Marketing

Como as empresas humanizadas vão revolucionar a gestão e o marketing

A humanização da gestão está moldando os negócios, criando novas formas de relacionamento e impacto no mercado

Empresas mais humanas: como a gestão e o marketing estão evoluindo para criar conexões autênticas e gerar impacto positivo na sociedade (Thinkstock)

Empresas mais humanas: como a gestão e o marketing estão evoluindo para criar conexões autênticas e gerar impacto positivo na sociedade (Thinkstock)

Publicado em 7 de janeiro de 2025 às 14h44.

Tudo sobreestrategias-de-marketing
Saiba mais

Olhar as tendências futuras pode ser encarado com pragmatismo ou esperança. Aqui, compartilho uma visão esperançosa sobre a evolução da gestão empresarial e do marketing rumo a relações mais humanas. Essa é uma tendência que tem o potencial de se desdobrar em muitas vertentes e mudar a forma como empresas e pessoas se relacionam.

Estou profundamente envolvido com o marketing humanizado desde que fui convidado a ser coautor da edição brasileira do livro Marketing H2H, com Philip Kotler. Essa abordagem já vinha sendo desenvolvida por mim nos últimos anos e foi intensificada pela participação nesse projeto. Mas, o conceito do Marketing H2H vai além do marketing em si, propondo uma gestão empresarial mais humanizada como um todo.

A humanização da gestão é uma necessidade que se intensifica com o aumento da complexidade do mundo em que vivemos. Hoje, as relações de causa e efeito são difíceis de identificar, e as mudanças ocorrem de forma rápida e constante. Portanto, precisamos ser extremamente flexíveis e adaptáveis em nossas estratégias. Isso não significa abrir mão de metas e objetivos claros, mas reconhecer que a forma de alcançá-los tenderá a variar ao longo do tempo.

Em um mundo complexo, as pressões são mais intensas e provenientes de múltiplos stakeholders, e o processo de gestão deve ser mais permeável às influências externas. A empresa deve ser capaz de conviver harmonicamente com o seu ambiente e mudar de acordo com as suas demandas. O exemplo recente do Carrefour ilustra claramente essa necessidade de adaptação.

O CEO global do Carrefour, em uma tentativa de ganhar a simpatia dos produtores franceses, disse que não compraria mais carne do Brasil em função da suposta baixa qualidade do produto. Isso soou como música na França, mas foi visto como uma ofensa no Brasil. E levou a uma reação da comunidade brasileira, em especial dos frigoríficos, que disseram: 'se a carne do Brasil não serve para o Carrefour da França, também não serve para o Carrefour Brasil', e deixaram de entregar produtos nas lojas.

Obviamente, isso poderia resultar em um impacto considerável no faturamento da empresa. A pressão da comunidade surtiu efeito, levando o CEO do Carrefour a enviar uma carta ao governo brasileiro pedindo desculpas e reafirmando que a carne do Brasil tem qualidade e é saborosa. Mudança de estratégia e crise superada.

Esse é apenas um entre tantos exemplos de empresas que precisam rever suas ações e estratégias em função da pressão da comunidade. A Heinz precisou voltar a comprar tomates de produtores locais no Canadá. A Heineken transferiu o local de sua fábrica em Minas Gerais. A AB InBev alterou a diretoria da marca Bud Light nos EUA e passou a adotar um cuidado maior na forma como realiza ações com influenciadores. Tudo isso mostra que uma empresa deve estar cada vez mais conectada ao seu ecossistema, interagindo com ele e criando valor para todos os envolvidos.

Livro Marketing H2H: A Jornada para o Marketing Human to Human, publicado pela Editora Benvirá (Editora Benvirá/Divulgação)

Philip Kotler recentemente afirmou que a relação que as empresas devem estabelecer com seus ecossistemas é semelhante às relações de uma cidade pequena. Em uma cidade pequena, todos se conhecem. Se você fosse dono do único posto de gasolina, poderia até abusar do seu poder e vender gasolina mais cara, já que as pessoas não iriam rodar dezenas de quilômetros até outra cidade para abastecer.

No entanto, isso não faria de você alguém muito querido. No nosso mundo globalizado, cheio de megalópoles, as empresas e executivos se escondem por trás da impessoalidade dessas relações para realizar ações que não seriam exatamente éticas e que receberiam olhares de desaprovação se fossem feitas numa cidade pequena.

Mas os exemplos mostram que os olhares de desaprovação estão presentes até em negócios teoricamente impessoais. Por isso, as relações estabelecidas entre as empresas devem se pautar menos pelo poder de barganha e mais pelo respeito comunitário. Se a tendência é essa maior integração com o ecossistema, como isso influenciará a gestão das empresas nos próximos anos?

O primeiro ponto é que as empresas precisam compreender o papel que desempenham em seu ecossistema. Isso pode ser feito por meio de tipos específicos de pesquisa de mercado, como os modelos Delphi, que indicam à empresa o que seus principais stakeholders esperam dela.

A partir desse conhecimento, é necessário refletir sobre a essência e o propósito da empresa, bem como o papel que ela desempenha, ou deveria desempenhar, na sua comunidade. A ideia aqui é montar estratégias para que o ecossistema perceba a empresa como um membro valioso da comunidade. Quando isso ocorre, a empresa começa a colher vantagens: fornecedores dedicam mais recursos, colaboradores se tornam mais engajados, a sociedade apoia suas iniciativas, investidores sentem maior segurança em continuar a investir e o custo de capital diminui. Portanto, a gestão do futuro é tentar tornar o ecossistema atraente.

Mas a interdependência precisa gerar vantagens mútuas. Ou seja, todos devem extrair valor das relações: fornecedores, distribuidores, clientes, consumidores, colaboradores, acionistas e a sociedade como um todo. Assim, a estratégia deixa de ser decidida de forma unilateral, pois, para se concretizar, é preciso convencer outros a participarem. São necessários planos mais flexíveis, mais adaptáveis e mais emergentes.

O objetivo final está presente, mas funciona como uma direção e um sentido. O caminho é traçado considerando a perspectiva de todos os stakeholders, enquanto as ações são guiadas pela essência das organizações e refletidas nos comportamentos e atitudes do dia a dia – o que chamamos de cultura. Isso representa uma grande vantagem em relação aos rígidos '5 year plans' (planos quinquenais) determinados pela alta direção e consultorias no passado, que não se mostram mais viáveis com as demandas do mundo complexo.

Além dos '5 year plans', entendo que duas frases muito comuns na gestão precisam ser ressignificadas. A primeira é: 'não podemos deixar dinheiro na mesa'. Se essa afirmação for usada para evitar desperdícios, tudo bem, ela continua justa. Mas, se for um argumento para que as empresas utilizem seu poder de barganha para desproporcionalmente extrair valor de sua comunidade, é preciso revisá-la. Isso porque, embora possa gerar resultados no curto prazo, também representa um risco significativo no longo prazo. O caso das Americanas ilustra essa lógica, assim como o do medicamento Daraprim, nos EUA.

A segunda frase é mais comumente usada em inglês: 'don’t hate the player, hate the game', ou seja, 'não odeie o jogador, odeie o jogo'. Essa expressão permite que empresas e gestores se eximam de responsabilidades, sugerindo que suas decisões não são resultado de interesses individuais, mas simplesmente 'parte do jogo'. Além disso, insinua que, se outras empresas estão adotando práticas eticamente questionáveis, isso legitimaria fazer o mesmo, afinal, 'faz parte do jogo'. Essa postura, embora imatura, é muito comum. Lembro-me dos casos de indústrias farmacêuticas que pagam médicos para receitar produtos, como os retratados na série Império da Dor, da Netflix. É preciso, em muitos casos, mudar o jogo.

Aliás, as grandes inovações são, justamente, fruto de mudanças no jogo. Essas mudanças podem ter impactos positivos ou negativos na sociedade. Aqui, claro, imaginamos uma mudança para melhor, e isso depende da maturidade e da consciência de cada executivo e gestor.

Como mencionei na abertura deste artigo, talvez essa seja mais uma esperança do que uma tendência. No entanto, há indícios de que ela pode estar se tornando realidade. E será maravilhoso se essa tendência se consolidar como uma prática comum nos negócios e na sociedade. Afinal, muitas empresas já contribuem para avanços sociais e ambientais, tornando o mundo um lugar melhor. A esperança é que todas, sem exceção, façam o mesmo no futuro.

Acompanhe tudo sobre:estrategias-de-marketingGestãoEmpresas

Mais de Marketing

F1: MSC Cruzeiros assume naming rights do GP de São Paulo em 2025

Luciano Huck é o novo embaixador da Stone em campanha para empreendedores

Como o Red Bull Bragantino foi campeão fora de campo e deu ‘asas’ aos seus torcedores

Tendências de inteligência artificial generativa para potencializar CRM’s