MELANIA E MICHELE: a discussão sobre o discurso plagiado é péssima para Trump / Mike Segar/File Photos/ Reuters
Da Redação
Publicado em 19 de julho de 2016 às 17h40.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 17h52.
Sérgio Teixeira Jr., de Nova York
Jarrett Hill, que se apresenta como decorador de interiores e jornalista, fez uma postagem no Twitter na noite de ontem e deu origem a uma controvérsia que está roubando os holofotes do segundo dia da Convenção Nacional do Partido Republicana. Pouco mais de uma hora depois do discurso de Melania Trump, mulher de Trump e eventual primeira-dama dos Estados Unidos, Hill tuitou:
Melania roubou um parágrafo inteiro do discurso de Michelle.
O tweet também continha um trecho destacando frases do discurso de Michelle Obama na convenção democrata de 2008 que foram repetidas praticamente na íntegra por Melania na noite da segunda-feira. A apresentação da mulher de Trump, uma ex-modelo eslovena 24 anos mais jovem que o candidato, tinha o objetivo de apresentá-la nacionalmente aos eleitores e de aparar as arestas da imagem beligerante e descontrolada de seu marido. Menos de 12 horas depois, o conteúdo do seu discurso ficou em segundo plano. O que os americanos querem saber é se Melania Trump – ou os responsáveis por escrever o discurso – copiaram ipsis litteris o que a atual primeira-dama disse numa ocasião semelhante oito anos atrás.
Há passagens de fato muito parecidos nos dois discursos. Confira abaixo:
Michelle Obama, em 2008
Barack e eu fomos criados com muitos dos mesmos valores: que você dá duro pelo que quer na vida, que sua palavra é seu compromisso e que você faz o que diz que vai fazer; que você trata as pessoas com dignidade e respeito, mesmo que não as conheça e mesmo que não concorde com elas. E Barack e eu construímos nossas vidas guiados por esses princípios e os passamos adiante para a próxima geração. Porque queremos que nossas crianças – e todas as crianças neste país – saibam que o único limite para as alturas de suas conquistas é o alcance dos seus sonhos e sua disposição de trabalhar por eles.”
Melania Trump, segunda à noite
“Desde muito cedo, meus pais me passaram o valor de que você dá duro pelo que quer na vida, que sua palavra é seu compromisso e que você faz o que diz e cumpre suas promessas, que você trata as pessoas com respeito. Eles me ensinaram e mostraram valores em suas vidas cotidianas. É uma lição que continuo passando para nosso filho. E temos de passar adiante essas lições para as muitas gerações seguintes. Porque queremos que nossas crianças neste país saibam que o único limite para suas conquistas é a força dos seus sonhos e sua disposição de trabalhar por eles.”
O suposto plágio tornou-se o grande assunto da convenção, que vai até quinta-feira. Pela manhã, Paul Manafort, diretor da campanha de Trump, repudiou a ideia de que Melania Trump pudesse ter copiado o discurso da primeira-dama. Mais tarde, falando à CNN, ele afirmou que Melania sabia que “estava falando para 35 milhões de pessoas ontem à noite”e que “achar que ela roubaria as palavras de Michelle Obama é loucura”. Manafort atribui as acusações a uma manobra da campanha de Hillary Clinton.
Sean Spicer, estrategista-chefe do Comitê Nacional do Partido Republicano, defendeu o discurso dizendo que as palavras escolhidas são recorrentes. “Melania Trump disse: ‘A força de seus sonhos e sua disposição de trabalhar por eles’. Uma personagem de ‘Meu Pequeno Pônei’ disse: ‘Este é seu sonho. Tudo o que você consegue fazer nos seus sonhos você consegue fazer agora”, afirmou Spicer, também à CNN. Ele listou uma série de músicos cujas letras têm conteúdo semelhante, do cantor R&B John Legend ao roqueiro John Legend e o grupo de hip-hop Public Enemy.
Apesar das negativas veementes, o “plagiogate” deve continuar rendendo manchetes. Em entrevista ao popular apresentador de TV Matt Lauer, Melania havia dito que tinha escrito o discurso “com a menor ajuda possível”. Não está claro se algum integrante da equipe de Trump ou algum especialista em discursos foi contratado para ajudar a mulher do candidato. Mas sua aparição no palco em Cleveland já estava prevista havia semanas, e um descuido desse tipo é inaceitável dado o que está em jogo. Em 1988, um então jovem Joe Biden – hoje vice-presidente dos Estados Unidos – foi obrigado a abandonar as primárias democratas que escolheriam o candidato do partido à Presidência. Biden foi acusado de copiar trechos de discursos de Neil Kinnock, do Partido Trabalhista britânico.
Dois dos filhos de Trump, Tiffany e Donald Jr., falam hoje em Cleveland, e certamente os discursos vão receber atenção redobradas. O risco para a candidatura de Trump é que o conteúdo mais importante das mensagens – o tema de hoje é economia e emprego – seja mais uma vez ofuscado pelas controvérsias. Os analistas falam em erros não-forçados, uma expressão emprestada do tênis que definiria os tropeços da equipe de Trump nesta convenção. O fato é que o objetivo de unir os republicanos já não nada simples se tudo corresse de acordo com o roteiro. Com esse tipo de tiro no pé, então, nem se fala.