Imagem de câmara de segurança mostra Jamal Khashoggi entrando no consulado saudita em Istambul, Turquia (Reuters TV/Reuters)
Gabriela Ruic
Publicado em 18 de outubro de 2018 às 11h18.
Última atualização em 26 de outubro de 2018 às 12h13.
São Paulo – O jornal americano The Washington Post publicou na noite de quarta-feira o último artigo escrito por Jamal Khashoggi, o jornalista saudita que desapareceu no último dia 2 de outubro depois de ser visto entrando no consulado da Arábia Saudita em Istambul, Turquia. A polícia turca continua investigando o seu paradeiro e expandiu as buscas para bosques na região, informou o Post nesta quinta-feira.
“Recebi essa coluna do tradutor e assistente do Jamal no dia seguinte à notícia do seu desaparecimento em Istambul”, escreveu a editora de opinião da publicação, Karen Attiah, em uma nota de abertura para o artigo do jornalista. “O Post segurou a publicação, pois esperávamos que Jamal voltaria para nós para que pudéssemos editar o texto juntos”, continuou ela. “Mas isso não vai acontecer”, notou, “essa coluna captura perfeitamente o seu comprometimento e paixão pela liberdade no mundo árabe”, enfatizou.
Read @JKhashoggi ‘s last piece for @washingtonpost in Arabic: https://t.co/kVvHhT8lDX
— Karen Attiah (@KarenAttiah) October 18, 2018
E é justamente sobre isso que o último texto do jornalista trata. Conhecido internacionalmente como um crítico do regime saudita, ele publicou nos últimos meses várias peças sobre à guerra do país no Iêmen, a recente disputa diplomática com o Canadá e a prisão de ativistas dos direitos das mulheres.
“Procurei recentemente online a edição 2018 da pesquisa ‘Liberdade no Mundo’, que é publicada pela Freddom House, e cheguei a uma conclusão grave. Existe apenas um país árabe que é classificado como livre”, escreveu Jamal logo no primeiro parágrafo da peça, “e esse país é a Tunísia. Jordânia, Marrocos e Kuwait vêm em seguida, classificados como ‘parcialmente livres’. Todo o resto do mundo árabe é classificado como ‘não livre’ pelo estudo”.
“O mundo árabe estava cheio de esperanças durante a primavera de 2011. Jornalistas, acadêmicos e a população tinham a expectativa de uma sociedade árabe iluminada e livre”, lembrou.
“Essas expectativas rapidamente se esvaíram e essas sociedades ou voltaram ao status quo ou enfrentam condições ainda piores. ” Ele também agradeceu ao Post por traduzir suas colunas para o árabe, por considera que “os árabes precisam ler em seu idioma para que possam entender e discutir os aspectos e as complicações da democracia”.
Jamal foi ao consulado saudita para resolver pendências documentais para seu casamento. Foi filmado entrando, mas jamais visto saindo. A polícia da Turquia começou então a investigar o seu paradeiro e a investigação apontou o prédio oficial da Arábia Saudita como sendo o local da morte do jornalista. Seu corpo, fontes disseram a rede de notícias CNN, teria sido mutilado.
A Arábia Saudita continua negando o envolvimento no caso, embora exista a expectativa de que o reino reconheça publicamente que Jamal tenha sido morto durante um interrogatório e por um membro próximo do príncipe Mohammed bin Salman, que vem tentando vender ao mundo uma ideia de modernização do país.
A repercussão do caso arranhou essa tentativa de reconstrução da imagem da Arábia Saudita: grandes bancos europeus cancelaram a participação em uma cúpula financeira em Riad, capital do país, assim como ministros de finanças europeus. Autoridades dos EUA, maior aliado do reino, disseram que iriam avaliar a presença na conferência.