A especialista defende que pais e professores discutam os objetivos da propaganda com filhos e alunos e os orientem a perceber que nem sempre precisamos dos objetos (Fernando Moraes/VEJA)
Da Redação
Publicado em 2 de junho de 2012 às 13h26.
Rio de Janeiro - Bonecas que cantam e dançam sozinhas e vivem em um mundo colorido, cheio de efeitos especiais; jogos que são capazes de reunir amiguinhos e pais para uma partida cheia de sorrisos e diversão; tênis ou sandálias da moda que garantem a quem os usa sucesso instantâneo, atraindo olhares e interesse por onde passam. Para os adultos é fácil perceber que esses exemplos de peças publicitárias servem para convencer o público a comprar os produtos apresentados. Para as crianças, no entanto, o cenário e os resultados produzidos são facilmente confundidos com a realidade, garante a especialista em comunicação Luciene Ricciotti.
Segundo ela, que também é membro da Rede de Trabalho do Instituto Alana, organização sem fins lucrativos voltada para a defesa de crianças e adolescentes, o público infantil não conta com desenvolvimento psicológico suficiente para fazer essa diferenciação e identificar os apelos do marketing.
“Quando a criança vê a propaganda, ela vê o cenário, o conjunto e diz que quer. Mas muitas vezes ela não quer o brinquedo, ela quer a mãe brincando com ela no tapete como aparece na televisão. Aí a gente compra, e o brinquedo acaba no fundo do armário”, disse a especialista, que é autora do livro A Criança e o Marketing, escrito em parceria com a psicóloga Ana Maria Dias da Silva.
A especialista defende que pais e professores discutam os objetivos da propaganda com filhos e alunos e os orientem a perceber que nem sempre precisamos dos objetos e serviços que nos são apresentados. O esforço, acredita, ajuda essas crianças a serem, no futuro, consumidores conscientes. Luciene Ricciotti acrescenta que a tarefa dos pais é ainda mais difícil porque a criança, em geral, não percebe o fim do desenho e o início da propaganda. “Para ela, os dois têm a mesma credibilidade”, explica.
“A ideia é orientar as crianças, contar o que é o marketing e dizer que a função dele é atender necessidades de consumidores. É importante preparar a criança para o mundo em que a gente vive. Mais cedo ou mais tarde ela vai ter acesso às marcas, ao assédio das empresas e precisamos orientá-las a não consumirem tanto por impulso. Comprar não é errado, o errado é comprar, comprar, comprar e guardar, guardar, guardar, o que caracteriza o consumismo”, alertou.
Para Ana Cláudia Bessa, uma das fundadoras do movimento Infância Livre de Consumismo, coletivo formado por pais e mães inconformados com os estímulos da publicidade infantil ao consumo excessivo, a família não pode ser totalmente responsabilizada pela formação do consumo consciente em crianças e adolescentes.
Segundo ela, trata-se de uma disputa “cruel e desigual”. A ativista defende a proibição de propagandas voltadas para esse público.
“Não temos como competir com as mensagens criadas por adultos, que estudaram para isso, voltadas às crianças, que não têm condição de discernir o que é verdade, manipulação ou mentira. Além disso, crianças não podem decidir o que vão consumir, afinal elas não geram renda”, ressaltou, acrescentando que essa realidade é responsável por conflitos familiares e constantes frustrações, já que “é impossível para a maioria das pessoas comprar sempre todos os lançamentos apresentados nas propagandas”.
“Essa necessidade produzida, além de tudo, compromete a sustentabilidade do planeta porque, baseados no consumismo, em pouco tempo, estaremos lotados de lixo, com o ambiente totalmente degradado e sem água para beber”, completou.