Direita colombiana defende "não" em referendo sobre paz
A possibilidade de um triunfo do "não", pouco provável a julgar pelas pesquisas, abriria, segundo os defensores da opção, uma via para "renegociação" do acordo
Da Redação
Publicado em 30 de setembro de 2016 às 13h21.
Bogotá - O uribismo, que reúne um grande setor da sociedade colombiana , lidera a defesa do "não" no referendo da paz com o argumento de que o acordo com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia ( Farc ) permite a impunidade e pode ser renegociado.
O ex-presidente Álvaro Uribe e seu novo companheiro de batalha, o ex-procurador Alejandro Ordóñez, são as figuras visíveis da oposição ao acordo assinado no último dia 26 de setembro pelo presidente, Juan Manuel Santos, e o líder das Farc, Rodrigo Londoño, conhecido como "Timochenko", sobre o qual os colombianos se pronunciarão neste domingo.
Uribe, cuja popularidade em algumas pesquisas supera a de Santos, é um dos mais ferrenhos críticos do acordo alcançado com as Farc em Havana por considerá-lo um "mau exemplo" para os colombianos.
"Eles dizem aos colombianos que assassinar ou sequestrar policiais não merece castigo", declarou Uribe, líder do partido de direita Centro Democrático, utilizando como argumento que o maior problema do processo de paz está na "impunidade disfarçada" que se outorga às Farc, além da possibilidade de "elegibilidade política".
Na batalha pelo "não", Uribe, que governou o país entre 2002 e 2010, encontrou um aliado de peso em Ordóñez, representante dos setores mais conservadores da sociedade colombiana e inimigo declarado das Farc e do acordo assinado.
"O acordo Santos-Timochenko não equivale à paz (...) é o acordo de duas elites, a elite oligárquica e autoritária que Juan Manuel Santos representa e a elite criminosa das Farc, fizeram-no de costas para o país e agora precisam do povo para legitimá-la", declarou Ordóñez em um ato de campanha em Cartagena.
Mas o "não" alcançou também o apoio de personalidades que não são necessariamente uribistas, como o jurista e ex-prefeito de Bogotá, Jaime Castro, e o catedrático Pedro Medellín, que fazem parte da campanha "Melhor Não", ou o ex-presidente da Corte Constitucional, José Gregorio Hernández.
Castro expressou seus desacordos às mudanças que o acordo traria em aspectos como a "organização judicial, o modelo social e o ordenamento político institucional do país" pela criação de uma Jurisdição Especial para a Paz (JEP).
Em sua opinião, as cortes, tribunais, juizados e órgãos de controle como o Ministério Público e a Controladoria, "perdem parte importante de suas atribuições penais, disciplinares e fiscalizadoras, e suas decisões de qualquer época poderão ser revisadas e canceladas" pela JEP, "cujas decisões judiciais só serão apeláveis perante a Corte Celestial".
Na mesma linha se manifestou o advogado constitucionalista e internacionalista Rafael Nieto, para quem o acordo termina "premiando" as Farc "sobre o único mérito de ter matado" durante 52 anos.
"Os benefícios que terão os senhores das Farc em matéria de justiça são o desejo de qualquer criminoso comum e menor no país", disse Nieto à Efe, criticando o fato de que os guerrilheiros possam depois entrar na política, pelo que considerou que "a mensagem ética enviada pelo acordo é de reprodução da violência".
Também observou que o ponto do acordo de paz referente aos cultivos ilícitos "terá consequências desastrosas" e pôs em dúvida a efetividade dos "mecanismos de substituição manual e voluntária" das plantações de coca.
"O custo institucional dos acordos é enorme, o governo manuseou a Constituição (...) quebrou a espinha vertebral do âmbito judicial com o tribunal especial de paz", completou.
Nieto desvirtuou ainda a tese de que os acordos tenham posto fim a uma guerra, já que no país o que houve foi "25.000 violentos de extrema direita e extrema esquerda castigando 44 milhões de colombianos honestos e pacíficos".
A possibilidade de um triunfo do "não", pouco provável a julgar pelas pesquisas, abriria, segundo os defensores desta opção, uma via para a "renegociação" do acordo com uma guerrilha que, para Nieto, "se abrandou" após quatro anos de negociação.
"Uma coisa é estar fechado no monte, se escondendo dos bombardeios, e outra muito distinta é estar bebendo rum e dançando em Cuba", opinou.
As forças do "não" ganharam esta semana o apoio do jogador Daniel Torres, que joga no clube espanhol Alavés, que mostrou sua oposição ao acordo de paz com o curioso argumento de que "o centro da negociação e do governo não é Jesus Cristo".