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Gorbatchov diz que sente vergonha da Rússia pós-Perestroika

Último líder da URSS reclamou do comportamento das elites russas e revelou que foi proibido de criar um novo partido no país

Mikhail Gorbatchov, ex-líder soviético (Natalia Kolesnikova/AFP/AFP)

Mikhail Gorbatchov, ex-líder soviético (Natalia Kolesnikova/AFP/AFP)

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Da Redação

Publicado em 16 de fevereiro de 2011 às 17h21.

Moscou - O último dirigente soviético, Mikhail Gorbatchov, criticou duramente nesta quarta-feira a Rússia de elites "depravadas", onde a vida política se resume a uma "imitação", dizendo ter "vergonha" de seu país, quase vinte anos após o fim da Perestroika, lançada por ele.

Durante uma longa entrevista ao jornal de oposição Novaya Gazeta, de onde é acionista, Gorbachev, que festejará seus 80 anos no dia 2 de março, contou que o vice-chefe da administração do Kremlin, Vladislav Surkov, considerado o principal "ideólogo" do poder russo, impediu-o de criar um partido social-democrata.

"Tinha a intenção, junto de meus amigos, de criar um partido. Quando Surkov ficou sabendo, ele me perguntou 'Isso serve para quê? De qualquer maneira, não vamos registrar seu partido'", revelou.

"A classe no poder comporta-se de maneira revoltante. São ricos e depravados. Seguem o exemplo de (Roman) Abramovich", bilionário, dono do clube de futebol inglês Chelsea, de iates e mansões luxuosas, considerou Gorbachev.

"Desprezo este ideal. Tenho vergonha desta rica devassidão. Tenho vergonha por nós e pelo país", acrescentou o pai da Perestroika, processo de liberalização iniciado na URSS na segunda metade dos anos 80 e que terminou com a queda do regime soviético em 1991.

Criticando a anulação de eleições para governadores por Vladimir Putin, ex-presidente e atual primeiro-ministro, e a falta de liberdade de expressão nas televisões nacionais, Gorbachev denunciou uma "imitação" da vida política na Rússia.

"O presidente (Dmitri Medvedev) e Vladimir Vladimirovich (Putin) fazem o que podem, mas o que acontece no país se parece cada vez mais com uma imitação. Ao invés de tomar medidas concretas (...) eles tornam absurdas as leis eleitorais", disse.

Agora que o presidente Medvedev defende uma modernização da Rússia, Gorbachev acredita que um dos principais obstáculos, a fuga de cérebros, se explica pelas deficiências democráticas.

"A vida normal está relacionada à democracia, quando o poder é controlado, e não com o autoritarismo que controla as pessoas e suas liberdades", destacou.

"Se houver um renascimento do projeto democrático, as pessoas pararão de emigrar e voltaram", se eles não "dependerem mais do czar, do primeiro-ministro", continuou.

Vladimir Putin segue sendo considerado por muitos observadores como o verdadeiro líder do país.

"A política atual, que se utiliza de todos os meios para se manter no poder, é inaceitável", concluiu o ex-presidente soviético, que foi obrigado a deixar o poder no fim de 1991.

Mikhail Gorbachev ainda anunciou durante a entrevista que festejaria seu aniversário em Moscou no dia 2 de março. Uma noite de gala será igualmente organizada em Londres, no Royal Albert Hall, no dia 30 de março. A receita do concerto, no qual participarão Sharon Stone, Bryan Ferry e The Scorpions, vai ser revertida para o centro de tratamento de leucemia para crianças criado por sua esposa Raissa, que faleceu de câncer em 1999.

Gorbachev também revelou durante o encontro que Raissa havia sofrido muito durante o golpe de 1991 e que isso havia contribuído para a piora de sua saúde. Na época, ela sofreu um derrame e teve hemorragia nos dois olhos.

Após o retorno deles para Moscou, após o golpe fracassado, "eu não fui mais à Praça da Liberdade, onde me esperavam. Faz 20 anos que sou criticado por isso. Eu estava com ela", confessou.

Ela, em seguida, queimou "as 52 cartas que eu havia escrito para ela, cartas da nossa juventude", para proteger nossa vida privada da "intromissão de estranhos", contou.

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