Devo conversar sobre dinheiro com meus filhos?
Internauta quer saber se abrir o assunto às crianças logo cedo pode prejudicá-las
Da Redação
Publicado em 26 de julho de 2012 às 15h49.
Dúvida da internauta: Na minha infância meus pais e eu nunca falamos sobre dinheiro. Já na infância do meu marido era costume falar até durante as refeições. Agora que formamos uma família, ele procura conversar abertamente sobre o assunto, enquanto eu prefiro deixar reservado a nós dois. Quem está certo? Devo mudar minha atitude? Será que não vou prejudicar a relação com os pequenos se começar a trazer esse assunto desde cedo?
Resposta de Celina Macedo*:
É em casa que aprendemos e trocamos conhecimentos. É onde os filhos recebem educação para a vida. E nessa educação está incluída a financeira. Portanto, dinheiro é assunto de criança.
Os pais que evitam falar sobre dinheiro na frente dos filhos geralmente são motivados por um sentimento de proteção e acreditam que esse é um problema do qual as crianças devem ser preservadas. Mas os filhos que presenciam conversas sobre a situação financeira da família – desejos, metas e estratégias – não entendem dinheiro como um problema e, sim, como solução.
O dinheiro é entendido como solução inclusive quando os pais falam sobre a falta dele e buscam alternativas para gastar menos do que recebem. Ou seja, quando os pais estão fazendo uma análise detalhada do orçamento da família e observam para onde está indo o dinheiro, quando elegem prioridades no consumo e cortam desperdícios ou gastos que não melhoram a qualidade de vida da família, eles estão ensinando aos filhos a fazer uso consciente e responsável do dinheiro.
Ao ouvir essas conversas, as crianças nem sempre estão entendendo todos os detalhes, mas certamente elas percebem pelos atos e posturas dos pais que eles estão cuidando do dinheiro. E muito cedo elas notam que dinheiro é um meio para se adquir alguma coisa. Quando, por volta dos dois anos, a criança vem com a famosa frase “compra mãe?”, é sinal de que esse conceito já está internalizado.
Portanto, as lições sobre dinheiro entram na vida delas desde muito cedo. E, atenção: as crianças aprendem mais pelos exemplos do que ouvindo conversas. Filhos de pais que gastam mais do que ganham tendem a se tornar adultos descontrolados com dinheiro ou excessivamente poupadores – e nenhum dos dois comportamentos é bom.
Mais do que ouvir, as crianças devem ser chamadas para participar das conversas sobre o dinheiro da família. Aqui é importante levar em consideração a linguagem e o conteúdo que deve ser adaptada ao universo da criança. Essa linguagem deve fazer sentido e ter um propósito.
Por volta dos 3 anos a criança entra na “fase dos por quês”, quando sente necessidade de obter explicações sobre determinados fatores que a rodeiam. Isso mostra que ela está atenta a sua volta. Uma pergunta como “por que você não compra esse carrinho?” pode ser aproveitada para explicar porque ela não vai receber presentes fora de datas específicas, como o aniversário, e que ela deve esperar até lá. A mesma pergunta serve como gancho para ensinar a criança que é necessário trabalhar e se esforçar para ter dinheiro. Os pais podem dizer o que realmente fazem, que é bom trabalhar, que quando a família gasta mais é preciso trabalhar por mais tempo – o que significa menos horas de brincadeira com o filho. Indo por esse caminho, a criança vai compreender.
Por volta dos 5 anos o filho já é capaz de fazer pequenas compras. Na padaria, por exemplo, você pode incentivá-lo a pedir e pagar pelo pão. Observe de longe enquanto ele cumpre a tarefa sozinho. Depois, fale sobre os valores, pergunte quanto ele entregou no caixa e peça que confira o troco.
Por volta dos 6 anos a criança pode começar a cuidar do próprio dinheiro. Se for possível, dê uma semanada e combine com ele quais gastos devem sair dali – por exemplo, o lanche da escola. Se o dinheiro acabar antes, não faça adiantamentos, sugira que o lanche seja levado de casa.
A partir dos 7 anos o filho já pode atrelar a conquista de algo que ele queira muito a algum objetivo da família. Por exemplo, a redução da fatura de energia elétrica. Você pode mostrar a conta para a criança e explicar que o valor é alto porque vocês estão fazendo disperdício, uma vez que muitas vezes as lâmpadas ficam ligadas sem ninguém no ambiente ou aquele aparelho de TV que ninguém está assistindo. Se ela ajudar a apagar as luzes, o valor da conta vai diminuir e vai sobrar dinheiro no final do mês para comprar o que ele quer. É uma boa oportunidade para ensinar o filho a planejar consumo. Esperar, poupar e ajudar com uma finalidade une a família e gera comprometimento. Com o tempo, colaborar e não cultivar desperdícios irá se tornar um hábito que será levado para toda a vida.
Independente da idade deles, seja claro ao responder aos pedidos dos filhos com “não posso dar” ou “posso dar, mas não quero”.
Longe de se sentir culpado por não realizar de imediato os sonhos de consumo deles, lembre que, ao incentivá-los a conquistar o que desejam, você os ensina também a suportar frustrações, a lidar com expectativas e a se empenhar para alcançar um objetivo. Pais que dão tudo que os filhos querem acabam tirando deles a oportunidade de desenvolver uma importante habilidade: a garra para superar os desafios.
Em todas as idades, educação é o melhor investimento. Vale para os filhos e para a família como um todo.
*Celina Macedo é doutora em Linguística com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva pela Université Libre de Bruxelas, onde trabalhou com as Percepções Subliminares do Dinheiro. É professora do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), conselheira do Instituto de Educação Financeira e autora do livro “Filhos: seu melhor investimento” (Campus/Elsevier).
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Envie suas dúvidas sobre planejamento financeiro, crédito e investimentos para seudinheiro_exame@abril.com.br.
Dúvida da internauta: Na minha infância meus pais e eu nunca falamos sobre dinheiro. Já na infância do meu marido era costume falar até durante as refeições. Agora que formamos uma família, ele procura conversar abertamente sobre o assunto, enquanto eu prefiro deixar reservado a nós dois. Quem está certo? Devo mudar minha atitude? Será que não vou prejudicar a relação com os pequenos se começar a trazer esse assunto desde cedo?
Resposta de Celina Macedo*:
É em casa que aprendemos e trocamos conhecimentos. É onde os filhos recebem educação para a vida. E nessa educação está incluída a financeira. Portanto, dinheiro é assunto de criança.
Os pais que evitam falar sobre dinheiro na frente dos filhos geralmente são motivados por um sentimento de proteção e acreditam que esse é um problema do qual as crianças devem ser preservadas. Mas os filhos que presenciam conversas sobre a situação financeira da família – desejos, metas e estratégias – não entendem dinheiro como um problema e, sim, como solução.
O dinheiro é entendido como solução inclusive quando os pais falam sobre a falta dele e buscam alternativas para gastar menos do que recebem. Ou seja, quando os pais estão fazendo uma análise detalhada do orçamento da família e observam para onde está indo o dinheiro, quando elegem prioridades no consumo e cortam desperdícios ou gastos que não melhoram a qualidade de vida da família, eles estão ensinando aos filhos a fazer uso consciente e responsável do dinheiro.
Ao ouvir essas conversas, as crianças nem sempre estão entendendo todos os detalhes, mas certamente elas percebem pelos atos e posturas dos pais que eles estão cuidando do dinheiro. E muito cedo elas notam que dinheiro é um meio para se adquir alguma coisa. Quando, por volta dos dois anos, a criança vem com a famosa frase “compra mãe?”, é sinal de que esse conceito já está internalizado.
Portanto, as lições sobre dinheiro entram na vida delas desde muito cedo. E, atenção: as crianças aprendem mais pelos exemplos do que ouvindo conversas. Filhos de pais que gastam mais do que ganham tendem a se tornar adultos descontrolados com dinheiro ou excessivamente poupadores – e nenhum dos dois comportamentos é bom.
Mais do que ouvir, as crianças devem ser chamadas para participar das conversas sobre o dinheiro da família. Aqui é importante levar em consideração a linguagem e o conteúdo que deve ser adaptada ao universo da criança. Essa linguagem deve fazer sentido e ter um propósito.
Por volta dos 3 anos a criança entra na “fase dos por quês”, quando sente necessidade de obter explicações sobre determinados fatores que a rodeiam. Isso mostra que ela está atenta a sua volta. Uma pergunta como “por que você não compra esse carrinho?” pode ser aproveitada para explicar porque ela não vai receber presentes fora de datas específicas, como o aniversário, e que ela deve esperar até lá. A mesma pergunta serve como gancho para ensinar a criança que é necessário trabalhar e se esforçar para ter dinheiro. Os pais podem dizer o que realmente fazem, que é bom trabalhar, que quando a família gasta mais é preciso trabalhar por mais tempo – o que significa menos horas de brincadeira com o filho. Indo por esse caminho, a criança vai compreender.
Por volta dos 5 anos o filho já é capaz de fazer pequenas compras. Na padaria, por exemplo, você pode incentivá-lo a pedir e pagar pelo pão. Observe de longe enquanto ele cumpre a tarefa sozinho. Depois, fale sobre os valores, pergunte quanto ele entregou no caixa e peça que confira o troco.
Por volta dos 6 anos a criança pode começar a cuidar do próprio dinheiro. Se for possível, dê uma semanada e combine com ele quais gastos devem sair dali – por exemplo, o lanche da escola. Se o dinheiro acabar antes, não faça adiantamentos, sugira que o lanche seja levado de casa.
A partir dos 7 anos o filho já pode atrelar a conquista de algo que ele queira muito a algum objetivo da família. Por exemplo, a redução da fatura de energia elétrica. Você pode mostrar a conta para a criança e explicar que o valor é alto porque vocês estão fazendo disperdício, uma vez que muitas vezes as lâmpadas ficam ligadas sem ninguém no ambiente ou aquele aparelho de TV que ninguém está assistindo. Se ela ajudar a apagar as luzes, o valor da conta vai diminuir e vai sobrar dinheiro no final do mês para comprar o que ele quer. É uma boa oportunidade para ensinar o filho a planejar consumo. Esperar, poupar e ajudar com uma finalidade une a família e gera comprometimento. Com o tempo, colaborar e não cultivar desperdícios irá se tornar um hábito que será levado para toda a vida.
Independente da idade deles, seja claro ao responder aos pedidos dos filhos com “não posso dar” ou “posso dar, mas não quero”.
Longe de se sentir culpado por não realizar de imediato os sonhos de consumo deles, lembre que, ao incentivá-los a conquistar o que desejam, você os ensina também a suportar frustrações, a lidar com expectativas e a se empenhar para alcançar um objetivo. Pais que dão tudo que os filhos querem acabam tirando deles a oportunidade de desenvolver uma importante habilidade: a garra para superar os desafios.
Em todas as idades, educação é o melhor investimento. Vale para os filhos e para a família como um todo.
*Celina Macedo é doutora em Linguística com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva pela Université Libre de Bruxelas, onde trabalhou com as Percepções Subliminares do Dinheiro. É professora do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), conselheira do Instituto de Educação Financeira e autora do livro “Filhos: seu melhor investimento” (Campus/Elsevier).
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