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Editor do Future of Money
Publicado em 19 de dezembro de 2025 às 15h20.
Conforme o preço do bitcoin despencava no último trimestre deste ano, analistas começaram a compartilhar uma projeção que pareceria impossível para o mundo cripto até recentemente: o "ciclo de quatro anos" do bitcoin teria chegado ao fim. Na prática, as avaliações vão muito além da morte metafórica de um dos termos mais conhecidos para os investidores da criptomoeda.
A possibilidade rapidamente se alastrou no mercado. Entre os adeptos da teoria estão figuras como Cathie Wood, CEO da gestora Ark Invest e um dos nomes mais famosos de Wall Street, a gestora bilionária Bernstein e Guilherme Nazar, head para a América Latina da Binance, maior exchange do mundo cripto.
Em comum, as análises mostram que o bitcoin parece ter chegado em uma nova fase, alimentado pela ascensão de novos grupos de investidores. Como resultado, dinâmicas tradicionais por trás do preço da criptomoeda podem estar mudando, exigindo novas estratégias e adaptações aceleradas.
De forma simples, o ciclo de quatro anos do bitcoin pode ser definido como um padrão histórico de comportamento do preço da criptomoeda sempre divisível em intervalos de quatro anos, aproximadamente. A partir dessa perspectiva, investidores conseguiam projetar altas, quedas e até novos recordes.
Henry Oyama, diretor da Hashdex, explica que a origem do ciclo foi a identificação de padrões ligados ao halving, um evento que ocorre a cada quatro anos e reduz a quantidade de novos bitcoins disponibilizados no mercado via mineração pela metade. Usando esses eventos como marcos, investidores começaram a identificar um comportamento comum do ativo.
"Historicamente, esses halvings coincidiram com períodos de restrição de oferta, aumento de interesse dos investidores e fases de forte recuperação após períodos longos de ajuste. Essa combinação de fatores ajudou a consolidar a percepção de um ciclo relativamente previsível, marcado por impulso, correção e retomada", explica.
Matheus Parizotto, analista da Mynt, a plataforma cripto do BTG Pactual, comenta que a identificação desse padrão fez com que muitas pessoas começassem a "olhar o mercado de criptoativos como se fosse um relógio".
"Em 2012, 2016 e 2020 o roteiro se repetiu. O halving reduziu a oferta, o preço disparou, houve um período de euforia e, em seguida, uma correção profunda. Esse padrão virou quase um dogma de mercado e acabou se reforçando ao longo do tempo", diz.
Como resultado, os investidores também passaram a planejar todo o investimento na criptomoeda em torno dessa lógica: "Comprar perto do halving, vender cerca de um ano depois e esperar o próximo ciclo. Ou seja, o ciclo de 4 anos foi por muito tempo uma espécie de atalho mental para explicar um ativo ainda pequeno, muito dominado pelo varejo e extremamente sensível a choques de oferta".
O comentário de Parizotto aponta um caráter essencial por trás do ciclo de quatro anos - a sua forte ligação com investidores de varejo. Durante anos, a criptomoeda foi dominada por esse grupo de investidores. Mas as coisas começaram a mudar a partir de 2024.
A combinação do lançamento de ETFs de bitcoin nos Estados Unidos com uma aceleração da criação de reservas corporativas da criptomoeda e aceitação por instituições tradicionais do mercado criaram um novo cenário para o ativo. Agora, ele não depende apenas da demanda do varejo.
Parizotto afirma que o impacto do halving no preço da criptomoeda "continua verdade em certa medida", mas está se enfraquecendo. "Hoje temos algo em torno de 20 milhões de bitcoins em circulação, perto de 95% do limite máximo de 21 milhões de unidades. Os próximos halvings ainda vão reduzir a taxa de emissão, mas o impacto marginal sobre o total agora é cada vez menor".
"O evento continua importante do ponto de vista de sustentar a tese de um ativo escasso, mas a sua capacidade de influenciar o preço por conta própria é cada vez menor", defende. Ao mesmo tempo, ele destaca que a demanda institucional pelo ativo surgiu como grande novidade, impactando o comportamento da criptomoeda.
"Quando isso acontece, a pergunta central deixa de ser 'quanto o halving corta da oferta?' e passa a ser 'como está o apetite institucional?'. Na prática, o halving continua relevante, mas deixa de ser o protagonista da história.", resume o analista.
E a tese do fim do ciclo de quatro do bitcoin passa ainda por outro dado relevante: conforme o bitcoin e as criptomoedas se integram mais ao mercado financeiro tradicional, eles passam a estar mais correlacionados com o ciclo econômico global.
Segundo Parizotto, "hoje, o comportamento do bitcoin se parece muito mais com o de outros ativos de risco globais: reage a expectativas de juros, inflação, liquidez global e política fiscal. Ele sofre com choques macroeconômicos, regulatórios e geopolíticos e é comprado e vendido em função de decisões de alocação de portfólio, e não apenas de narrativas".
Por isso, o analista diz que a criptomoeda saiu de um "ciclo do halving" para um "ciclo macroeconômico", cujas fases de apetite e aversão a risco passam a ser mais determinantes para o seu preço. Foi isso que teria ocorrido, por exemplo, neste final de 2025.
"A expectativa não é que não existirão mais ciclo", mas sim que aquele ciclo quase determinístico de quatro anos ficou para trás. O último halving veio depois do bitcoin já ter renovado máximas históricas, algo inédito em relação aos ciclos anteriores. Também não vimos um movimento clássico com euforia descolada dos fundamentos, como observado em 2017 ou 2021", pontua.
Para Parizotto, "é até mesmo um pouco de ingenuidade achar que qualquer mercado, ainda mais um mercado global de trilhões de dólares, possa seguir ciclos rigidamente determinísticos, com data marcada para começo, meio e fim. Não existe um único fator impactando o preço. Existem dezenas de vetores atuando ao mesmo tempo, e o halving é só um deles".
Oyama, da Hashdex, explica que as mudanças observadas mostram que "ainda pode existir alguma influência cíclica [no preço do bitcoin], mas é natural que esses padrões evoluam à medida que o mercado amadurece. Em outras palavras, o halving segue relevante, mas os ciclos passados não devem ser vistos como um roteiro garantido para o futuro".
E isso exige uma nova forma de pensar para o investidor. Parizotto, da Mynt, acredita que o novo cenário exige quatro mudanças para os investidores:
"O bitcoin continua escasso, continua cíclico, mas agora se comporta cada vez mais como um ativo integrado ao sistema financeiro tradicional. E nesse mundo quem manda são os ciclos de liquidez e de economia real", resume o analista.
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