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Carro elétrico vira tema na campanha dos EUA, com Trump contra e democratas a favor

Mesmo com apoio de Elon Musk, republicano defende avanço da exploração de petróleo e carros a gasolina

Elon Musk, criador da Tesla, durante evento no Congresso dos EUA (Saul Loeb/AFP)

Elon Musk, criador da Tesla, durante evento no Congresso dos EUA (Saul Loeb/AFP)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 4 de agosto de 2024 às 06h01.

Última atualização em 4 de agosto de 2024 às 14h15.

Chicago - Ao fazer um de seus principais discursos da campanha no ano, o de aceitação da candidatura, o ex-presidente Donald Trump incluiu entre seus alvos o carro elétrico.

"Eu vou acabar com a obrigação de veículo elétrico no 1º dia", disse o ex-presidente, na Convenção Nacional Republicana, em julho. "Isso salvará a indústria automotiva americana da obliteração completa, que está acontecendo agora, e poupará aos consumidores americanos milhares de dólares por carro".

O discurso empolgou parte da multidão que o assistia no Fiserv Forum, em Milwaukee. A EXAME viu delegados darem gritos de apoio à proposta de Trump. O tema voltou em outros discursos e conversas no evento. Um dos temores mais citados é que o avanço dos elétricos aumentaria a dependência da China, que domina a produção de componentes essenciais, como as baterias. Nesta visão, o futuro dos EUA estaria em risco, caso o país dependa de uma tecnologia que não domina por completo.

Os Estados Unidos, no entanto, não adotaram uma obrigação de adoção de carros elétricos prevista. O que o governo de Joe Biden fez foi aumentar os limites à emissão de poluentes por carros novos, de modo a fazer com que, até 2032, a maioria dos carros e picapes vendidas nos EUA seja elétrica, híbrida ou use outros combustíveis mais limpos. Além da razão ambiental, o plano é estimular a indústria local.

A mudança de regulação tem estimulado montadoras dos EUA a produzirem mais modelos elétricos, mas eles ainda são minoria no país. Em maio, as vendas da categoria representaram 6,8% do total de carros novos, segundo dados da consultoria Edmund.

Ao final de 2023, havia uma frota de 3,3 milhões de veículos elétricos no pais, ante um total de 288 milhões. A tendência é de alta: havia 1,3 milhão deles no país em 2021, e a expectativa do Laboratório Nacional de Energia Renovável é que essa frota possa ser de 30 a 42 millhões até 2030.

Nas ruas e comerciais de TV, os elétricos ainda são minoria. A cada intervalo, é comum ver três ou quatro comerciais de picapes e SUVs enormes, sendo que poucas delas são elétricas. Os republicanos têm mais força em áreas de subúrbio e no interior do país, onde esses veículos maiores, e a própria dependência do carro, é mais forte, pelas longas distâncias entre casas e comércios e a falta de transporte público.

Já nas grandes cidades, como Chicago e Washington, é cada vez mais comum pedir um carro por aplicativo e o motorista chegar a bordo de um elétrico da Tesla ou de outros fabricantes locais. O menor gasto com combustível e manutenção tem levado mais motoristas profissionais a aderir.

Drill, baby, drill

Trump tem centrado sua campanha no combate à inflação. Para isso, ele defende, é preciso baixar o custo de energia e aumentar a produção de petróleo, de modo a baratear a gasolina. "Drill, baby, drill" (fure, baby, fure) virou um lema de campanha.

Já o governo de Joe Biden buscou criar várias medidas para acelerar a transição energética no país, como estimular a produção de baterias e de carros elétricos nacionais. A vice de Biden, Kamala Harris, que disputa a eleição contra Trump, deve manter as medidas se for eleita.

Uma pesquisa feita pelo Pew Research Center em junho mostrou que só 13% dos republicanos dizem estar muito interessados em comprar um carro elétrico, ante 45% dos democratas.

Trump e Musk

Apesar dos ataques, Trump já deu declarações a favor de carros elétricos, e vem moderando um pouco seu discurso "Eu falo constantemente sobre carros elétricos, mas não sou contra eles. Sou a favor. Eu dirigi eles e são incríveis, mas não para todo mundo", disse em um comício em Grand Rapids, em 20 de julho.

Neste mesmo discurso, Trump disse que "ama Elon Musk", dono da Tesla, uma das principais fabricantes de elétricos dos EUA.

Musk deu apoio público à campanha de Trump em julho, após o atentado contra o ex-presidente, e teria se comprometido a doar milhões de dólares, segundo o ex-presidente.

Há alguns meses, o empresário critica uma medida de Biden, de dar um subsídio de até US$ 7.500 para a compra de carros elétricos que sejam produzidos nos EUA. No entanto, parte dos modelos da Tesla não se qualificam porque possuem muitos componentes importados. Musk pediu publicamente pelo fim do benefício, que acaba beneficiando seus concorrentes.

Outro ponto que irritou Musk foi que o governo Biden se aproximou mais de outros fabricantes tradicionais, como GM e Ford. Em 2021, a Casa Branca não convidou a Tesla para um evento sobre carros elétricos, mas chamou outras montadoras.

Apesar do apoio de Musk, Trump segue dizendo que é contra o novo modelo. "Elon Musk me apoiou e é meu amigo, mas eu sou contra todo mundo ter um carro elétrico", repetiu, na quarta-feira, 31, em Chicago.

Efeitos para o Brasil

Uma puxada de freio nos estímulos ao carro elétrico pelos Estados Unidos pode reduzir o avanço do setor no mundo, mas o crescimento da China e da Europa pode reduzir os efeitos disso.

"Obviamente uma mexida nos Estados Unidos impacta, mas você tem um mercado chinês, que é hoje quem está mais avançado em tecnologia, que tem mais investido e tem o olhar no Brasil como um grande parceiro comercial", diz Rafael Rebello, diretor de mobilidade elétrica da Raízen Power e diretor-conselheiro na ABVE (Associação Brasileira do Veículo Elétrico).

"Ir contra a tecnologia e a inovação é uma disputa ingrata. Não tem como a fita cassete competir com o streaming", prossegue. Rebello avalia que a velocidade da transição também depende da matriz energética dos países, e que o Brasil tem potencial por ser um grande produtor de energia limpa. "Não adianta migrar para o elétrico e não ter energia a custo competitivo e uma matriz não-renovável", pondera.

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