Fundos de previdência terão nova classificação
O mercado de previdência privada aberta vem mudando muito nos últimos anos, com as plataformas de investimentos como a XP, Guide, Genial ou BTG, por exemplo
Da Redação
Publicado em 17 de maio de 2019 às 12h16.
Última atualização em 2 de julho de 2021 às 16h24.
Por Arena do Pavini
Uma das maiores dificuldades para os investidores em previdência privada aberta no Brasil, vendidos como PGBL e VGBL, é acompanhar o desempenho de seus investimentos. O motivo é que não há uma classificação específica para essas carteiras, que têm características diferentes dos fundos de investimento em geral. Assim, é difícil comparar a rentabilidade desses fundos de previdência, pois não se sabe exatamente se as estratégias são as mesmas. O mesmo vale para os rankings de desempenho, que acabam distorcidos pela falta de certeza de que se está comparando coisas semelhantes.
Essa situação, que acaba sendo conveniente para os grandes bancos, que controlam a maior parte do mercado de previdência aberta, deve mudar nos próximos meses. A Associação Nacional das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais ( Anbima ) está criando uma classificação específica para os fundos de previdência, de acordo com suas características. Em parceria com a Federação Nacional de Previdência Privada e Seguros (Fenaprevi), a entidade está discutindo essas novas categorias, explica Luiz Carvalho, responsável pela Distribuição e Previdência na área de Representação da Anbima.
Carvalho lembra que o mercado de previdência privada aberta vem mudando muito nos últimos anos, com as plataformas de investimentos como a XP, Guide, Genial ou BTG Pactual permitindo que novos gestores ofereçam fundos de previdência para o grande público. Antes, com a distribuição limitada às agências dos grandes bancos, esses gestores não tinham como acessar o varejo. Isso acaba permitindo a entrada no mercado de novos gestores, mais especializados, e provocando uma diversificação natural e maior competição também na previdência privada.
Segundo Carvalho, as duas associações estão discutindo a melhor forma de classificar esses fundos. Os chamados fundos previdenciários são fundos abertos para receber os recursos dos planos de previdência PGBL e VGBL vendidos pelos bancos aos seus clientes. Há uma diferença entre plano e fundo, já que o plano é uma espécie de projeto para a aposentadoria que calcula o tempo e o valor necessários para obter determinada renda. Já o fundo é onde o dinheiro é aplicado para o plano obter o resultado desejado. O plano inclui compromissos da seguradora com o segurado, mas como no Brasil a previdência ainda é vista mais como um investimento apenas, o que acaba importando mesmo é o desempenho dos fundos.
Há ainda uma classificação antiga, baseada nos fundos balanceados, que previam a aplicação da maioria dos recursos em renda fixa e parcelas de 15%, 20%, ou 30% em ações. Mas o grosso das aplicações, mais de 90% está em fundos de renda fixa, que não apresentam um detalhamento de suas estratégias. Nos fundos de ações e multimercados, a classificação é até mais simples, pois não há muita diferenciação dos fundos de investimentos. Até porque eles representam uma parcela muito pequena do patrimônio de previdência aberta.
“Com a evolução do mercado, vimos a necessidade de rediscutir a classificação”, afirma Carvalho, lembrando que, recentemente, a Anbima fez uma reclassificação dos fundos de investimentos abertos. “Estamos tentando atualizar os previdenciários também”, explica.
Renda fixa é maior problema
Com mais ou menos 90% do mercado, a categoria renda fixa é onde existe a maior dificuldade em classificar os fundos previdenciários. A ideia é começar separando os fundos pelo prazo de vencimento dos papéis que formam sua carteira, ponderado pelo volume, definindo a chamada “duração”, ou “duration”, que pode ser curta, média ou alta. Para os fundos de investimento, essa classificação já é feita, mas os critérios de curto, médio e longo prazo para previdência são diferentes, explica Carvalho.
Há ainda a ideia de separar fundos com ou sem crédito privado, que compram papéis de empresas privadas ou apenas papéis do governo, ou misturam os dois. Mesmo entre os que só compram papéis do governo, há os que podem ter apenas papéis indexados à inflação de curto prazo ou de longo prazo ou serem mistos.
Há ainda os fundos passivos, que apenas reproduzem índices de renda fixa ou de ações, e por isso têm taxas de administração mais baixas, e os fundos ativos, que buscam superar os índices com gestão ativa. “Isso tudo dá a maior discussão para se chegar a uma fórmula comum”, explica Carvalho.
Segundo ele, há um grupo de trabalho formado pelas duas associações que já fez duas reuniões para definir as linhas da classificação. E a linha parece ser definir uma duração (duration) das carteiras específica para os fundos de previdência. “Um fundo de curto prazo comum tem duração média de 21 dias, enquanto um de previdência vai ter um ano pelo menos, são coisas diferentes”, explica Carvalho.
A discussão é facilitada pelo fato de que muitos dos bancos e seguradoras que formam a Fenaprevi também participam da Anbima. E há desde a seguradora Icatu, que não tem rede de agências, mas que cresceu bastante nos últimos anos com fundos de previdência de gestores independentes, até os líderes de mercado como Itaú e Bradesco. “Todos se envolvem nas discussões”, afirma Carvalho. “Mas é a Fenaprevi que reúne os ‘consumidores’ dos fundos previdenciários, então são eles que aplicam nos fundos de previdência e as classes terão de atender aos interesses deles”, acrescenta.
A segregação também é muito boa para o investidor, pois, ao identificar as estratégias dos fundos, ela vai mostrar os tipos diferentes de cada categoria. “Isso permite comparar os comparáveis e isso é bom para todos”, explica Carvalho. “Quebrando os fundos de acordo com sua estratégia, conseguimos segregar melhor e identificar quem está indo bem ou não, sem o risco de comparar coisas diferentes”, diz.
Isso também vai melhorar a concorrência entre as instituições e mesmo atender melhor a diversificação dos clientes. “A seguradora X vai vender um fundo para o cliente que já tem esse tipo de fundo pode comparar ou oferecer um outro tipo, isso muda o discurso na hora de oferecer os produtos”, diz Carvalho. “Hoje, é tudo renda fixa, um balaião enorme”, afirma.
Melhora no suitability
Para Carvalho, a nova classificação reflete o amadurecimento do mercado, com novos participantes e novas opções de investimento. E ela vai também melhorar o suitability, a adequação dos fundos de previdência ao perfil do investidor. “Conseguindo segregar melhor os produto diferentes, também trazemos um grande benefício para o consumidor final na hora de escolher, com maior transparência, aquilo que ele está investindo”, diz.
A ideia inicial é avançar nessa definição de classes neste semestre, para que elas comecem a funcionar no fim do ano. “Tem discussão, aprovação pela associação, depois os participantes vão ter de identificar em quais categorias seus fundos se encaixam”, explica Carvalho. Depois, a Anbima vai conferir se a classificação entregue pelos gestores está correta e verificar se ela é coerente com os dados históricos do fundo, para transferir e mudar sua base de dados. “O fundo já existe, por isso é preciso pegar o histórico e transferir esses dados para a nova classificação”, afirma. Depois, a Anbima vai ainda conferir se o desempenho do fundo bate com os referencias do mercado e com seus pares.
É uma coisa até que deixa a concorrência mais leal, afirma Carvalho, já que um gestor pode colocar um fundo de “duration” (prazo médio ponderado da carteira) mais longo como sendo de duration baixa e, na comparação com os seus pares, terá um desempenho muito melhor pois o fundo de longo prazo corre mais riscos e costuma ter rendimento maior. Ao mesmo tempo, esse fundo poderá causar um prejuízo de curto prazo para um investidor que não estava esperando e não queria correr esse risco por estar perto da aposentadoria. “E é preciso também analisar para ver se não há desenquadramento em relação ao desempenho”, afirma Carvalho.
Isso permitirá também ao regulador, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) fiscalizar se os gestores estão cumprindo seus mandatos de acordo com o acertado com os clientes. Em geral, reguladores como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) já acompanham o desempenho dos fundos abertos para verificar se há alguma variação maior que aponte alguma coisa errada em sua gestão diária. Com as categorias, a Susep deverá fazer o mesmo com mais facilidade.
FenaPrevi analisa proposta e pode aprovar em junho
Em nota, Marcelo Wagner, presidente da Comissão de Investimentos da FenaPrevi, disse que a proposta criada pelo grupo de trabalho conjunto com a Anbima seguiu para processo decisório de governança da entidade. A expectativa é que esteja aprovada em meados de junho.
Segundo Wagner, a reclassificação dos fundos de previdência é um importante passo para a introdução de melhorias nos processos de venda ou portabilidade de planos. “Proporcionará maior transparência e melhorará o processo de distribuição”, acrescentou. Do ponto de vista institucional, o trabalho só reforça a grande parceria que a FenaPrevi e a Anbima mantêm.
Sobre os benefícios para os investidores, Wagner destaca que os participantes dos planos de previdência privada serão os grandes beneficiados com a reclassificação. “Se o cliente tem um plano hoje que acessa fundos de renda fixa (papeis soberanos), ficará mais evidente se alguém lhe oferecer investimentos em multimercado e/ou renda fixa crédito privado”, exemplifica. “Em resumo, estamos dando um importante passo em termos de suitability no setor”, concluiu.
Esta reportagem foi publicada originalmente naArena do Pavini.