O que as empresas precisam saber para desenvolver novos produtos
Rabikar Chatterjee, professor de MBA da University of Pittsburgh, fala sobre inovação e obsolescência no mercado
Da Redação
Publicado em 25 de julho de 2011 às 18h28.
Rio de Janeiro - Em um cenário onde o ciclo de vida dos produtos se torna cada vez menor, oferecer novidades que sejam relevantes e atendam às necessidades dos consumidores se tornou um desafio para as empresas.
Compreender as preferências e expectativas que o target tem em relação aos seus produtos e também aos da concorrência é o pensamento que deve guiar as estratégias das companhias.
Esta é orientação defendida por Rabikar Chatterjee, professor de MBA da University of Pittsburgh. Segundo o educador, ao inovar as empresas devem levar em conta um série de fatores, desde a escolha das commodities até o planejamento dos resultados a longo prazo.
Estudar junto ao consumidor quais as características que eles esperam de um produto e conhecer sua vantagem competitiva, com base em metodologias confiáveis, são ações que colaboram para melhorar o desempenho das companhias e ampliar o entendimento do mercado.
Países como o Brasil, a Índia e China têm ganhado destaque não apenas pelo seu crescimento econômico. Empresas norte-americanas e europeias veem oportunidades de aprender com os mercados locais sobre soluções de baixo custo, que podem proporcionar mais benefícios aos consumidores, sem abandonar a qualidade e o design.
Leia a entrevista na íntegra abaixo, em que o professor explica detalhadamente essas iniciativas.
As empresas têm dado mais atenção à opinião dos consumidores para desenvolverem produtos. Quais as vantagens e desvantagens de utilizar esta estratégia?
Rabikar Chatterjee - A grande vantagem é que se for usada de forma correta, permite conhecer melhor o seu consumidor. É uma oportunidade para as empresas entenderem melhor não somente o target, mas também os pontos de conflito dessa relação.
O risco que se pode correr é irritar o cliente, invadindo sua privacidade. Ao lidar com estas informações é preciso ter cuidado. Com o aumento do conhecimento dos consumidores, não há mais chances para enganá-lo.
O marketing deve apoiar o produto, mas se ele não for bom, nenhuma estratégia poderá funcionar.
As empresas sabem o que os consumidores gastam com os produtos de sua empresa, mas desconhecem quanto gastam com a concorrência. Como essa metodologia pode colaborar para saber o que realmente o consumidor deseja?
Rabikar Chatterjee - Quando uma companhia desenvolve um produto não deve focar somente no consumidor, mas também pesquisar a concorrência. Uma das técnicas de pesquisa que pode colaborar nesse processo é a análise conjuntural. Essa metodologia leva em conta os fatores que interferem na escolha dos consumidores por uma determinada mercadoria ou serviço.
Na compra de pneus, por exemplo, os atributos que podem ser importantes para o consumidor são o preço e a duração. Vamos supor que um modelo custa R$ 100,00 e roda por 100.000 km. Outro custa R$ 50,00 e dura 50.000 km.
Nós também temos uma alternativa que custa R$ 50,00 e roda por 100.000 km e mais uma que vale R$ 100,00 e dura por apenas 50.000 km. Quais destas opções os usuários escolheriam? Certamente, a que tem menor valor e melhor desempenho. E qual seria a última opção? Alto preço e alta performance.
No caso de termos as duas seguintes opções: um pneu que custe R$ 100,00 e rode por 100.000 km e outro que custe R$ 50,00 e dure R$ 50,00. Aparentemente eles são o mesmo. Mas consumidores podem ter visões diferentes sobre estes produtos. Nessa situação podemos acrescentar ainda um terceiro elemento, a marca. O que eu quero mostrar é que alguns trade-offs permitem descobrir as preferências dos consumidores.
Quando se realiza uma análise conjuntural fora de situações hipotéticas há um número muito grande de fatores envolvidos. Como exemplo podemos citar a cadeia de hotéis Marriot, que tem 57 aspectos a serem analisados. Esta técnica é muito usada quando uma empresa está criando um novo produto para descobrir como o consumidor faz suas escolhas. Há 30 anos a Clark, empresa do segmento de empilhadeiras utilizou esta metodologia para descobrir qual modelo seria ideal para introduzir no mercado brasileiro.
Há outros métodos também?
Rabikar Chatterjee - Outro exemplo de metodologia e a Lead Users Research (Laboratório Vivo). Quando uma companhia deseja desenvolver um novo equipamento médico, por exemplo, essa metodologia recorre aos melhores cirurgiões dos hospitais mais conceituados para fornecer ideias. Eles são importantes nesse processo, por que são os primeiros usuários desta tecnologia e lidam com ela diariamente.
Muitas são as empresas que olham apenas para a concorrência quando desenvolvem produtos. Corre-se o risco de acabar não sendo inovador?
Rabikar Chatterjee - Sim, é um grande risco. Esse modelo era praticado na índia e China, onde as empresas replicavam as ideias dos concorrentes, sem dar atenção ao consumidor. Isso está mudando na Índia e mais vagarosamente no Brasil.
Eu acredito que esse processo deve se tornar se acelerar daqui para frente. Para não correr este risco, devemos estar atento a dois fatore- as informações do mercado coletadas pela própria companhia e o conhecimento de sua vantagem competitiva.
Na índia, por exemplo, a Tata criou o Tata Nano, carro de baixo custo, custando cerca de US$ 2.000,00. No Brasil temos o exemplo da Infraero, com as aeronaves. Empresas da Europa Ocidental e Estados Unidos estão criando centros de pesquisa e desenvolvimento na China e na Índia, não só pelo crescimento desses países, mas porque os engenheiros e cientistas destas localidades pesquisam soluções de custo muito mais baixo do que as produzidas nos países ricos.
Antigamente, os engenheiros esperavam pelo design do produto chegar até eles para iniciar a fabricação. Hoje, vemos o movimento contrário, já que os pesquisadores estão mais confiante no próprio design que estão desenvolvendo. Isso está ocorrendo na China e no Brasil, locais onde as empresas estão realmente se tornando multinacionais.
Muitos produtos são lançados no mercado todos os meses, enquanto muitos também saem de linha. Por que o ciclo de produtos está cada vez menor?
Rabikar Chatterjee - O ciclo de vida dos produtos está se reduzindo, principalmente quando olhamos para o mercado de tecnologia. Essa é a natureza do progresso. Por exemplo, na indústria de automóvel, as mudanças que levavam até cinco anos para chegarem ao mercado, hoje estão disponíveis em 15 a 18 meses. Em alguns casos, o seu produto se torna obsoleto antes de se obter o retorno sobre o investimento para desenvolvê-lo.
Este curto ciclo de vida também poderia criar uma estagnação do consumo. Os clientes, sabendo que haveria sempre uma atualização de algum produto em processo de criação, poderiam preferir aguardar até o seu lançamento. Se procurarmos na internet já há especulações sobre o iPhone 5, então porque comprar o iPhone 4, se a versão posterior já estará disponível. Mas todas as pessoas não pensam assim. Este é o desafio, estar atento ao consumidor de hoje e sua expectativa para o futuro.
Falando sobre o retorno sobre investimento, no Brasil este ainda é um tema bem difícil de ser levado a sério pelas empresas. Como ele deve ser trabalhado?
Rabikar Chatterjee - O retorno sobre investimento deve ser visto a longo prazo e planejado para várias gerações. É preciso ter cuidado. Algumas empresas podem perder em uma geração porém mais a frente conquistar outras. A maioria das empresas ainda não dominou esta técnica.
Mas as companhias querem resultados cada vez mais rápidos, a cada trimestre. Como você vê isso?
Rabikar Chatterje - Isso é um problema. Buscar resultados em curto período de tempo significa que você está abrindo mão de investimentos a longo prazo. Se os mercados financeiros fossem perfeitos não haveria esse problema. Em uma indústria automobilística por exemplo, falando sobre mudança dos modelos poderia se trabalhar sob uma plataforma básica, que receberia pequenas modificações anualmente, de modo a minimizar o investimento necessário. Eu preferiria que o mercado tivesse essa percepção sobre o longo prazo.
Os consumidores estão preparados para trocar de produto a toda hora? Será que vamos viver um momento de consumo consciente?
Rabikar Chatterjee - O modelo de marketing e precificação precisa mudar. Os consumidores não vão querer gastar mais em um produto que amanhã estará obsoleto. Em relação ao preço, talvez possa haver uma mensalidade e a cada mês que houver uma atualização você recebe ela. Para que isso seja possível, e preciso que haja uma compatibilidade.
Falando sobre a tendência de redução do custo e consequentemente do preço, o valor das commodities aumentou muito nos últimos anos. É possível diminuir o custo da inovação também?
Rabikar Chatterjee - Há dois tipos de inovação. Uma se desenvolve nono processo de produção e a outra se manifesta na utilidade do produto. Em relação à primeira, podemos compreender a redução do uso das commodities ou sua substituição por outra matéria-prima como inovação.
Já quando se fala nos produtos, deve-se buscar técnicas melhores para que os resultados sejam confiáveis. Mesmo aqueles desenvolvidos a partir de boas pesquisas podem falhar. Faz parte do processo de inovar achar maneiras para reduzir os custos e melhorar as chances de sucesso.
Além do preço, que outros atributos são valorizados pelos consumidores hoje?
Rabikar Chatterjee - Quando o consumidor tem consciência sobre o preço, a chave é conseguir encontrar um produto que surpreenda-o. Ele estará disposto a pagar mais por conveniência, confiança e estética (design). O iPhone da Apple, por exemplo, pode ter um preço mais alto e as pessoas pagam por isso. Enquanto outras companhias estão cortando verbas do marketing, as empresas de grande sucesso investem nesses atributos para atrair os clientes.
Outro atributo que mencionado é a questão de como um produto pode facilitar a vida do consumidor. Essa poderá ser outra tendência?
Rabikar Chatterjee - Qualquer característica que de um produto para facilitar a vida do consumidor é válida. Mas este bom desempenho deve se fazer sentido e ser pertinente para o consumidor. A definição que os consumidores têm sobre a qualidade é o quanto ele atende as suas necessidades.
O ponto mais importante no desenvolvimento do produto é olhar o processo através dos olhos do consumidor, por que no final o que importa é a perspectiva de qualidade que ele tem sobre o produto. Às vezes você tem que segurar alguma tecnologia, porque o mercado ainda não está preparado para ela ou simplesmente por não haver interesse.
*Com reportagem de Bruno Mello