Minhas Finanças

Ações da Vale continuam um bom negócio

Para analistas, incertezas quanto à manutenção de Agnelli e desaceleração chinesa ainda não abalam perspectivas de crescimento da mineradora

Vale teve resultados recordes em 2010 e planeja investir 24 bilhões de dólares neste ano. (Agência Vale)

Vale teve resultados recordes em 2010 e planeja investir 24 bilhões de dólares neste ano. (Agência Vale)

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Da Redação

Publicado em 25 de fevereiro de 2011 às 09h45.

São Paulo - Nem a desaceleração da economia chinesa, nem a troca de liderança, nem a queda no preço do minério de ferro, nem o câmbio valorizado, nem o aumento dos royalties da mineração. Nenhum desses temores abala o prestígio da Vale, cujos papéis foram os campeões de recomendações pelas corretoras no ano passado. A combinação entre as boas perspectivas e os resultados recordes em 2010 resulta em um otimismo que, pelo menos neste ano, deve superar as inseguranças.

“Um grande sim”, diz o analista Felipe Reis, do Santander, quando perguntado se as ações da mineradora são um bom negócio. “É o meu papel predileto nos setores que eu cubro”, completa, se referindo às áreas de mineração, siderurgia e papel e celulose. Nos primeiros meses de 2011, a Vale repetiu o feito de 2010 e continuou sendo a empresa mais recomendada pelos analistas. Das 22 corretoras ouvidas por Exame.com no início de fevereiro apenas duas não incluíam as ações da mineradora na lista de preferidas. “O cenário da empresa é claramente positivo. As ações são interessantes para o investidor de longo prazo, mas até mesmo no curto e no médio prazos”, avalia Antonio Emílio Ruiz, analista do BB Investimentos.

O ano de 2010 foi excelente para a Vale, que obteve resultados recordes bastante superiores aos resultados anuais anteriores à crise. No balanço divulgado nesta sexta-feira (25), a empresa registrou uma receita operacional de 85,3 bilhões de reais, um EBITDA (lucro antes de juros, impostos e amortizações) de 46,3 bilhões de reais e um lucro líquido de 30 bilhões de reais. Em comparação ao trimestre anterior, no entanto, o balanço do quarto trimestre teve uma pequena queda.

Na Bolsa, a valorização dos papéis da Vale está longe das mais exorbitantes, mas seu desempenho não tem sido exatamente ruim. Em 2010, foram os papéis da mineradora que seguraram o Ibovespa no azul. Em um ano em que as ações da Petrobras viram um tombo de 25%, foi a valorização de quase 18% dos papéis preferenciais da Vale (VALE5) que gerou a leve alta de 1,04% do índice.

Mesmo andando de lado em 2011, as ações da Vale ainda têm espaço para crescer ao longo do ano, dizem analistas. A maioria das corretoras aposta em um preço alvo entre 60 e 70 reais para as ações preferenciais, uma valorização mínima de 20% em 2011. “A alta no preço do minério vai se refletir no preço das ações no decorrer do ano. Os papéis da Vale ainda estão baratos, mesmo em comparação às suas concorrentes no mercado mundial, a BHP e a Rio Tinto”, diz o analista do Santander.

“Mesmo trabalhando com premissas mais conservadoras que o consenso em relação ao preço do minério de ferro para 2011 e 2012, vemos a ação ainda bastante descontada em termos de avaliação. Temos preço alvo em 12 meses de 67 reais para as ações ordinárias e 57,50 reais para as ações preferenciais”, diz Carlos Nunes, estrategista de renda variável do HSBC.


Fôlego nos investimentos

Após o período de corte de custos que se seguiu à crise de 2008, a Vale mostra, em 2011, que está retomando seu crescimento a todo vapor. O plano de investimentos de 24 bilhões de dólares para este ano é quase o dobro dos 13 bilhões previstos para 2010. Desse montante, 81,3% serão destinados a pesquisa e desenvolvimento e a projetos novos e de expansão, a maior parte na produção de minério de ferro (35,5% ou 8,5 bilhões de dólares). Mais de 60% dos recursos serão aplicados no Brasil, em estados como Pará, Minas e Espírito Santo, mas também há projetos previstos em países da África, do Oriente Médio, na Indonésia e no Canadá.

Atividades secundárias também receberão vultosos investimentos, como a produção de níquel e cobre, que assiste a uma retomada e recebe 4,3 bilhões de dólares. A logística não ficará de fora, com recursos destinados a ferrovias, terminais marítimos, navegação e geração de energia. No ramo de fertilizantes, a Vale também pretende firmar posição. “A empresa quer continuar aproveitando o crescimento chinês, com uma maior demanda de produção de alimentos e a escassez de terras agricultáveis”, afirma William Castro Alves, analista da XP Investimentos, que em fevereiro acrescentou à carteira recomendada as ações da Vale Fertilizantes.

Com esses investimentos, a Vale espera uma taxa de crescimento na produção de 16,3% ao ano entre 2011 e 2015, contra uma taxa de 9,8% entre 2003 e 2008. Espera-se que em 2015 a produção de minério de ferro supere as 500 milhões de toneladas por ano, ultrapassando com folga a estimativa de 350 milhões de toneladas anuais que seriam produzidas nessa data pela concorrência.

É claro que aumento na oferta em um mundo que já espera alguma desaceleração no crescimento chinês deverá impactar os preços do minério. Os patamares atuais, na faixa dos 200 dólares por tonelada, já são considerados insustentáveis, tendo em vista o aumento da oferta que deve ocorrer ainda em 2011. A escassez de oferta que decorre da crise de 2008 e da falta de concorrência no setor será abrandada, mas o retorno do crescimento da Europa e dos Estados Unidos deverá trazer equilíbrio para o lado da demanda.

De qualquer maneira, o mercado não espera efeitos muito negativos para os papéis da Vale decorrentes de uma queda iminente nos preços do minério de ferro. Algumas análises já levam em conta essa provável queda. O HSBC, por exemplo, trabalha com uma projeção de 136 dólares por tonelada em 2010 e 110 dólares por tonelada em 2012.

A avaliação do analista do BB Investimentos, Antonio Emilio Ruiz, também atesta essa tendência. “O preço do minério ainda deve se sustentar alto em 2011 e 2012, mas uma queda gradual do preço em dólar é esperada. Sendo muito conservador, uma redução mais expressiva deve ocorrer em 2013. Mas uma queda muito abrupta parece algo cada vez mais distante”, diz Ruiz.


Inseguranças quanto ao timoneiro

Nem só de investimentos viverá a Vale em 2011. Este ano e o próximo também serão os anos de ver alguns frutos, como a entrada em funcionamento de 18 projetos no valor de 26 bilhões de dólares. Mas é claro que, mesmo com toda essa euforia, há preocupações que o investidor deve considerar.

Dos dois principais riscos, um é interno e diz respeito a uma possível mudança de liderança na companhia. Desde 2008 circulam rumores sobre a substituição de Roger Agnelli no comando da Vale em meados deste ano, o que poderia ter um impacto negativo nos papéis da empresa caso o novo ocupante do cargo se revelasse alinhado demais aos interesses governistas.

A tensão em torno do caso começou em razão da crise, quando o então presidente Lula criticou abertamente a postura da Vale de cortar gastos e pessoal. Haveria também um desejo de Lula de que a empresa investisse mais em siderurgia, de modo a se alinhar a um interesse nacional. O fantasma da ingerência política passou a pairar sobre a Vale que, embora privada, conta com uma polpuda participação dos fundos de pensão estatais na Valepar, sua controladora. Supõe-se que o mal estar com Lula tenha se transferido a sua sucessora, mas a empresa vem negando os rumores repetidamente.

“Esse é o risco mais palpável para a Vale no curto prazo. O mercado interpreta uma substituição como um risco de aumento da influencia governamental na companhia, sobrepondo investimentos de interesse nacional àqueles mais rentáveis, de interesse da empresa e dos acionistas”, explica Felipe Reis, do Santander. O analista ressalva, porém, que tudo vai depender de quem seria o novo nome, se alguém mais próximo ao governo ou alguém mais ligado ao mercado. “O problema é que essa indefinição, no curto prazo, tem afetado os papéis da Vale”, diz Reis.

Para o lugar de Agnelli estariam cotados Rossano Maranhão, presidente do Banco Safra e ex-presidente do Banco do Brasil; Otávio Azevedo, presidente-executivo da Andrade Gutierrez; Fábio Barbosa, presidente do Conselho de Administração do Santander; Wilson Brumer, presidente da Usiminas e ex-presidente da Vale; e Luciano Coutinho, presidente do BNDES.

Demanda chinesa deve continuar forte

No campo externo, a dependência do mercado chinês é o outro grande risco para a Vale. O crescimento vertiginoso experimentado pelo país nos últimos anos começa a dar sinais de perda de fôlego, e a pressão inflacionária já levou o governo a tomar medidas como o aumento da taxa de juros e dos depósitos compulsórios dos bancos. Mas o mercado, por enquanto, minimiza essas preocupações.


“Essa percepção inflacionária na China é muito por conta do preço dos alimentos”, afirma William Castro Alves, da XP Investimentos. Uma desaceleração no crescimento, porém, é tida como certa, e pode sim impactar negativamente os papéis da mineradora. “Uma desaceleração mais forte do crescimento chinês para 2011 e 2012 caracteriza-se como um risco de baixa para as ações da Vale ao longo dos próximos trimestres”, diz Carlos Nunes, estrategista de Renda Variável do HSBC, que acredita num crescimento chinês de 8,9% em 2011 e 8,6% em 2012.

Para Antonio Emilio Ruiz, do BB Investimentos, no entanto, a pressão inflacionária não representa um fator de risco muito intenso. “Se o crescimento chegar a um patamar de 7% ou 8%, mais sustentável, talvez haja alguns reajustes, mas não quer dizer que a China vai parar de crescer”, explica. “Flutuações no ritmo atual de crescimento da China não preocupam, a menos que uma grande crise aconteça, o que não está no radar de ninguém. Uma pequena queda no ritmo de crescimento não terá efeito algum nas ações da companhia”, acredita Felipe Reis, do Santander.

Apesar desse risco econômico, o mercado e a própria Vale acreditam que a demanda chinesa continuará forte nos próximos anos, ainda que a tendência do país seja crescer cada vez menos. O intenso processo de urbanização do gigante asiático impulsiona seu mercado imobiliário, que responde por 40% do consumo de aço do país e por 20% do consumo de minério mundial. A produção de veículos, por sua vez, embora ainda pequena, vem crescendo a passos largos. “A China vai continuar sendo o motor do crescimento”, afirma Alves, da XP.

Há outros fatores que beneficiam a Vale no mercado internacional. A qualidade do minério, por exemplo, faz com que o produto da mineradora brasileira se sobreponha ao chinês, cujo grau de impureza é considerável. Isso sem contar os gargalos logísticos no território chinês. Pagar um preço mais alto por esse minério mais puro acaba valendo a pena.

As taxas de exportação mantidas pela Índia, grande consumidora de minério, também contribuem para a escassez da oferta, pois desestimulam a entrada do minério indiano no mercado global. Soma-se a isso a recuperação econômica da Europa e dos Estados Unidos, que vêm engordar a demanda por minério de ferro. “Esse potencial de melhora econômica ainda não foi totalmente precificado”, alerta o analista da XP.

Quanto aos riscos internos do Brasil, os analistas acabam por minimizá-los. O câmbio valorizado é visto como potencialmente prejudicial às exportações, uma vez que levaria a Vale a faturar menos em real. “Mas isso já foi compensado no aumento de preços. Além do mais, a Vale deve aumentar sua produção e venda nos próximos anos” balanceia Antonio Emilio Ruiz, do BB Investimentos.

Uma possível alta nos royalties da mineração também poderia assustar, mas o mercado já está de sobreaviso. Embora ainda não haja certezas em relação ao percentual dos lucros que corresponderia aos royalties, o governo deseja uma redução da carga tributária para equilibrar o aumento. A discussão é antiga e a mudança é bastante provável. “Essa é uma tendência internacional. Os royalties no Brasil, hoje de 2% dos lucros, são considerados baixos”, explica o analista do Santander. “A mudança não impactaria fortemente os lucros da Vale, nem seria determinante no preço das ações”, completa William Castro Alves, da XP.

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