IA nas compras: avanço dos assistentes digitais redefine a disputa entre big techs e varejo. (Montagem feita com elementos do Canva)
Repórter
Publicado em 12 de dezembro de 2025 às 07h49.
O período de compras de fim de ano ganhou um novo protagonista: a inteligência artificial, agora vista por consumidores como um aliado para escolher presentes, comparar produtos e até concluir uma compra sem sair da conversa com um chatbot.
O movimento revela como a tecnologia está remodeando a dinâmica entre plataformas digitais e varejistas — e acelerando uma disputa por quem controla a jornada de consumo, segundo a The Economist.
Levantamentos recentes mostram que a transformação já está em curso. Uma pesquisa da Shopify indica que cerca de dois terços dos consumidores em países ricos pretendem usar IA para orientar suas compras de Natal, número que chega a cinco sextos entre jovens de 18 a 24 anos.
Já um estudo da McKinsey citado pela reportagem aponta que pedir recomendações de produtos é o segundo principal uso de IA generativa nos Estados Unidos.
Empresas de tecnologia apostam que a IA será tão disruptiva quanto o e-commerce nos anos 2000. O OpenAI firmou acordos com Shopify e Etsy para permitir vendas diretamente dentro do ChatGPT, criando um modelo que inclui repasse de taxas.
O Google também mira o chamado “comércio agentivo” e disponibiliza, nos EUA, ferramentas capazes de verificar estoques, monitorar preços e até concluir compras automaticamente quando surgem promoções — tudo por meio de suas soluções de IA.
De acordo com a The Economist, avanço dos agentes externos provoca relação no varejo. A Amazon, líder global em comércio eletrônico, bloqueou rastreadores do OpenAI e processa a Perplexity, acusando sua tecnologia de simular um usuário humano para coletar dados — algo que a empresa nega. O objetivo da varejista é claro: impedir que intermediários assumam o relacionamento com seus clientes.
Outras empresas adotam uma estratégia mais flexível. Em outubro, o Walmart anunciou que permitirá compras de seus produtos diretamente pelo ChatGPT. Analistas do banco Mizuho estimam que 4% do tráfego do site da companhia vem de referências externas, sendo um terço originado no chatbot da OpenAI. Para Doug McMillon, CEO do Walmart, a experiência digital precisa avançar além da barra de busca e das listas extensas de produtos.
Varejistas também estão investindo em seus próprios assistentes digitais. Pesquisas da Accenture indicam que consumidores americanos demonstram maior confiança nesses bots nativos do varejo do que em alternativas como o ChatGPT, especialmente quando a tarefa envolve compras.
Andy Jassy, CEO da Amazon, criticou publicamente os agentes de terceiros, afirmando que eles erram em personalização, histórico de compras, estimativas de entrega e até no preço. A empresa reforça que seu próprio assistente, Rufus, já foi usado por 250 milhões de clientes.
A eficácia dos bots, porém, varia conforme a categoria de produto. Julie Bornstein, fundadora da Daydream, afirma que as IAs funcionam bem em itens com especificações claras — como peso e potência em aspiradores — e têm desempenho razoável em produtos que combinam técnica e preferência pessoal, como cosméticos.
Em setores guiados por gosto e estilo, diz ela, a performance cai: “Categorias baseadas em gosto são completamente diferentes. Não se trata das especificações, mas da sensação e da vibração do produto”.
A reportagem afirmou que o Walmart já testa anúncios no seu assistente Sparky, enquanto o Google planeja incluir publicidade no Gemini no próximo ano, pensando em monetização. O movimento pode comprometer a sensação de neutralidade dos chatbots — ponto sensível para consumidores.
Por isso, marcas vêm repensando a maneira como se posicionam diante dos algoritmos. A Lily AI, por exemplo, coleta palavras e expressões usadas pelos consumidores nos chats e adapta o conteúdo dos sites de seus clientes para aumentar a chance de recomendação. Como explica a fundadora Purva Gupta, enquanto um varejista descreve uma peça como “French terry midnight blue”, o público pede por “navy hoodie”.
Um levantamento da Muck Rack que analisou mais de 1 milhão de links usados por chatbots: apenas 18% eram sites corporativos, enquanto veículos jornalísticos lideraram com 25%.
Para Mandeep Bhatia, da Tapestry, manter presença em blogs e revistas de moda é essencial, já que esses conteúdos são mais “frescos” — e a IA tende a priorizar material recente.
Um efeito inesperado da revolução digital é a nova valorização da experiência presencial. Com a navegação migrando para dentro dos chatbots, marcas veem na loja física uma forma direta de influenciar a percepção do cliente. A pesquisa da Shopify mostra que 75% dos consumidores dizem valorizar interações humanas ao comprar — proporção que era de pouco mais da metade em 2024.
Além disso, categorias como moda ainda dependem do toque, da prova e do contato visual com o produto. E, no fim do ano, a ida ao comércio tem um componente emocional que nenhuma tecnologia conseguiu substituir até agora.