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Covid e Brexit sem acordo podem expor Reino Unido a duplo choque econômico

Para economistas, cenário significará "outro grande golpe para a economia britânica, que está se recuperando do maior choque de que se tem memória"

Boris Johnson: primeiro-ministro disse que um rompimento abrupto com a União Europeia seria "bom" para o país "prosperar" (Anthony Devlin/Reuters)

Boris Johnson: primeiro-ministro disse que um rompimento abrupto com a União Europeia seria "bom" para o país "prosperar" (Anthony Devlin/Reuters)

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AFP

Publicado em 9 de setembro de 2020 às 16h37.

A ameaça de um Brexit sem acordo surge novamente em uma economia britânica já atingida pela pandemia do coronavírus, aumentando o temor de um choque duplo que poderia deixar cicatrizes duradouras no crescimento e no emprego. 

A possibilidade de se chegar sem acordo ao final do período de transição, no final do ano, ganha força em um momento em que as negociações sobre as futuras relações entre Londres e Bruxelas, há muito paralisadas, estão ameaçadas pela decisão do governo britânico. Este último revisará partes do Tratado de Retirada, em vigor desde 31 de janeiro.

Downing Street também ameaçou jogar a toalha, se não houver resultado até meados de outubro.

O primeiro-ministro Boris Johnson, um dos arquitetos do Brexit, disse que um rompimento abrupto com a União Europeia seria "bom" para o país "prosperar", porque lhe daria "liberdade para fechar acordos comerciais com todos os países do mundo".

Para muitos economistas, esse cenário significará "outro grande golpe para a economia britânica (...) que está se recuperando do maior choque de que se tem memória", disse o professor de economia Jonathan Portes, da King's College London, à AFP.

Um Brexit sem acordo "poderá ser mais caro do que a covid-19", porque suas consequências se estendem por um período mais longo, considera Thomas Sampson, economista da London School of Economics (LSE), em um estudo recente.

As relações comerciais britânicas com a União Europeia seriam, então, regidas pelas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). Isso seria acompanhado pela reintrodução de direitos alfandegários às vezes punitivos, particularmente sobre alimentos, ou componentes industriais, poucos meses após o fim do auxílio estatal, em outubro, para preservar os empregos dos efeitos da pandemia e do confinamento.

O governo conservador anterior havia estimado, no final de 2018, que esse cenário reduziria o Produto Interno Bruto (PIB) britânico em 7,6% em um período de 15 anos.

Como sinal de preocupação, a libra esterlina não parou de cair nos últimos dias, e a patronal CBI teme que muitas empresas, especialmente as pequenas e médias (PMEs), possam não sobreviver a este duplo golpe.

A indústria na linha de frente

Os setores mais afetados pela pandemia, como hotelaria e transporte aéreo, parecem pouco expostos ao Brexit, mas a indústria de transformação está na linha de frente por depender do continente para seu abastecimento e comercialização.

As principais montadoras estrangeiras poderiam fazer as malas, fechando fábricas e cortando empregos.

De acordo com o jornal Financial Times, a Nissan japonesa optou por adiar a produção de seu novo Qasqai no Reino Unido de outubro deste ano para abril de 2021 - na melhor das hipóteses - para ver o que acontece.

Até o bilionário pró-Brexit Jim Ratcliffe parece ter desistido de fazer seu 4x4 no País de Gales para montá-lo em uma fábrica francesa.

Sem um acordo comercial com a UE, os consumidores britânicos teriam de pagar preços mais altos nos supermercados, já que o Reino Unido importa grande parte de seus alimentos.

Esse impacto na indústria e nas famílias "poderá aumentar ainda mais as desigualdades no Reino Unido", alerta Josh De Lyon, economista da LSE.

O governo conservador espera compensar esses riscos, negociando acordos de livre-comércio com Estados Unidos, Japão, Austrália e Canadá. De acordo com De Lyon, porém, "os estudos mostram que o custo do Brexit vai superar em muito o benefício" desses acordos.

Londres também conta com a criação de portos livres e com o controle de seus regulamentos, embora isso signifique relaxá-los para atrair empresas e investidores, especialmente em benefício de seu poderoso setor financeiro.

Rejeitando a desregulamentação em massa, Portes acredita que, "apesar do Brexit, o Reino Unido continuará sendo uma economia próspera com setores de sucesso, como finanças, ou universidades de elite".

Segundo ele, "o Brexit não será benéfico, mas também não é o fim do mundo".

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