Campanha #PesquiseMeuCorpo, do Grupo Boticário, marca o lançamento do Centro de Pesquisa da Mulher e chama atenção para a falta de estudos científicos sobre corpos femininos (Grupo Boticário/Reprodução)
Editora-assistente de Marketing e Projetos Especiais
Publicado em 3 de dezembro de 2025 às 09h00.
A percepção das pessoas sobre causas sociais, responsabilidade das empresas e papel das instituições mudou ao longo dos últimos anos, e 2025 aprofunda esse movimento.
A nova edição da pesquisa do Fórum de Marketing de Causa, apresentada nesta quarta-feira, 3, pelo Instituto Ayrton Senna, Cause, Ipsos e ESPM, mostra que a confiança dos brasileiros nas organizações e o engajamento com causas recuaram em diversos indicadores.
O levantamento acompanha a opinião pública sobre temas socioambientais desde 2019 e serve como termômetro para marcas e organizações que atuam em projetos de impacto. A edição deste ano ouviu 800 pessoas das classes A, B e C, de 18 anos ou mais, em todas as regiões do país, com margem de erro de 3,1 pontos percentuais.
Os dados reforçam que, embora a população continue atribuindo importância a causas sociais, há sinais de fadiga informacional, ceticismo e redução de práticas de consumo engajado. A própria compreensão técnica do setor permanece restrita: apenas uma em cada cinco pessoas afirma saber o que é marketing de causa.
Mesmo assim, o estudo aponta que a população segue favorável às iniciativas quando compreende seu objetivo e percebe resultados concretos.
"Quando o consumidor enxerga resultado real, ele sabe que não é discurso — é entrega", diz o relatório.
Em sua sétima edição, o Fórum de Marketing de Causa reúne empresas, organizações da sociedade civil e especialistas para discutir como marcas e instituições estruturam iniciativas de impacto alinhadas aos objetivos de negócio.
A pesquisa anual que acompanha o encontro se tornou uma das principais referências do setor e parte de uma definição prática de marketing de causa, entendida como a parceria entre empresas e organizações sociais que conecta comunicação, estratégia e resultados mensuráveis para a sociedade.
A edição de 2025 identifica um descompasso entre percepção e informação. A população considera importante que marcas se envolvam com causas, mas afirma ter dificuldade para entender o que cada empresa efetivamente faz.
O volume de temas urgentes e a falta de clareza nas mensagens tornam esse acompanhamento mais complexo, segundo os pesquisadores.
O ranking de causas mais importantes para os brasileiros se mantém estável, mas com sinal de queda em quase todos os temas. Combater a fome e a pobreza extrema segue como prioridade para 71% dos entrevistados, contra 74% em 2023. Educação aparece com 51%, também em queda.
A novidade é a entrada da proteção animal entre os três assuntos mais citados:
As demais causas apresentam retração desde 2023:
A leitura sugerida na apresentação é que a disputa não é entre causas, mas entre temas urgentes e volume de informação disponível.
A pesquisa mostra que a confiança dos brasileiros diminuiu em todos os grupos avaliados. As ONGs continuam à frente, mas registram recuo para 51%, cinco pontos a menos do que no levantamento anterior. As empresas aparecem com 42%, também em queda, e os governos somam 33%, três pontos abaixo do resultado anterior.
Mesmo com índices baixos, o governo permanece como o principal responsável por conduzir ações sociais e ambientais na percepção da população. Para 79% dos entrevistados, cabe ao poder público liderar esse tipo de agenda. As empresas são lembradas por 53% e as organizações da sociedade civil por 10%, proporção que se mantém estável ao longo da série histórica.
Quando o foco passa da responsabilidade para a prática, o cenário é de ceticismo. A maior parte dos entrevistados avalia que governos e empresas têm atuado pouco para melhorar questões sociais e ambientais. As ONGs recebem avaliações mais positivas entre os mais jovens, que tendem a reconhecer maior esforço dessas organizações.
O estudo mostra que o termo “marketing de causa” continua restrito a uma parcela pequena da população. Apenas 20% dos entrevistados afirmam já ter ouvido a expressão, mesmo após anos de presença do tema na agenda corporativa. O conhecimento é mais concentrado nas faixas de maior renda, onde chega a 36%, e entre os jovens da geração Z, com 29%.
Mesmo com baixa familiaridade com o nome técnico, a ideia por trás da prática encontra ampla aceitação:
Os resultados sugerem ainda que a barreira está na terminologia, e não na compreensão ou na aprovação do tipo de iniciativa.
A pesquisa aponta que o consumo associado a causas perdeu força no último ano. Práticas que costumavam indicar algum nível de engajamento registraram queda em todos os indicadores avaliados.
A retração ocorre em um cenário no qual o custo de vida segue como fator decisivo na escolha de produtos e serviços.
Para 68% dos entrevistados, o preço não pode aumentar em função do apoio a uma causa, percepção que se intensifica desde 2019.
O estudo aponta que essa expectativa limita o espaço de atuação das marcas quando o impacto financeiro é transferido ao consumidor.
A lembrança espontânea de campanhas de marketing de causa continua limitada. Só 19% dos entrevistados conseguem citar alguma iniciativa sem auxílio, um patamar que reforça a dificuldade das marcas em sustentar presença contínua na memória do público.
Entre as ações mencionadas, aparecem: McDia Feliz (Méqui), Natura, Criança Esperança, Teleton e campanhas do Boticário — todas associadas a projetos recorrentes ou de grande exposição.
A baixa taxa de lembrança indica que, mesmo quando as empresas investem em causas, a comunicação tende a ser pontual ou pouco integrada ao dia a dia das pessoas.
Além disso, o excesso de temas urgentes disputa atenção com iniciativas sociais, o que reduz ainda mais o espaço para campanhas que não mantêm continuidade.
O relatório aponta quatro caminhos para fortalecer a relação entre marcas, causas e sociedade.
1. Comunicação contínua: necessidade de mais clareza, foco e conexão com o cotidiano para melhorar a compreensão das iniciativas.
2. Impacto perceptível: o público quer resultados concretos — quanto mudou, para quem mudou, o que avançou. Quando o consumidor enxerga resultado real, ele sabe que não é discurso — é entrega
3. Sem repassar custos: com o preço como principal limite ao engajamento, ações ligadas a causas não podem elevar o valor do produto. A participação esperada do consumidor é a escolha, não o custo
4. Reconstrução da confiança: constância narrativa, impacto comprovado e respeito ao poder de compra aparecem como requisitos para recuperar e sustentar confiança, tratada como “a chave” nesse processo