Com 113 empresas cadastradas, Governo pode arrecadar mais de R$ 3 bilhões com bets em 2025
José Francisco Manssur, responsável pela regulamentação das apostas, fala em 'conquista' ao explicar etapas do processo
Redação Exame
Publicado em 22 de agosto de 2024 às 14h51.
Última atualização em 22 de agosto de 2024 às 14h52.
Terminou à meia noite desta terça-feira, 20, o prazo para as plataformas de aposta pedirem as licenças para operarem no Brasil a partir de 1o de janeiro de 2025.
Ao todo, 113 empresas protocolaram o pedido no Sistema Geral de Apostas, da Secretaria de Prêmio e Apostas, do Ministério da Fazenda. Como cada uma delas - correspondente a um único CNPJ -, pode cadastrar até três marcas comerciais, o número de bets operando no Brasil deve ser superior a 300.
Assim que autorizadas pelo Ministério da Fazenda, uma das principais exigências dentre as portarias estabelecidas se trata do pagamento de uma outorga no valor de R$ 30 milhões. Ou seja, a arrecadação do Governo com a regulamentação das bets, neste primeiro momento, deve ultrapassar os R$ 3 bilhões.
José Francisco Manssur, sócio do escritório CSMV Advogados, teve papel fundamental em todo este processo. Ele ingressou em janeiro de 2023 como assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, e esteve à frente da elaboração das regras para o setor de apostas por quota fixa no Brasil. Dentre as principais incumbências, tirar do papel uma lei que havia sido legalizada ao final do Governo Temer, ainda em dezembro de 2018. Ele conseguiu, culminando com a sanção da Lei 14.790/23, que regulamentou definitivamente as apostas esportivas e jogos online no Brasil.
"Não havia mecanismos para o recolhimento dos impostos e destinações sociais devidas pelos operadores de apostas, que agiram livremente no Brasil, de 2018 a 2023, sem recolher 1 real. A partir da nossa entrada, as empresas autorizadas passarão a pagar seus tributos. Tudo o que vemos agora é uma conquista concreta", diz o advogado.
Outro ponto destacado por Manssur é que as operadoras atuavam no país sem a obrigação de apresentar qualquer documento ao Governo. "Não havia fiscalização. Agora, elas são obrigadas a terem sede no país, a identificarem seus controladores e a mostrarem o expressivo volume de documentos comprobatórios de idoneidade", acrescenta.
Esse número de mais de 300 bets, no entanto, deve diminuir, já que a próxima etapa do cronograma ministerial está justamente na avaliação dos critérios de empresa por empresa. Especialistas e executivos do mercado acreditam que a quantidade de plataformas que não consigam essa aprovação possa varias entre 10% e 15%.
Além do valor a ser pago, as bets devem obrigatoriamente cumprir critérios relacionados à habilitação jurídica, regularidade fiscal e trabalhista, idoneidade, qualificação econômico-financeira e qualificação técnica. Elas também devem manter uma reserva financeira de R$ 5 milhões no país e fazer um investimento inicial de R$ 15 milhões no negócio, além de ter um sócio brasileiro.
Para Manssur, o número de empresas cadastradas até a noite desta terça-feira, 113, surpreende e supera as expectativas que foram previstas enquanto esteve como assessor especial no Ministério da Fazenda - previa-se de 50 a 70 cadastros. Por outro lado, o total de plataformas comprova outro indicativo.
"Temos um levantamento que pelo menos mil casas operam livremente no Brasil. Com a licença, esse número vai atingir uma proporção bem menor. Acredito que as restrições decorrentes da regulação vão dar margem a um futuro promissor de legalidade no país e combate efetivo ao vício em jogo", aponta Manssur.
O pagamento dos R$ 30 milhões da outorga só acontecerá após a autorização do Governo, que será comunicada às plataformas ainda em 2024. Essa licença é válida por cinco anos e pode ser revista sempre que acontecer alguma fusão, cisão, incorporação, transformação, bem como transferência ou modificação da bet.
"Isso tudo demonstra, de forma clara, que a legalização feita em 2018 abriu caminho para a atuação das operadoras, com as externalidades negativas acima citadas, ao contrário da regulação, que veio enfrentar esses aspectos e restringir o acesso de agentes e apostadores, para que, a despeito da movimentação financeira e criação de emprego e renda, as apostas possam mitigar seus efeitos negativos, especialmente, no caso, o vício em jogo e o superendividamento", complementa Manssur.
Entre as casas de aposta, expectativas para o novo momento seguem em alta
Entre algumas das bets que realizaram a solicitação, as expectativas para o novo momento que a indústria viverá a partir de 2025 seguem em alta.“O prazo-chave deste dia 20 já deverá ser um divisor de águas para o segmento, que cada vez mais se aproxima do momento em que enfim estará 100% regulamentado. Esse movimento trará inúmeros benefícios para a economia do país quanto para todos os envolvidos no ecossistema, com diretrizes claras para o segmento”, afirma Hans Schleier, COO da Casa de Apostas.
Já Darwin Henrique da Silva Filho, CEO do Grupo Esportes da Sorte, avalia a chegada do mercado regulado. “Será um marco que trará mais credibilidade ao segmento, fazendo com que restem apenas as empresas de reputação ilibada, e que adotam as melhores práticas, como compliance, prevenção a fraudes e a promoção do jogo responsável, sendo este também um aspecto muito importante, uma vez que o jogo é uma forma de entretenimento e deve ser abordado com responsabilidade”, afirma o executivo da companhia, que realizou a solicitação de autorização contemplando tanto a operação do Esportes da Sorte quanto da Onabet, plataforma de apostas online que faz parte do grupo.
CEO da BETesporte, Marcos Pereira, destaca a importância desse movimento para garantir o compromisso com a transparência dentro do setor, além de também ressaltar os benefícios da regulamentação ao país. “É um segmento com imenso potencial econômico, que contribui para a criação de empregos e, consequentemente, geração de renda para muitas famílias”, pontua.
As últimas regras para o setor betting foram divulgadas no início de agosto pela Secretaria de Apostas e Prêmios do Ministério da Fazenda (SPA/MF), que ao longo do ano estabeleceu importantes diretrizes para o funcionamento e fiscalização do segmento, em uma série de 10 portarias normativas. A última delas, a SPA/MF nº 1.233, determinou sanções para as bets que descumprirem as regras estabelecidas para o setor. Com possibilidade até mesmo de proibição de atuar no mercado, as penalizações vão desde advertências a multas de até R$ 2 bilhões.
"Acreditamos que a regulamentação é fundamental para trazer credibilidade ao setor e garantir a proteção dos clientes, além de oferecer benefícios econômicos para o país. É essencial que todos que desejam atuar legalmente adotem as melhores práticas, protegendo a integridade das operações e promovendo um jogo responsável", destaca Fellipe Fraga, Diretor de Negócios e Relações Institucionais da EstrelaBet.
Já Marcos Sabiá, CEO galera.bet, comenta sobre a importância das novas diretrizes estabelecidas, para garantir uma indústria responsável. “Teremos um mercado que deverá observar uma série de regras dentro das melhores práticas de segurança, jogo responsável, combate à lavagem de dinheiro e à práticas ilícitas como manipulação de resultados, de uma forma que a gente consiga promover, dentro do Brasil, uma indústria saudável e que possa se perpetuar”.
Entre as principais portarias normativas publicadas, a SPA/MF nº 1.207 também se destacou, ao definir regras para os jogos online, a exemplo dos famosos Fortune Tiger, conhecido como “jogo do tigrinho”, e o jogo do aviãozinho. Entre as determinações, os jogos deverão ser certificados por entidades autorizadas pelo Ministério da Fazenda e terão de ser de quota fixa, ou seja, no momento da aposta deve ser apresentado o fator de multiplicação que definirá os ganhos do apostador em caso de premiação. Além disso, 85% do valor arrecadado pelas plataformas com as apostas deve ser pago em prêmios.
“Com as novas normas, todas as partes só têm a ganhar, com maior segurança, fiscalização e responsabilidade. A partir de 2025, quando as demandas estiverem em vigor, não temos dúvida de que as empresas sérias terão um impulso em seus crescimentos”, ressalta Rafael Borges, Country Manager da Reals.
Já a SPA/MF 1.143, publicada em julho, determinou como requisito às bets para atuar no mercado brasileiro a adoção de políticas claras para combater práticas de lavagem de dinheiro e de financiamento do terrorismo e comunicar qualquer transação suspeita ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão do governo federal que atua no combate à lavagem de dinheiro.
“Eram normativas já esperadas dentro do setor, justamente para criar um sistema robusto de prevenção às fraudes. Vale lembrar que estamos falando de uma indústria de grande importância para a economia nacional, ao movimentar 1% do PIB, e que necessita dessas adequações para que, a partir de 2025, todas as boas práticas de compliance e responsabilidade já estejam sendo 100% aplicadas”, destaca João Fraga, CEO da Paag, uma techfin que tem lançado produtos especializados para auxiliar as bets a se adequarem às novas diretrizes.
A SPA/MF nº 615 também foi destaque ao trazer, em abril, determinações no âmbito das transações de pagamento realizadas por agentes operadores de apostas, com o intuito de dar mais segurança aos apostadores brasileiros. As formas de transferir recursos para a realização das apostas foram restringidas ao PIX, TED, cartões de débito ou cartões pré-pagos, na busca por facilitar a identificação da origem dos recursos. Também foram estabelecidas regras para as instituições de pagamento.
“Todos os depósitos e saques de recursos efetuados pelos apostadores devem ocorrer exclusivamente por meio de transferência eletrônica entre uma conta cadastrada do apostador e uma conta transacional da operadora de apostas. Ambas deverão ser mantidas por instituições autorizadas pelo Banco Central, as quais devem cumprir uma série de requisitos técnicos para garantir segurança de dados”, explica Edson Lenzi, CEO da PayBrokers, empresa referência em transações financeiras no setor e habilitada como Instituição de Pagamento (IP) pelo Banco Central.