, em Barcelona, e estudioso de movimentos nacionalistas e da história da Catalunha, Puigdemont tem atraído a antipatia dos seus adversários políticos justamente por conseguir levar adiante o ideal de independência – mesmo com toda a pressão e o risco de ser legalmente processado. Em entrevista a EXAME, Nagel falou sobre a história do nacionalismo catalão, a divisão dos partidos dentro do parlamento e a falta de opções legais que a Catalunha tem para pleitear sua independência – o que faz tocar o processo por conta própria ser sua única alternativa.

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Quem são os apoiadores da independência no parlamento catalão?

Há dois grupos parlamentares que estão a favor do referendo e da independência. O maior se chama “Juntos pelo sim” e consiste de partidos que abarcam posições da direita moderada (como o PDECat, do presidente Puigdemont), da esquerda republicana, incluindo partidos pequenos dissidentes de partidos antiindependentistas, os verdes e os cristãos-democratas. Dentro do “Juntos pelo sim” também estão organizações da sociedade civil, como ANC e OC, capazes de levar centenas de milhares de pessoas às ruas. Há também representantes de grupos menores de esquerda, que se definem como independentistas, mas não nacionalistas, que acreditam no direito democrático de decidir sobre o que definem ser uma exploração financeira por parte do governo espanhol. Já o segundo grupo parlamentário, bem menor, mas de uma esquerda muito mais radical, que é anti-União Europeia – e que é um grupo necessário para que os independentistas tenham sua maioria no Parlamento. Os dois gruposjuntos representam 48% dos votos.

E como estão posicionados os demais partidos?

Entre os partidos anti-independentistas e antirreferendo, estão os “ciudadanos”, líderes da oposição, que surgiram na Catalunha como o partido contrário às políticas de normalização da língua catalã, mas que hoje atuam em toda a Espanha, se definindo como liberais, especialmente nos aspectos econômicos. Cooperam com o Partido Popular, do primeiro-ministro espanhol Mariano Rajoy, que também faz parte desse grupo, mas que é um partido pequeno na Catalunha. Junto a eles estão os sociais-democratas e os socialistas. Representam 39% dos votos. Por fim, há o grupo parlamentar que defende o direito ao referendo, mas que não se pronuncia a favor da independência. Somam os 12% restantes.

Olhando historicamente, é agora que os movimentos por independência se encontram mais articulados?

Sim. O nacionalismo catalão como movimento político data do final do século 19. Desde o começo do século 20, os partidos de obediência catalã dominam as eleições na Catalunha (sempre que existiram, o que, na Espanha, é mais a exceção do que a regra). O que acontece é que esses partidos catalães, ainda que nacionalistas, não estavam a favor da independência. Estavam a favor da autonomia, dos direitos linguísticos e da reforma da Espanha, com sua conversão em um estado que reconheça todas as suas nações. A mudança do nacionalismo político catalão para o independentismo data do anos 2006-2012. Um projeto de um novo Estatuto de Autonomia foi proposto pelo parlamento catalão com votos de mais de 80% dos deputados – mas foi rebaixado pelo parlamento de Madri, com sua então maioria socialista. Depois, foi aceito pelo povo catalão num referendo permitido, porém, quatro anos mais tarde, teve seus artigos essenciais rejeitados pelo Tribunal Constitucional Espanhol (que tem legitimidade duvidosa, devido à sua composição). Foi nesse contexto que muitos nacionalistas abandonaram sua posição de buscar reconhecimento nacional dentro da Espanha e migraram para o independentismo, por acreditarem que outra via para alcançar esse reconhecimento já não existe.

O líder da Catalunha, Carles Puigdemont, parece ser uma figura polêmica, que, com seu posicionamento radical em defesa da independência, agrava a divisão na Catalunha. Como os catalães o veem?

Puigdemont é um político jovem, que representa a mudança de seu partido da histórica Convergência Democrática da Catalunha ao atual PDECat [Partido Democrata Europeu Catalão]. Era uma figura inicialmente pouco conhecida, que vinha de um acordo entre os diferentes partidos e posicionamentos sobre o independentismo. Obviamente, os adversários não somente da independência como do direito de decidir catalão o tomam como principal adversário, já que ocupa a presidência e conseguiu levar o país a um referendo que seus opositores rechaçam, sem se deixar intimidar pelas ameaças que bem podem se cristalizar em acusações penais, com prováveis multas milionárias e possibilidade de prisão.

Há denúncias de corrupção contra Puigdemont e seu partido?

Não. Há denúncias por promover o referendo, considerado ilegal. Contra seu partido, enquanto ainda se chamava Convergência, havia denúncias de financiamento ilegal. Alguns políticos dessa época, especialmente o ex-presidente da Catalunha Jordi Pujol, bem como alguns de seus familiares, conselheiros e ministros, estão acusados de corrupção, por não pagar impostos, gastar mal o dinheiro público, praticar tráfico de influências, etc. Também é certo que algumas das denúncias feitas publicamente pelos meios de comunicação espanhóis se revelaram falsas, como acusações contra o ex-presidente da Catalunha Artur Mas e contra o ex-prefeito de Barcelona Xavier Trias, e se tratavam de manobras políticas dos adversários para desqualificar-los em épocas eleitorais (estilo o Kompromat, na Rússia).

Hoje, o fato de a maioria do parlamento ser nacionalista quer dizer que a população tem se identificado cada vez mais com essa linha de abordagem política?

Nas últimas eleições da Catalunha, com participação eleitoral recorde, os partidos independentistas. Nas pesquisas sobre como a população votaria num referendo legal sobre a independência, as posições estão empatadas. Sabemos, entretanto, que o governo espanhol não permite nenhum referendo e, portanto, algo como os escoceses conseguiram é impossível na Espanha – e se faz inclusive uso da polícia para impedir a votação. E, se não se impede completamente devido à resistência pacífica dos votantes, pelo menos se põe em dúvida a representatividade do resultado.

A proclamação da independência unilateral tem sentido mesmo sem haver consenso sobre isso na Catalunha?

Não conheço nenhuma independência, seja por referendo, declaração ou guerra, que tenha sido realizada por consenso. Entretanto, o número de estados no mundo não para de crescer, e afirmar que as independências da Noruega da Suécia, da Islândia da Dinamarca, da Holanda da Espanha (ou do Brasil de Portugal?) foram um disparate me parece… um disparate. Onde houve votação (casos raros, sem dúvidas), sempre se decidiu por maioria. Democracias liberais como Grã-Bretanha ou Canadá, permitiram um referendo sobre a independência, mas a Espanha não faz parte desse grupo. Una nação minoritária na Espanha, que se nega a se converter num estado constitucionalmente plurinacional, só tem as alternativas de se submeter ao status quo ou ir por conta própria à independência.

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